Tuesday, 26 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Renato Janine Ribeiro

TV PAGA

"Os limites da qualidade da TV paga",
copyright O Estado de S. Paulo, 12/8/01

"A forma mercantilista de encarar a programação contamina não apenas a televisão aberta. O cabo aumentou muito as opções do público na TV. Mas isso não quer dizer que ela tenha melhorado em qualidade – o grande salto foi em quantidade. E o problema que quero apontar aqui é o do espírito intensamente norte-americano do fenômeno.

Um dos maiores itens na pauta de exportações dos Estados Unidos é o entretenimento – tanto que nas discussões sobre a liberação do comércio internacional eles batem de frente com a França. Os americanos não querem limitações à circulação do entertainment, ao passo que europeus, e os franceses em especial, insistem na preservação das culturas nacionais, regionais, locais.

A diferença é que os europeus falam em cultura, os americanos em entretenimento – aqueles, em formação, estes, em informação -, os primeiros, em desenvolvimento da pessoa, inclusive em termos de cidadania, os segundos, em diversão, em descompromisso – e, enfim, a Europa pensa numa responsabilidade do setor público pelo acesso à cultura, enquanto os EUA consideram que o acesso ao lazer deve depender do mercado. Vamos desenvolver isso.

A cultura é um direito humano básico. Cada vez mais percebemos que toda pessoa tem direito, não só à comida, à saúde, ao emprego, à moradia, mas a um crescimento individual que só o acesso à informação e à formação pode proporcionar. Simplificando: uma pessoa inculta fica bastante limitada em sua capacidade de escolher e, portanto, em sua liberdade.

Em outras palavras: cultura não é acumulação de dados ou informações. Culto é quem sabe usar a tradição, os conhecimentos, sejam de origem popular (a cultura popular) ou sofisticada (a erudita), para aprofundar suas relações com o mundo.

Quem tem cultura, seja indígena ou européia, pode escolher melhor. Pode perceber que um político mente, que um amor ou amizade não tem futuro, que aparências enganam. E é claro que a televisão ou o cinema podem ter um papel nisso. Não há dúvida de que as novelas e filmes ajudaram muitos a entender melhor o mundo e a si mesmos, e assim contribuíram para a liberdade.

Mas, quando a cultura é entendida como negócio ou mercadoria, e deixa de ser discutida nas conferências de direitos humanos para entrar na pauta da Organização Mundial do Comércio, as coisas ficam delicadas. Se ela é um direito básico, o papel do capital na sua promoção deve estar subordinado aos interesses do cidadão. O capitalismo lida com o consumidor, com o cliente, mas essas figuras devem ser temperadas pelas do direito e da cidadania.

Evidentemente isso não é fácil. Num país democrático, o Estado tem legitimidade para representar os cidadãos e promover a cultura como direito humano, por exemplo, dando o maior acesso possível a museus, patrocinando canais de TV culturais e pluralistas, preservando o patrimônio artístico e a cultura popular. Mas não cabe ao Estado tutelar a cultura. Por seu lado, o capital deve ter liberdade para agir em toda a gama de espetáculos e bens culturais, mas preservando também esses valores, como o pluralismo.

O problema no Brasil é que o capital age desabridamente, sem controle, na cultura como em áreas nas quais o direito deveria prevalecer sobre a mercadoria. A televisão é um dos melhores exemplos disso. E a TV paga é quase tão pouco pluralista quanto a aberta. Voltarei ao assunto na próxima coluna, discutindo o caráter maciçamente norte-americano da programação do cabo e do satélite."

FUTEBOL EM BAIXA

"Mesmo que a seleção brasileira se classifique, a Copa do Mundo de 2002 poderá se transformar em um ?mico? de US$ 120 milhões nas mãos da Globo.

Esse é o valor que a emissora pagou pelos direitos exclusivos de transmissão do evento em TV aberta e paga, rádio e internet. Prevendo dificuldades para recuperar o investimento só com publicidade, devido à retração do mercado, a emissora abriu mão da exclusividade.

Em julho, a Globo ofereceu o repasse dos direitos para SBT, Record e Band/Traffic. Valores ainda não foram discutidos, mas o SBT não tem interesse. A Record, temerosa, vai aguardar os próximos jogos da seleção.

?É bem provável que a Globo tenha prejuízo, inclusive com a classificação do Brasil, por causa do mau desempenho da seleção?, diz Antonio Rosa, presidente da Dainet, consultoria de mídia.

O mercado avalia que, mesmo que a Globo tenha pago os direitos com o dólar a R$ 1 (a negociação foi em 98), dificilmente conseguirá arrecadar o suficiente para recuperar o investimento.

Neste ano, as cinco cotas do futebol foram vendidas por R$ 55 milhões cada. Em ano de Copa, esse valor poderia dobrar. Para Antonio Rosa, seria um investimento caro demais, porque a seleção pode não passar da primeira fase da Copa. E a maioria dos jogos será de madrugada. A emissora não comentou o assunto.

 

    
    
                     

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