CRISE NO NEW YORK TIMES
Agora que o desastre está feito, resta ao New York Times descobrir se o estrago chegou à bolsa de valores.
Aparentemente, Wall Street deu de ombros às demissões dos editores e à sucessão de eventos que levou a isso. Após queda pela manhã, momento do anúncio da saída dos jornalistas, o valor do título do Times voltou a subir à tarde. Fechou, no dia 5/6, com baixa inferior a 1%.
“A respeito de operações financeiras, não esperamos nenhum efeito”, disse a porta-voz Catherine Mathis. “Muitos anunciantes perguntaram sobre a questão e aplaudiram efusivamente nossa transparência, lembrando sempre que não esperavam menos do Times.”
Segundo reportagem de Frank Ahrens [The Washington Post, 6/6], as ações da Times Co. têm sido estavelmente valorizadas nos últimos cinco anos. A Times foi uma das empresas que pressionaram pela flexibilização das regras de propriedade de mídia. As reformas foram aprovadas no começo do mês pela Comissão Federal de Comunicações (FCC). No dia 5/6, a Times Co. garantiu que a turbulência recente não atrapalhará as aquisições planejadas.
Beatriz Singer
* No dia 1o/5, o New York Times, modelo da imprensa americana, foi duramente golpeado quando Jayson Blair, então repórter metropolitano do New York Times, foi desmascarado. Um artigo de capa de 26/4, de autoria do repórter, falava sobre um mecânico do exército desaparecido. O artigo incluía passagens “de semelhança perturbadora semelhantes” com algumas que apareceram antes no San Antonio Express-News. Blair pediu demissão.
* Em 11/5, após intensa investigação interna, o Times publica uma retratação de quatro páginas, em que lamenta e discorre sobre as 36 fraudes, entre plágios e fabricações, que o repórter de 27 anos fizera de outubro até então. Abre um canal de comunicação exclusivo para receber reclamações do público.
* Em 14/5 os chefões do Times entravam na jaula do leão, em encontro com centenas de repórteres e editores querendo extravasar indignações e esclarecer todas as obscuridades do caso. O centro das críticas foi o então editor-executivo Howell Raines. Os funcionários do jornalão aproveitaram para mostrar descontentamento com o método autocrático e arbitrário de Raines. Do lado de fora, articulistas de todos os EUA opinavam sobre a relevância da cor da pele de Blair na permanência do repórter no jornal por tanto tempo.
* O repórter e vencedor de prêmio Pulitzer Richard Bragg, de 43 anos, nove deles dedicados ao Times, pediu demissão após receber uma suspensão de duas semanas. Um artigo escrito há menos de um ano em Apalachicola, na Flórida, foi assinado unicamente por Bragg, mas quem fez o trabalho árduo foi J. Wes Yoder, um estagiário informal e não-remunerado, de 23 anos, “contratado” pelo repórter. Além disso, Bragg assinou o artigo indicando Apalachicola como local de reportagem, mas o jornalista reconhece ter passado pouqu&iaiacute;ssimo tempo na cidade. Bragg disse numa série de entrevistas que o uso de repórteres free-lance por jornalistas contratados pelo jornal é prática comum no Times. O comentário, que apareceu na imprensa no dia 27/5, enfureceu muitos colegas.
* Na mesma época, a veterana Judith Miller, considerada a melhor repórter sobre bioterrorismo do jornal, desentendeu-se com John Burns, chefe de redação da sucursal em Bagdá e vencedor de um Pulitzer. Ambos faziam reportagens sobre armas de destruição em massa utilizando a mesma fonte. Andrew Rosenthal, subeditor administrativo de notícias internacionais, disse que foi uma “derrapada feia” ter publicado e-mails privados dos repórteres e “ter revelado quaisquer fontes confidenciais que tenham ou não”. O caso foi noticiado no Washington Post em 26/5.
* O editor-executivo Howell Raines e o editor-administrativo Gerald Boyd pedem demissão do jornal, em 5/6, exatamente cinco semanas após o início do escândalo. O publisher Arthur Sulzberger Jr. aceita o pedido com pesar, e nomeia Joe Lelyveld editor-executivo interino.
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