Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Ricardo Bonalume Neto

‘Sem o som e as legendas, este documentário poderia parecer o treinamento de soldados americanos para combater no Iraque hoje. E é quase isso: trata-se do treinamento de atores para participar de uma batalha da Antigüidade que aconteceu logo ali, em Gaugamela, no norte do Iraque. Mas é parte de ‘Alexandre’.

Assim como agora, essas batalhas também envolveram jovens do Ocidente lutando com seus colegas da mesma idade do Oriente.

Havia tempos em que os atores e os extras não precisavam de muito esforço para participar de um filme. Bastava colocar as roupas antigas, ‘de época’, e pronto.

Mas, em nome da autenticidade, o diretor Oliver Stone criou um campo de treinamento de soldados/atores em Marrocos, para fazê-los lutar como ‘na vida real’ dois milênios atrás. Os atores correm pelo deserto como marines, cantando canções de marcha.

Stone fez o ator principal, Colin Farrell, ser ensinado por especialistas em artes marciais, equitação e tática e estratégia militares. O principal consultor militar é um velho capitão aposentado dos marines, Dale Dye, que tenta fazer do ator um ‘marechal de campo’.

É curioso, no mínimo. É como se Farrell fosse fazer tudo aquilo de verdade: conquistar o Império Persa, incluindo lutar no Afeganistão e na fronteira da Índia.

O documentário se concentra nos aspectos mais físicos do filme. É pena, pois o consultor histórico de Stone, o historiador Robin Lane Fox, é um personagem e tanto. Que fez questão de participar do filme como cavalariano, segundo o jornal ‘The New York Times’.

O treinamento de Farrell para encarnar o mais importante general ocidental da história -mesmo Napoleão, o número dois da lista, o reconhecia como tal- é apenas parte da coisa. Mais interessante é ver como seu magnífico Exército foi recriado. O documentário dá boas pistas. Alexandre tinha uma arma formidável nas mãos, reunindo a falange de infantaria pesada e uma cavalaria ágil e impactante. Isso ajuda a explicar a proeminência do Ocidente ainda hoje. E talvez devesse ajudar a entender os limites dessa influência. Poder militar nem sempre se traduz em poder político.

SOU ALEXANDRE. Quando: dias 2, às 21h, e 3, à 1h, no Discovery Channel.’



UM SÓ CORAÇÃO
Laura Mattos

‘DVD mistura ‘Um Só Coração’ e ‘Vídeo Show’’, copyright Folha de S. Paulo, 1/01/05

São seis discos com 22 horas e 16 minutos de uma produção que agradou críticos e audiência. A caixa de DVDs de ‘Um Só Coração’, contudo, não traz nada inédito nos extras: o que vende como ‘bastidores e depoimentos do elenco’ não passa de um apanhado de reportagens exibidas pelo ‘Vídeo Show’ à época da série.

Recém-lançado, o pacote de R$ 250 é o mais novo título da ‘fábrica de DVDs’ que não pára de gerar lucros para a Globo. O reaproveitamento do ‘Vídeo Show’ segue tendência norte-americana de investir pouco nos extras, utilizando, por exemplo, cenas já gravadas em entrevistas coletivas.

Dentre os 47 minutos do ‘Vídeo Show’, há entrevistas superficiais com os autores, Maria Adelaide Amaral e Alcides Nogueira, feitas num corredor, no lançamento da série. E depoimentos ‘bombásticas’ do elenco, como Erik Marmo afirmando que seu personagem, Martin, ‘é um cara muito interessante’ e Fernanda Paes Leme ‘revelando’ que ‘Elisa [amiga de Yolanda Penteado] é um presente.’ Isso sem falar de momentos constrangedores causados por uma reciclagem mal editada, como quando a repórter pergunta a Ana Paula Arósio qual será o fim de Yolanda. ‘Não posso contar’, responde, fazendo mistério sobre um desfecho que todo mundo já viu na TV e reviu no DVD.

Algumas reportagens reaproveitadas são interessantes, como as que o ator José Rubens Chachá, intérprete de Oswald de Andrade, visita a casa do modernista na rua Augusta; Cássio Scapin, o Santos Dumont, mostra as curiosidades da antiga residência do aviador, e Miriam Freeland vai a Santos para conhecer a cadeia na qual Patricia Galvão, a Pagu, interpretada por ela, ficou presa na década de 30.

O que vale mesmo a pena ver nesse ‘vale a pena ver de novo’ é o encontro de Cássio Gabus Mendes, que fez o papel de Juvenal Penteado (irmão de Yolanda), com um de seus filhos, Alfredinho. Criança na minissérie, ele hoje é um senhor e diz como se sente ao rever a história de sua família. Ao final, dá um beijo emocionado no pai de mentira. Para o telespectador, resta a sensação de que não custava nada (ou pelo menos não custava tanto) a Globo ter investido mais num bom material extra para os DVDs de uma série que merece lugar na estante.’



TV / ANO NOVO
Folha de S. Paulo

‘TV saúda Ano Novo com programas velhos’, copyright Folha de S. Paulo, 30/12/04

‘O ano é novo, mas as atrações televisivas para o Réveillon já são velhas conhecidas do público. Entre a São Silvestre e a queima de fogos, a TV aberta se concentra em musicais, enquanto a paga praticamente ignora a data.

A Band transmite ao vivo, de Salvador, show com Danilo Caymmi, Jorge Aragão, Harmonia do Samba. Amanhã, tem ‘Show do Pôr do Sol’, com Daniela Mercury e convidados como Gabriel, o Pensador e Fernanda Abreu. Já o ‘Show da Virada’, da Globo, gravado no mês passado, traz Wanessa Camargo, Leonardo, Daniel, Bruno e Marrone, KLB, Ivete Sangalo e outros. O SBT saúda 2005 em clima retrô, com edição especial do ‘Programa do Ratinho’ dedicada à jovem guarda, com Golden Boys, Jerry Adriani e Os Incríveis.

A Record faz contagem regressiva com um ‘Show do Tom’ especial, que recebe Banda Eva e Terrasamba; a Gazeta recebe, hoje, Zeca Pagodinho e Fundo de Quintal no ‘Passarela do Samba’. A Rede TV! exibe especial com Ivan Lins amanhã, enquanto a Cultura traz hoje programa com a cantora Fortuna e o Projeto Guri.

TV paga

A virada de ano não causou grandes alterações na programação dos canais pagos. Entre as atrações temáticas, o Multishow exibe hoje ‘Mandou Bem Especial’, com previsões astrológicas para 2005. O Futura dedica o ‘Sala de Notícias’ aos principais assuntos de 2004. Quem não se interessa por fogos de artifício têm no Telecine maratona Indiana Jones, amanhã, e filmes como o brasileiro ‘Lisbela e o Prisioneiro’.’



MEMÓRIA / MYRIAM MUNIZ
Esther Hamburger

‘Myriam Muniz e o desconforto com a TV’, copyright Folha de S. Paulo, 29/12/04

‘No último dia 18 morreu Myriam Muniz, grande figura dos palcos brasileiros. Ao contrário de muitos de seus companheiros do Teatro de Arena, a atriz e diretora fazia parte de um grupo menos conhecido do grande público: o dos que não fizeram, ou fizeram pouca TV.

A carreira de Muniz, atriz e diretora, faz parte da trajetória de profissionais atuantes na esquerda cultural dos anos 60 que hesitaram diante da expansão dos meios eletrônicos.

Quando o governo militar fechou o teatro, a Rede Globo investia na produção de teledramaturgia. Alguns dos jovens atores engajados migraram para a então recém-inaugurada emissora carioca sem necessariamente abdicar de seus ideais.

No Arena, Muniz contracenou e conviveu com atores como Antônio Fagundes, Juca de Oliveira, Gianfrancesco Guarnieri, Paulo José e Dina Sfat.

Outros -por convicção, porque foram para o exílio no exterior (caso do diretor Augusto Boal), porque não se adaptavam à rotina da indústria cultural, ou por uma combinação desses fatores- permaneceram fiéis aos palcos.

O papel mais popular de Muniz foi D. Santa, a mãe de ‘Nino, o Italianinho’ [com Juca de Oliveira], novela que foi ao ar em 1969, na ainda poderosa Tupi.

A popularidade constrangeu a atriz pouco preparada para representar o papel de estrela. Na esteira do sucesso dessa performance, ela interrompeu abruptamente sua participação televisiva.

Suas interpretações em filmes de Ana Carolina ajudaram a trazê-la de volta em papéis pequenos, porém fortes, nas minisséries ‘Dona Flor e Seus Dois Maridos’ e ‘Os Maias’. Em 2004 apareceu na estranha ‘Metamorphoses’ (Record).

Muniz era uma atriz densa. Seu jeito não combinava com o naturalismo que impregna a TV. Seu desconforto na tela pequena era visível. Pior para o público.

Esther Hamburger é antropóloga e professora da ECA-USP’