Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Ricardo Valladares

ENTREVISTA / BONI

A TV está ruim”, copyright
Veja, 18/6/03

“José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, é um dos grandes nomes da televisão brasileira. Ele começou a trabalhar no veículo em 1953, quando tinha apenas 17 anos. Foi câmera, iluminador e sonoplasta. Atuou em novelas e shows de auditório, produziu e dirigiu programas. Mas foi na Rede Globo, onde ingressou em 1967, que deu sua contribuição histórica à TV. Ao lado de Walter Clark, morto em 1997, ele definiu a identidade da principal emissora do país, estabelecendo uma programação bem-sucedida e aquilo que passou a ser conhecido como ?padrão Globo de qualidade?. Boni foi o homem forte do canal carioca por vinte anos. No final de 1997, deixou o cargo de vice-presidente, mas não se desligou totalmente da Globo. Manteve com ela, até o começo deste ano, um contrato de consultoria. Na prática, não fazia nada: a emissora pagava para não vê-lo numa concorrente. Nos próximos meses, Boni deve inaugurar sua própria emissora, a TV Vanguarda, no interior de São Paulo. Ele continua apaixonado por televisão, embora não goste do que vê atualmente. ?É desagradável ver TV ao meu lado. Eu mudo de canal o tempo todo?, costuma dizer Boni.

Veja – No auge de sua influência na Rede Globo, o senhor chegou a ser comparado a um chefe de governo. Qual a sensação de estar longe do poder?

Boni – É confortável. Você olha as coisas de fora, tem uma visão diferente, muito menos tensão e muito mais tempo. Eu não estou parado, tenho projetos. Além disso, não caí no esquecimento. As pessoas vivem me ligando para pedir conselhos, desde atores até diretores. Posso não estar mais no centro de tudo, mas não sinto como se houvesse perdido poder.

Veja – Quais são seus projetos atuais?

Boni – Tenho duas concessões de televisão na região de São José dos Campos, cobrindo 46 cidades. A partir dessa base, pretendo pôr uma emissora que batizei como TV Vanguarda para funcionar, em agosto. Trabalho como consultor para o hospital Albert Einstein, de São Paulo, que está produzindo programas numa rede interna para seus pacientes. Finalmente, tenho pensado muito sobre a questão da interatividade. Estou testando, juntamente com uma grande operadora de cartões de crédito, um cartão e um aparelho que permitem fazer compras diretamente de casa: você vê o anúncio, passa o cartão no aparelho, digita um código e elimina todos os intermediários. E não é só isso. O cartão também permite que se armazenem inúmeras informações sobre seu dono.

Veja – Quanto dinheiro o senhor ganhou com TV?

Boni – O que eu tenho está no imposto de renda. Não foi pouco, mas creio que é tudo proporcional ao meu esforço e dedicação. Eu nunca tive salário na Globo. Assinei um contrato de risco e ganhava participação nos lucros. No começo de tudo, entre 1967 e 1970, não recebi um tostão. Vivia de empréstimos bancários. O dinheiro só começou a entrar quando a emissora passou a operar no azul.

Veja – Nos últimos cinco anos o senhor atuou como consultor da Globo. É verdade que recebia 1.500.000 reais por mês para não fazer nada?

Boni – Era coisa desse tipo. Nos últimos dois anos esse valor caiu pela metade. Mas juro que essa situação não me dava prazer. Preferiria estar trabalhando e ganhando um pouco menos.

Veja – Deu para guardar muito dinheiro?

Boni – Eu tenho bens, mas nunca fui homem de guardar dinheiro. O problema é que meu custo de vida se tornou bastante elevado. Tenho uma casa numa ilha de Angra, tenho minha mãe, tenho apartamento em Nova York, dois filhos que ainda vivem comigo, apartamento em São Paulo, casa no Rio de Janeiro, escritório. Esse custo é brutal. Se eu deixar de trabalhar terei problemas em dois anos. Posso até acabar num asilo de velhos.

Veja – De quanto o senhor precisa para viver?

Boni – Enquanto negociava minha ida para o SBT, no começo deste ano, fiz as contas com o Silvio Santos. Com um pouco mais de 300 000 reais por mês dá para segurar as pontas.

Veja – Por que sua ida para o SBT não deu certo?

Boni – Houve duas tentativas. Na primeira, em 2000, não consegui liberação da Globo. Existia uma cláusula de perdas e danos em meu contrato cujo valor era um assombro. Da segunda vez, agora em janeiro, surgiram algumas questões a ser discutidas. Eu até teria um grupo de investidores brasileiros dispostos a comprar 51% do SBT. Mas o Silvio Santos é inquieto e não tem tempo para esperar ninguém.

Veja – Por que o SBT não cresce mais?

Boni – Silvio Santos é o melhor apresentador do mundo. Não sei de ninguém que consiga dominar um programa como ele, com aquela simplicidade. Mas ele não é um estrategista da televisão. Não adianta ter 15% em determinado horário, como ele tem à noite, com o Ratinho. O importante é ter boa audiência média. Você precisa conquistar aquilo que chamamos de público de lastro em todos os horários da sua programação. O Silvio prefere ter um canal de vendas da Tele Sena, do Baú da Felicidade. Desse modo sua emissora não vai passar de um certo patamar, apesar de vitórias eventuais, como aquela da Casa dos Artistas.

Veja – O senhor disse isso a ele?

Boni – Claro que sim. E cheguei a esboçar um plano para atrair mais publicidade para o SBT. Quando o mercado percebe que existe um projeto consistente por trás da programação, ele confia e se dispõe a pagar bastante por isso.

Veja – Como o senhor avalia a televisão de hoje em dia?

Boni – Ela está ruim, porque se instalou uma mentalidade imediatista nas emissoras. Eles pensam na programação minuto a minuto, entram em brigas de foice por um ponto de audiência e, nesse processo, acabam fazendo concessões desnecessárias ao mau gosto. Televisão não é só o imediato, nem mesmo do ponto de vista comercial. Pois o mercado publicitário não se guia apenas pelo ibope para anunciar. Temos vários exemplos de programas com audiência alta, mas qualidade ruim – e um resultado igualmente ruim na publicidade. Eu trouxe esse conceito à tona muitos anos atrás e ele continua válido: boa televisão se faz pensando na programação como um todo. Estamos falando de um empreendimento muito especial, que precisa oferecer bom entretenimento e boa informação num cardápio variado, que atinja todas as classes sociais. Pensar na programação de forma orgânica significa que você leva em conta dois clientes, o espectador e o anunciante. Que, enfim, pesa os interesses de ambos, para chegar a um resultado satisfatório. São duas estratégias com alvos diferentes, mas que têm de andar de mãos dadas.

Veja – No momento, o fim da tarde tem a maior concentração de baixaria na televisão. O que poderia ser feito para melhorar esse horário?

Boni – O melhor espetáculo do mundo é o ser humano. Ele está sendo desprezado nesses programas policiais, nesses shows de auditório que lidam com o mundo-cão. Esprema um programa policial qualquer: sobram dez minutos de informação. O resto é gritaria e redundância. Eu baniria todos eles da TV. A atração é sempre o criminoso, é o sujeito que tem um desvio sexual qualquer, é o que destruiu a família. Enquanto isso, dá-lhe merchandising de creme para cabelo. Consumismo associado ao pior do ser humano: essa fórmula tem de parar. Eu acho que o horário do fim da tarde comportava muito bem uma programação de serviços. Serviços têm uma possibilidade infinita na televisão, e não existe nada mais popular que isso. Não é ensinar a fazer bolinho ou pregar coisa na parede. É mostrar maneiras para as pessoas melhorarem suas vidas, com entrevistas e um pouco de entretenimento. Dá para fazer e daria certo, desde que se usasse a cabeça.

Veja – Muita gente de televisão diz que foi o aumento de espectadores das classes C e D que incentivou o mau gosto na programação. Esse é um argumento válido?

Boni – Quem diz isso está transferindo para os outros a culpa por sua própria falta de imaginação. Os espectadores não são culpados por aquilo que a televisão faz. É como atribuir ao pedestre a culpa de quem o atropelou. Diante do aumento dos espectadores de classes mais baixas, o desafio era aumentar a quantidade de informação oferecida – não com didatismo, que isso não funciona, mas com táticas de entretenimento. Se uma pessoa entrou na sala e sabe menos que as outras, a atitude educada é tentar atualizá-la para que participe da conversa. A televisão tem, sim, uma dose de responsabilidade social.

Veja – O senhor mencionou o merchandising de creme para cabelo. É errado abrir espaço na televisão para esse tipo de publicidade?

Boni – Não vou chegar ao extremo de dizer que o merchandising deve ser banido, que é um erro em qualquer circunstância. Mas é preciso atentar para o contexto em que ele é utilizado. Usar a televisão apenas como canal de vendas é distorcê-la. É transformá-la num camelô eletrônico. Com isso, você joga fora um universo de possibilidades de um meio de comunicação que não serve só para vender, mas também para entreter e informar.

Veja – Como brigar pelo filé mignon da publicidade num mercado em que uma única emissora, a Globo, detém 60% das verbas dos anunciantes?

Boni – Quando a Globo começou, ela era a quarta emissora no mercado carioca e a quinta no paulista. Nós criamos uma programação inteligente e fomos à luta, buscar financiamento. Creio que esse é o exemplo a seguir. O anunciante procura na Globo o público qualificado. Ela tem um produto melhor. As outras emissoras precisam investir em programação para melhorar sua fatia no mercado publicitário. Se continuarem assim, vão ficar só com o anunciante da esquina. E isso, a longo prazo, é suicídio.

Veja – Até recentemente, apresentadores como Gugu, Eliana, Xuxa, Raul Gil e Angélica eram certeza de boa audiência. Por que tantos deles estão tendo problemas?

Boni – Porque nenhum apresentador segura sozinho um programa que não tem formato. Ele precisa ter coisas boas embutidas na sua atração, precisa ter bons quadros. E inquietação para mudar tudo de tempos em tempos. Justiça seja feita, alguns desses apresentadores até mudaram suas atrações recentemente. Mas podem ter feito isso tarde demais, depois de ficarem empacados numa fórmula que era quase radiofônica. Vinha um cantor, o apresentador dizia ?Vamos ouvir a música tal?. Depois o cantor ia embora, e aparecia horas mais tarde no programa da concorrência. Assim não dá.

Veja – A Xuxa mudou bastante seu estilo neste ano. Por que mesmo assim não alcança a audiência de antigamente?

Boni – Xuxa teve um apelo extraordinário vinte anos atrás. Ela conseguia uma conexão muito boa com as crianças. Hoje ela é uma mulher de 40 anos. Melhorou como apresentadora, mas já não é uma garota brincalhona, já não tem toda aquela espontaneidade. Dito isso, eu não deixaria a Xuxa sair da Globo de maneira nenhuma. Ela é linda, é experiente e tem gás para fazer muita coisa ainda. Causaria um abalo e tanto trabalhando em outra emissora.

Veja – Fausto Silva, do Domingão do Faustão, é um apresentador que tem ciclos. Sua audiência está boa agora, mas ele passou por alguns anos difíceis. Que conselho o senhor daria a ele?

Boni – O Fausto Silva é um ótimo apresentador, mas tem momentos em que parece cansado de tudo, mal-humorado. Acho que ele se beneficiaria de uma postura mais ativa no programa. Deveria aproveitar mais a velocidade de raciocínio que tem e sua habilidade de repórter. Deveria sair um pouco mais do estúdio e tornar-se o comandante supremo da sua atração. Faria bem a ele.

Veja – A televisão está prestes a passar por uma revolução, com a adoção do sistema digital de transmissão. O que isso vai significar?

Boni – Do ponto de vista tecnológico, o sistema digital vai permitir a convergência de vários meios de comunicação: internet, TV, telefonia. Idéias como a interatividade vão se tornar muito mais palpáveis. Do ponto de vista político, o projeto que está em debate tem sérios problemas, a meu ver. Ele vai contemplar os atuais concessionários com mais quatro canais de televisão. Isso por decorrência direta da adoção da nova tecnologia, que permite que um canal digital seja desdobrado até em quatro. Ou seja, emissoras que já não conseguem operar um canal tradicional de maneira decente passarão a ter até cinco. Eu não quero ver o bispo Edir Macedo ou o Programa do Ratinho em alta definição. Não precisamos ver programas ruins com essa tecnologia.

Veja – O senhor acha que o Ratinho merece estar em horário nobre?

Boni – Acho um erro desprezar o Ratinho. Ele sabe falar com o povo, e isso é muito difícil. O problema não é o homem, é o seu programa. É o veículo que ele utiliza para expor suas qualidades de comunicador, que não são poucas, no caso de Ratinho. Todo mundo está sujeito a deslizes. Mas, quando os deslizes se tornam rotina, é sinal de que está faltando orientação. Gostaria de ter o Ratinho sob minha direção. Seria possível fazer muita coisa com ele.

Veja – A última grande novidade na televisão foram os reality shows. Seu filho, Boninho, dirigiu o de maior sucesso, o Big Brother. O senhor gosta dos programas que ele faz?

Boni – Acho que o formato do Big Brother, especificamente, tem uma falha grave, que é não permitir muitas modificações. Depois da primeira edição, todos os participantes se deram conta de que tinham de construir um personagem para se dar bem. Nas próximas edições, se houver, é inevitável que comecem a aparecer os clichês. E isso deve enjoar. Se fosse eu, faria apenas uma edição do programa por ano. Não assisti a esse último programa que o meu filho dirigiu, O Jogo, mas sei que não está dando audiência. Meu diagnóstico é simples: um programa com esse nome deveria contar com a participação do telespectador. Do jeito que foi feito, não tem graça nenhuma para quem o vê. É um erro da Globo. Quanto ao trabalho propriamente dito do Boninho, acho que ele aprendeu a tirar leite de pedra. Depois de sofrer muito na minha mão.”

 

A GRANDE FAMÍLIA

Se todos fossem iguais…”, copyright Veja, 18/6/03

“Quando pôs A Grande Família no ar, no começo de 2001, a Rede Globo não tinha maiores pretensões. Foram programados apenas doze episódios da série, remake de um humorístico que fez sucesso nos anos 70 com histórias sobre uma família do subúrbio carioca. Os principais atores do elenco, Marco Nanini e Marieta Severo, só toparam participar porque o compromisso era de curto prazo. Passados dois anos, A Grande Família continua em exibição porque seu sucesso é formidável. Em sua terceira temporada, alcançou a média de 40 pontos de audiência, a melhor da TV brasileira no horário das 21h30. Toda quinta-feira, 62% dos televisores ligados no país sintonizam o programa, que realiza o sonho de qualquer diretor de emissora: atrai espectadores de todas as classes sociais e de todas as faixas etárias. Famílias inteiras assistem à Grande Família. Há tempos não se via nada assim. ?Para completar, o seriado não é caro. Cada episódio custa os mesmos 200.000 reais de um capítulo de novela. Estamos eufóricos, é a fórmula ideal?, diz um executivo da Globo.

O original de A Grande Família tinha texto de Oduvaldo Viana Filho, o Vianinha, nome importante nos primórdios da TV brasileira. Para reformular o seriado, a Globo contratou o roteirista Cláudio Paiva, que já havia trabalhado no dominical Sai de Baixo, e pediu que ele retomasse velhas histórias de Vianinha. ?A premissa ainda era boa, mas tivemos de fazer muitos ajustes. A personagem Nenê, por exemplo, era uma dona-de-casa que mal abria a boca. E havia um filho politizado que resolvemos eliminar?, conta Paiva. Na primeira temporada, o programa alcançou 22 pontos no Ibope, apenas o suficiente para não ser extinto. Na segunda, os episódios passaram a ter enredo inédito e a popularidade aumentou. Uma mudança de horário deu o impulso final à audiência. ?Antigamente íamos ao ar depois do policial Linha Direta. Não tinha clima. Acabava o tiroteio e entrava aquela música do quais-quais-quais-quais?, diz Paiva, referindo-se ao célebre tema musical do seriado.

Não é difícil entender o sucesso de A Grande Família. A série lida com temas próximos ao cotidiano da classe média e da classe média baixa e emprega uma fórmula de humor popularesca, mas não grosseira. A atriz Marieta Severo arrisca uma explicação adicional para a simpatia que o programa desperta. ?Os personagens são todos malandros, mas não são maus. Eles querem se dar bem, sem no entanto prejudicar o vizinho?, diz ela. Outro trunfo, finalmente, está no elenco, que mistura veteranos como Rogério Cardoso (o avô Florêncio) e jovens como Guta Stresser (a espevitada Bebel). ?O clima das gravações é ótimo?, conta Cláudio Paiva, que testemunhou enormes trombadas de egos nos bastidores do Sai de Baixo. No caso de A Grande Família, até um ator notoriamente ansioso para aparecer como Pedro Cardoso (o taxista Agostinho) tem se mantido tranqüilo. Nos próximos episódios, a trama deve girar em torno de Bebel, que será demitida do emprego. Mas ocupação não vai faltar para a família Silva. Ela deve ganhar até um filme, no ano que vem.”

 

TV PÚBLICA

TVs públicas: sempre em crise!”, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 13/6/03

“Quais seriam os ?verdadeiros? desafios da TV pública no Brasil? Buscar soluções para superar a eterna crise financeira ou justificar a sua existência junto ao público que insiste em ignorá-la. Sempre com o ?pires na mão? e cada vez mais afastada de seus objetivos, tenho sempre a impressão de que só nos lembramos da existência das TVs públicas brasileiras quando lemos as manchetes de uma nova crise no setor ou quando promovem novos seminários para discutir problemas de sempre.

Esta semana não foi diferente. Em mais um encontro de ?sábios? promovido pela TVE no Rio, falou-se muito dos modelos estrangeiros bem sucedidos e de novas ?promessas? para o setor. Assume-se que um certo e indefinido público telespectador ?quer? uma vaga noção de ?qualidade? na TV e culpa-se sempre a falta de dinheiro pela crise. Discute-se pouco a realidade brasileira porque, em verdade não temos pesquisas sérias sobre o público e sobre as próprias TVs estatais. A única referência de qualidade e sucesso ainda é o mesmo e duvidoso índice de audiência das TVs abertas: o velho e famigerado Ibope. Também se acredita muito nos recorrentes elogios de alguns críticos de TV que odeiam TV, mas que almejam um bom emprego. Evita-se com isso uma tão necessária auto-crítica sobre os verdadeiros problemas que assolam as nossas TVs públicas. Contrapõem-se, necessariamente TV aberta com ?baixaria? e TV estatal com ?qualidade?. Será mesmo?

As manchetes na imprensa que há alguns dias descreviam a falência da TV Cultura, os problemas de orçamento, as demissões de funcionários e o sucateamento das TVs estatais, foram substituídas por muitas idéias ambiciosas e poucos fatos concretos em mais um encontro que deveria apontar soluções.

Para as TVs públicas brasileiras. Falta tudo. Falta dinheiro, mas também falta criatividade e ousadia na programação e, principalmente, transparência na sua gestão. Exigir explicações, perguntar não significa, necessariamente, criticar o modelo. Afinal, como são admitidos os funcionários e dirigentes da TV Cultura ou da TVE? Eles foram selecionados, concursados ou ?indicados? por critérios de experiência, ?amizade? ou sintonia política? Quanto recebem? São prestadores de serviço (terceirizados) ou são funcionários de verdade? Quais são os critérios para escolher as produtoras que terão seus programas inseridos na grade de programação das emissoras públicas? Quanto elas recebem por esse serviço? Como são gastas as verbas obtidas com a publicidade? Os milhões de reais fornecidos pelo governo paulista e federal seriam realmente insuficientes para produzir uma boa televisão ou haveria má administração de recursos públicos? Ainda existe o tal ?cabide de empregos? com excesso de ?apadrinhados?? Por que os telespectadores paulistas se revoltaram tanto contra a idéia, baseada no modelo estrangeiro da rede de TV britânica BBC, que criava uma taxa adicional em conta de luz para sustentar uma televisão tão boa, importante e necessária como a TV Cultura? Por que tantos programas de entrevistas, tantos programas chatos e nenhuma ?experimentação? ou tentativa de inovação de linguagem televisiva? Qual o grau de participação do público na escolha da programação das nossas TVs públicas? Será que todos os telespectadores estão satisfeitos ou querem arcar com os custos das nossas televisões públicas? Afinal, para que servem as televisões públicas brasileiras?

São muitas perguntas e poucas respostas. Pessoalmente, torço muito por esse modelo de TV, mas também creio que já é hora para pensarmos em novas justificativas para os seus problemas, renovação, parceria com universidades e novas iniciativas para garantir a sua sobrevivência. Insistir na falta de dinheiro num país pobre como o Brasil, com pouquíssimos recursos públicos, com gente passando fome, mas que assiste novelas e tantas outras ?baixarias? em TV aberta, pode não ser a melhor solução. Precisamos definir melhor o que é essa tal de ?baixaria? na TV. E já que adoramos os modelos estrangeiros de TV pública e a programação importada do National Geographic em horário nobre de TV educativa brasileira seria bom lembrar que ?crise? em caracteres chineses não se traduz por ?falta de dinheiro?, mas por ?risco e oportunidade?!”