Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Roberto Maciel

O POVO

“Democracia é bom. E ponto final”, copyright O Povo, 16/3/03

“Entre os patrimônios que tem, a pluralidade é certamente um dos mais caros ao O Povo. É o fundamento sobre o qual permite-se à sociedade expor, por diferentes ângulos, pontos de vista sobre temas que, algumas vezes polêmicos, merecem discussão aprofundada. Mesmo que não reflitam a opinião do jornal, análises várias encontram espaços em suas páginas. Isso, não há dúvida, favorece o julgamento do leitor, enriquece o debate e fortalece a democracia e a liberdade de expressão. No entanto, há regras a serem seguidas. A Carta de Princípios do O Povo estabelece no item ?Imparcialidade e Lealdade? que ?todo cidadão tem direito a um tratamento leal e imparcial, independente da posição do O Povo em relação a ele?. O Código de Ética da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), subscrito pelo O Povo, tem entre seus preceitos o de ?defender os direitos do ser humano, os valores da democracia representativa e a livre iniciativa?. Por fim, o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros prevê que o profissional deve ?tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que divulgar?.

Aos que consideram maçantes considerações com ares legalistas, explico as que fiz à guisa de preâmbulo. Na edição do último dia 8, a página de Opinião do O Povo trouxe um artigo intitulado ?Intervenção já?. Assinado pelo jornalista Themístocles de Castro e Silva, o texto começava com uma avaliação muito particular e, obviamente, estranha aos conceitos de liberdade: ?Democracia é bom até certo ponto?. Em seguida, o autor listava uma série de razões para questionar os fundamentos democráticos, defendendo que o Governo Federal intervenha no do Rio de Janeiro. Para sustentar o que alegava, Themístocles avaliou que ?aproveitando a presença, no governo (do Rio), de duas mulheres incompetentes e sem experiência em nada, os bandidos resolveram pegar para valer?. Vale lembrar, como curiosa coincidência, que o artigo foi publicado no Dia Internacional da Mulher.

No dia seguinte, uma nova investida. No caderno People, com um artigo intitulado ?Só Pinheiro Landim?’, o jornalista criticava o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, que avaliara em uma entrevista que o episódio dos grampos telefônicos na Bahia, no qual é acusado o senador Antônio Carlos Magalhães (PFL), atenta contra a democracia. Escreveu Themístocles: ?Sabem quem é José Dirceu? Foi um dos trocados pela liberdade do embaixador dos Estados Unidos, Charles Elbrick, sequestrado (sic) pelos comunistas. Como foi um dos dezoito, claro que era figura importante na subversão. Depois, passou vários meses em Cuba treinando terrorismo. Fez plástica para chegar ao Brasil. De onde, portanto, José Dirceu tirou autoridade moral para falar em democracia? Ele e demais comparsas estão importantes hoje porque as Forças Armadas derrotaram o golpe comunista em andamento no governo de João Goulart e depois foram excessivamente liberais na concessão da anistia?. Fosse em outro tipo de regime, como o dos governo militares no Brasil, criticar um ministro dessa forma e chamar seus aliados, companheiros ou correligionários de ?comparsas? resultaria em ? vamos deixar assim ? fortes dores de cabeça.

Não cabe ao ombudsman do O Povo tecer considerações sobre opiniões expressas em artigos, desde que estas não venham a contrariar os interesses dos leitores e os princípios e a qualidade do jornal. Também não está na natureza nem entre as convicções deste ombudsman defender censura às idéias de quem quer que seja. Nos casos abordados, no entanto, estão desrespeitados aspectos da normatização interna da empresa e mesmo os da Constituição, que define como invioláveis ?a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas? e que estabelece que ?a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais?. Nada, no entanto, que uma decisão editorial não possa resolver.

Consumidor sem vez

O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) divulgou terça-feira um estudo sobre a (in)eficiência das agências reguladoras de serviços públicos, institutos deixados com heranças pelo governo tucano, e de órgãos que fiscalizam setores como o bancário e o agropecuário. A pesquisa mostrou um desempenho sofrível ? no máximo regular. E indicou que o cidadão tem acesso restrito a essas agências, que, segundo se constatou, não têm a transparência como traço marcante. O Editorial do O Povo foi preciso: ?Os consumidores não se sentem de nenhuma maneira defendidos por esses organismos?. Editoriais, porém, mais analisam do que detalham fatos. O aprofundamento das informações cabe às editorias ? neste caso, de Economia. Embora o assunto tenha sido foco da opinião institucional do jornal e, de resto, tenha recebido destaque em todos os noticiosos da TV e em outros veículos impressos, no O Povo foi tratado como uma breve na página 21. Pior do que isso, trazia um título que atrapalhava mais ainda o entendimento do leitor: ?Aneel é eleita como a melhor agência?.

O texto da breve desinformava. Vamos reproduzi-lo, mantendo uma falha de edição no início: ?Um levantamento feito pelo Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), algumas agências e institutos têm melhorado o seu relacionamento com os usuários de serviços públicos, como Aneel (energia), Anvisa (vigilância sanitária), Inmetro e Anatel (telecomunicações). Apesar da crise energética, a Aneel aparece em primeiro lugar no ranking (nota 5,8) do Idec, seguida por Anvisa (5,6), Inmetro (5,1) e Anatel (4,6). Um dos critérios de avaliação foi o acesso às informações?. A pesquisa não fazia referência a uma suposta ?melhora? no relacionamento entre agências e usuários de serviços. Mais ainda: o critério de acesso a informações foi um dos que mais pesaram na análise negativa da atuação dos órgãos. A nota aproximou-se, e muito, de uma versão maquiada da realidade.

Nossos erros dos outros

?Foi preso no final da tarde de ontem, em Sobral (…), Francisco Leonardo Moura, em uma ação conjunta das polícias Militar e Federal?. Assim, O Povo errou sexta-feira, como toda a imprensa local, ao informar a ?captura? do chefe de uma quadrilha que agia no Cariri. Tudo engano. O detido, no caso, tinha como única culpa ser homônimo do procurado. O erro foi originado na Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), que até enviou para as redações um fax com a foto do suspeito. Na edição de sábado (15), o reconhecimento da falha grosseira da SSPDS. Mas também uma constatação: o erro da Polícia tornou-se um erro do jornal.”