O POVO
"O diploma no banco dos réus", copyright O Povo, 19/1/03
"A exigência de diploma para o exercício do jornalismo, tema polêmico, que mobiliza discussões em fóruns sociais diversos, sofreu mais um baque este mês. Sentença da juíza Carla Abrantkoski Rister publicada no último dia 10 no Diário Oficial do Estado de São Paulo põe fim ao requisito de formação superior para o jornalista. A juíza acha que o diploma tem ?cunho elitista, considerada a realidade social do país?, e ofende ?princípios constitucionais, na medida em que impõe obstáculos ao acesso de profissionais talentosos à profissão, mas que, por um revés da vida, que todos nós bem conhecemos, não pôde ter acesso a um curso de nível superior, pelo que estaria restringida à liberdade de manifestação do pensamento e da expressão intelectual?. Mas, para a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), ?a juíza mantém a confusão entre exercício profissional do jornalismo e direito de expressão. Enquanto o direito de expressão é inerente à existência da cidadania em qualquer sociedade democrática, e válida para todos, o exercício da profissão atinge tão somente aqueles que utilizam o jornalismo como meio de vida?. A Fenaj já anunciou que vai recorrer da decisão.
A questão é, de fato, polêmica. No Ceará, há um relativo consenso entre dois pólos. De um lado, Manoel Eduardo Pinheiro Campos, presidente do Sindicato das Empresas Proprietárias de Jornais e Revistas do Estado – que faz questão de dizer que as opiniões que expressa são estritamente pessoais, pois a entidade ainda não formou juízo sobre o assunto. Do outro, Fred Miranda, presidente do Sindicato dos Jornalistas. Ambos aferem credibilidade à formação profissional no curso superior de Jornalismo. Acompanhe suas opiniões.
O Povo ? O que muda com a decisão da juíza Carla Rister?
Eduardo Campos – É muito prematuro analisar a decorrência jurídica de uma decisão para a qual ainda há recurso. Reservo-me o direito ou a prudência de aguardar o desenrolar dos acontecimentos.
OP – A juíza avalia que a obrigatoriedade do diploma é inconstitucional. O que o senhor acha?
Campos – Não se pode negar uma formação, seja lá qual for, a ninguém. E todas as pessoas, para exercer sua profissão, necessitam do diploma. Desde que temos cursos em funcionamento, já fundamentados, acho que não há nada mais justo do que garantir o acesso à formação.
OP – A dispensa do diploma específico para jornalistas não prejudicaria a qualificação da mão-de-obra na área?
Campos – Acredito que não, mas quebraria uma tradição do ensino brasileiro. Vamos à faculdade não só para aprender, mas para conquistar um diploma.
O Povo – Com a decisão da juíza Carla Rister, que medidas jurídicas e políticas as entidades dos jornalistas poderão tomar para restaurar a obrigatoriedade do diploma?
Fred Miranda – As medidas jurídicas já estão sendo tomadas. O que nesse momento acho de suma importância são os encaminhamentos políticos das entidades representativas.
OP – A desmobilização fragiliza os recursos contra o fim da obrigatoriedade do diploma?
Fred – Não pode estar desmobilizado o que nunca foi mobilizado. Os jornalistas continuam atuando, nesse caso específico, de forma sazonal. Às vezes, mais coesos e em outras através de arroubos individuais. E não poderia ser diferente em decorrência do tamanho do nosso país e de sua diversidade cultural. As muitas experiências regionais do fazer jornalístico acabam por inviabilizar uma atuação política uníssona.
OP – O que é inconstitucional, o diploma – como defende a juíza – ou o acesso de profissionais sem nível superior a um meio que a cada dia exige mais qualificação?
Fred – Falar em inconstitucionalidade em um país em que a grande maioria não tem acesso à coisa alguma, aí incluída a Justiça, nos parece uma piada de gosto duvidoso. É verdade que mudanças estão acontecendo no Judiciário. Nesse caso, me dou ao direito de questionar a peça jurídica da douta juíza, como um desserviço não só a nós jornalistas, mas também à população que será tolhida no seu direito de ter uma informação ética, de qualidade e democrática.
?Analfabetos?
Um artigo de Temístocles de Castro e Silva no caderno People (domingo, 12) chama atenção por desprezar postulados do jornalismo. Pode-se até concordar que os apresentadores de TV Gugu Liberato e Fausto Silva, contra quem ele escreveu, não primam pelo conteúdo de seus programas, mas o jornalista extrapolou os limites da crítica. Temístocles os chamou de ?analfabetos? e incorreu numa agressão à Carta de Princípios do O Povo. A Carta estabelece, no segundo item, que ?todo cidadão tem direito a um tratamento leal e imparcial, independentemente da posição do O Povo em relação a ele?. E tem o amparo do Código de Ética da empresa: ?A informação será sempre passada ao leitor de maneira precisa, exata, substantiva, respeitando-se os limites da privacidade e do bom senso?. Além disso, segundo o Código de Ética dos Jornalistas, é dever do profissional ?tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que divulgar?. Se um jornalista antigo e prestigiado como Temístocles ignora regras básicas, como cobrar isso de outros mais jovens?
O que poderia ter sido e não foi
O Povo publicou segunda-feira (13) uma entrevista com então o deputado Pinheiro Landim (sem partido), feita pelo jornalista Walter Gomes, que atua na imprensa de Brasília. O que poderia ter servido para desfazer dúvidas da sociedade sobre acusações de que o parlamentar intermediaria habeas corpus para traficantes não teve substância. Os leitores encontraram um repórter complacente e um entrevistado evasivo. Questões básicas, como de quem eram os R$ 140 mil achados pela Polícia Federal na casa do motorista do Pinheiro Landim, não foram tocadas. E, em matéria coordenada, Gomes escreveu que do deputado ?não se conhece o talento para ator?, que na entrevista ele era ?a encarnação do sofrimento? e que ?até prova em contrário, não pode ser incluído no grupo dos violadores da legislação, a civil e a penal?. Mais antijornalístico, impossível."