Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Roberto Maciel

O POVO

"O leitor que não consegue ler", copyright O Povo, 10/8/03

"Recebi no último dia 1? e-mail que, mais do que uma queixa direcionada, é um estímulo à reflexão. Não uma reflexão individual ou exclusiva da imprensa, mas recomendável a todos os que, de uma forma ou de outra, produzem ou consomem o que faz a indústria da comunicação. O remetente, Francisco Alberto Oliveira, manifesta incômodo com o uso freqüente de palavras de outros idiomas nos jornais. Reproduzo trechos do texto, dirigido inicialmente à colunista Sônia Pinheiro ? dona de estilo particular que em alguns pontos torna-se uma exceção às normas de redação do jornal ?, mas retransmitido a mim, à Chefia da Redação e ao editor-sênior do O Povo: ?Nas décadas dos anos 60 e 70, quando aqui vivi por quinze anos, o jornal O Povo era minha leitura preferida. Havia muita preocupação com a linguagem escrita. Decorridos esses anos e, de volta à terra, a situação parece ser bem diferente. Refiro-me aos estrangeirismos que parecem impregnados no nosso linguajar cotidiano. O brasileiro, de modo geral, parece ter fascínio por coisas inusitadas. No caso do nosso idioma, tenho quase certeza, há uma absorção quase que involuntária por parte da maioria, simplesmente porque está faltando uma campanha de conscientização nesse sentido. Quando isso acontecer, certamente os brasileiros se aperceberão da idiotice que estão fazendo (…). O que não consigo entender é como jornalistas responsáveis pela comunicação no Brasil (suponho-os todos graduados) desprezam as normas mais elementares da clareza, concisão e elegância de estilo para o desfrute do leitor, seu principal objetivo?.

Observando que não consegue ?ler O Povo como fazia anteriormente?, o leitor aponta na coluna de Sônia o que classifica como ?parafernália lingüística?, ?verdadeira miscelânea?, ?salada indigesta mesmo, de palavras e expressões estrangeiras intercaladas com o nosso idioma de fazer inveja ao mais insensato dos radicais?. E se diz indignado: ?clic; dá start; com breakfast, amanhã, Cristina Parente, marca…; cocktail; com jantar, tipo open house, festejaram o nat dela; detalhe tr?s chic: o dine foi negado; assiste baixinhos e teens; blitz in; nats…?. Francisco Alberto recusa a pecha xenófoba. ?É preciso que fique claro, não estou repudiando o uso de palavras e expressões estrangeiras. Elas são bem-vindas e necessárias. O que me indigna é o seu uso abusivo, totalmente desnecessário e irracional?, escreveu. No entanto, avalia que o modo como são usadas pela colunista ?é puro desrespeito não só ao nosso idioma, mas à própria língua inglesa, à francesa e outras que estão sendo utilizadas desta maneira. Imagine-se um inglês, um americano ou mesmo um francês lendo O Povo e vendo sua Língua sendo ?remendada?. Que dirão os nossos patrícios portugueses, que a zelam muito? os franceses são verdadeiros guardiões de seu idioma?.

Para o leitor, não há como entender que se use cocktail no lugar de coquetel; sport em substituição a esporte; chic em vez de chique; breakfast para definir café-da-manhã; teen em vez de adolescente; birthday para tratar de aniversário. E tem razão. O Guia de Redação e Estilo do O Povo contempla o assunto. Na seção ?Questões gramaticais, redação e estilo?, o verbete ?Estrangeirismos e palavras aportuguesadas? orienta o seguinte: ?Palavras e expressões estrangeiras só devem ser admitidas quando já se incorporaram ao uso corrente, como outdoor, réveillon, show, blitz, jazz. Quando têm equivalente em português, devem ser substituídas, como know-how por conhecimento, experiência, prática, perícia. Palavras e expressões estrangeiras, quando pouco conhecidas ou de difícil tradução, devem ser seguidas de explicação, entre parênteses. Palavras estrangeiras que se incorporam ao vernáculo devem ser aportuguesadas de acordo com a índole de nossa língua: estresse (do inglês stress); grife (do francês griffe); bufê (do francês buffet)?.

Voltemos, pois, a Francisco Alberto. Em seu e-mail, ele faz uma avaliação: ?Tudo leva a crer que O Povo não dispõe de um manual de redação. Se o tem parece não segui-lo?. Consideração errada ? embora com motivos sobejos para justificar o equívoco. E, ao final, uma advertência: ?O que está havendo é um verdadeiro abuso, um desrespeito a nossa língua pátria, um distanciamento cada vez maior de nossa identidade, auto-estima baixa. Os estudiosos afirmam que a maneira mais fácil de se destruir um povo é começando pela sua Língua?. Com observei acima, o estilo de Sônia Pinheiro é muito pessoal, uma marca da colunista que a acompanha profissionalmente há anos ? é, portanto, legitimado pela aceitação de seu público. Mas que fique o alerta pertinente e bem colocado do leitor.

Uma luz contra os refletores

Preservação da imagem e da privacidade são direitos essenciais do cidadão. Está na Constituição. No entanto, a imprensa carrega nas costas a culpa de, por anos e anos, ter ignorado a lei e exibido ao público pessoas detidas ? algumas mesmo sendo inocentes. Jornais e programas de rádio e TV, com o consentimento tácito ou não da Polícia e do Judiciário, se valiam de gente detida para ganhar platéias. O Povo, mesmo com alguns deslizes, vem tentando há um certo tempo romper com essa prática. E, no mais das vezes, não publica nomes de pessoas ou instituições acusadas de irregularidades das quais ainda não há provas. Também não usa fotos de suspeitos, considerando que nessa condição não há constatação de crime. Agora, um reforço benfazejo: o Ministério Público Estadual, observando os preceitos constitucionais, conseguiu impedir que delegados exponham presos para fotógrafos ou cinegrafistas de TV ? a não ser que os próprios presos desejem. Para uma parcela da imprensa, que usava a desgraça alheia como ferramenta de trabalho, a medida é trágica. Mas, para quem defende a informação a serviço da cidadania, trata-se de um apoio essencial.

Previdência em pauta

Quarta-feira última O Povo fez trouxe uma de suas melhores edições dos últimos meses. O diferencial concentrou-se na cobertura da votação da Reforma da Previdência na Câmara Federal, um trabalho que mesclou produção local e textos de agências de notícias."