O POVO
?A verdade é uma só. Mas qual??, copyright O Povo, 12/10/03
?Quem leu nos três jornais locais, quarta-feira última, as matérias sobre o assassinato do policial civil Marcos Antônio Holanda, em Beberibe, deve ter ficado com a sensação de que algo estranho se passa na imprensa. O crime ocorreu na terça. Segundo a Polícia, em um cerco a traficantes. O Povo, O Estado e Diário do Nordeste trouxeram versões diferentes para o mesmo fato. Todos os textos, sem exceção, apresentavam lacunas, tinham informações confusas e deixavam visíveis deficiências de apuração. Como exercício de comparação, pincei de cada jornal pontos que considerei importantes e que apresentavam divergências. O quadro abaixo sintetiza esse cotejamento.
Versões
O Povo
? Quatro homens e uma mulher seriam suspeitos do assassinato. A matéria diz que os nomes não foram revelados pela Polícia.
? O local da troca de tiros teria sido a praia do Morro Branco.
? A equipe seria composta por três policiais ? Marcos Holanda, João Wellington Silva da Costa e ?o investigador Abreu?.
? Os assassinos teriam fugido em direção a Choró, segundo um policial civil.
? O jornal não menciona nenhuma operação policial realizada no município para tentar capturar os assassinos.
Diário do Nordeste
? Os suspeitos seriam um casal. A matéria não diz os nomes.
? O tiroteio teria acontecido na localidade de Tracoá.
? Quatro policiais ? Marcos, Wellington, Francisco Edvaldo de Castro Abreu e Luís Esmeraldo ? formariam a equipe.
? O jornal não diz na direção de onde fugiram os assassinos, e informa que até o secretário Wilson Nascimento teria ido para Beberibe acompanhar as buscas.
O Estado
? O suspeito seria um o traficante conhecido como ?Chiquinho?.
? O tiroteio ocorreu ?próximo às dunas do Morro Branco?.
? Haveria quatro policiais na equipe, mas só Marcos e Wellington têm os nomes citados.
? O jornal não indica a direção para onde fugiram os assassinos, mas menciona uma grande operação realizada na área, no início da noite, que teria envolvido cerca de 30 policiais.
É normal que matérias jornalísticas apresentem diferenças entre um e outro veículo. São resultados de ângulos que foram avaliados como mais importantes pelo repórter, de opções editoriais, de informações exclusivas ou mesmo do estilo e dos princípios das empresas que as publicam. Mas, diante de qualquer circunstância, mesmo não existindo linearidade, é óbvio que a verdade é uma só. E é unicamente sobre ela que o jornalismo deve se debruçar. Uma nova comparação na quinta-feira, esta também confrontando os textos das duas edições, indica que o Diário do Nordeste foi o que mais se aproximou dos fatos, o que os apurou melhor: estavam certas as informações de que o crime ocorrera em Tracoá e não em Morro Branco e que um casal era suspeito, assim como a de que um grande aparato policial foi deslocado para procurar os assassinos. E, mesmo O Povo tendo recuperado dados e os publicado na quinta, uma pergunta que certamente o leitor fez está sem resposta ? por que a matéria anterior continha tantas falhas?
Entre o fazer e o fazer de conta
A imprensa costuma confundir as instituições públicas com as pessoas que as compõem. Ou as dirigem. É uma distorção. Terça-feira, uma nota na coluna Vertical, intitulada ?É o bicho?, registrava: ?Presidente da Assembléia, Marcos Cals, realizará hoje, às 14h30min, no Centro Comunitário das Goiabeiras, uma audiência pública sobre o problema do bicho-de-pé, que atinge mais de 400 famílias naquela área da Barra do Ceará?. Atribuiu-se àquele deputado, de forma indevida, uma ação da instituição que ele dirige. Pior, creditou-se a Marcos Cals uma iniciativa que nem dele era. Afinal, a audiência havia sido requerida pelo deputado Antônio Granja (PPS), que é médico, por meio da Comissão de Saúde de Assembléia, a qual ele preside. Mesmo alertada por mim, a Redação não publicou a correção necessária.
Palavras calientes ? por isso queimam
Também na última terça a coluna Sônia Pinheiro usou a expressão ?baixinhos cancerosos? para designar crianças com câncer. Foi em uma nota intitulada ?Urnas 2004 ? Um toque caliente?, que tratava da filiação do cantor Sidney Magal ao PPS e de uma suposta vontade do artista de se candidatar a vereador de Fortaleza. Pela segunda vez notei tal construção naquele espaço do O Povo. A primeira apareceu na edição do dia 30 de setembro. Algumas palavras, entre as quais ?canceroso? e ?aidético?, já não são utilizadas pela imprensa que se diz cidadã. Estas, com o passar do tempo, ganharam conotação pejorativa e preconceituosa, daí o banimento. Usá-las dá a impressão de desrespeito a crianças doentes ? impressão esta que é absolutamente equivocada quando se trata de Sônia Pinheiro, que atesto como exemplo de educação e delicadeza. E sugere, pelo menos, um lamentável momento de vácuo vernacular. Mas vale notar: sexta-feira, a coluna substituiu o ?baixinhos cancerosos? por ?criancinhas carentes portadoras de câncer?. Já é um avanço.
O sangue ferve por votos
A propósito, a imprensa local ainda não se mostrou curiosa a respeito do repentino desejo de Sidney Magal de entrar na disputa por uma vaga na Câmara Municipal. Dele, sabe-se que conhece pouco Fortaleza, onde vem apenas esporadicamente, na pele de animador de festas promovidas por grupos de senhoras. Sabe-se também que é carioca e que nunca externou a ambição de ser vereador na cidade do Rio de Janeiro ou na cidade de Salvador, onde mora. Mais do que isso, que nunca teve militância partidária. Por que, afinal, pretenderia ingressar na política logo por Fortaleza? Além de não estranhar o que é por si estranho, os jornais ainda publicam avaliações assim, como na coluna Sônia Pinheiro de sexta-feira: ?O fato é que a modernidade e a visão do PPS cirista abriram as portas a Sidney Magal, que se diz, acima de tudo, um brasileiro! E, agora, cearense de coração (…).
Perdão, mas nem tanto
Que leitor nenhum se guie pelo que informa o título ?IPVA ? Governo quer perdoar inadimplentes?, publicado na Editoria Política, no último dia 4 (sábado). O Governo do Estado não quer nem pode perdoar inadimplente nenhum. Na verdade, a meta é diminuir juros e multas das dívidas referentes ao Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores para tentar receber o que é devido. O editor-executivo do Núcleo de Conjuntura, Guálter George, não reconhece falha no título. Já eu apontei aquilo como ?erro brutal?."