Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

S. Pedro não quer ser seduzido

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ESTAÇÃO DAS SECAS

Alberto Dines

O segundo semestre do ano passado foi especialmente seco. Além da rigorosa estiada de inverno, uma primavera pouco aquosa. Em seguida, um verão tórrido que nem as trombas d?água e o granizo conseguiram amenizar.

Então, às vésperas do Dia Internacional da Água, somos sacudidos com notícias sobre racionamento de água e luz: os reservatórios nunca estiveram tão secos.

De repente, descobrimos que as secas acontecem de repente.

E o que fizeram nestes últimos seis meses nossas lindas meteorologistas? Foram bronzear-se na praia? Conviria perguntar, antes: temos efetivamente jornalistas especializados em meteorologia, meteorologistas capazes de explicar o que se passa nos céus ou apenas garotas deslumbrantes que esticam a mãozinha numa graciosa e inútil pantomima?

Os jornais em geral ocupam meia página com as previsões ? todas iguais, ambíguas, nenhuma suficientemente objetiva e esclarecedora. As TVs, como sempre, apelam para a erotização como se S. Pedro precisasse ser seduzido para nos propiciar um regime hídrico equilibrado. Há uma seca no Nordeste mas ninguém se lembra de relacionar com as condições climáticas do Sudeste. E vice-versa.

Tudo estanque, segmentado, como se fossem veículos diferentes ? o fechador do caderno com a tabela meteorológica não se interessa pelo material que recebe pelo computador, nem lê ou se lê é para compor um título burocrático. Se a mulher perguntar se vai chover amanhã, é bem capaz de pegar o jornal do dia anterior. Este editor não se comunica com o editor de economia (em geral o mais informado nesta questão) para saber da safra agrícola. Repórteres aéreos cobrem apenas o engarrafamento de trânsito esquecidos de que em dois minutos de vôo podem verificar o nível dos reservatórios e manter a população informada.

As editorias de cidade são pautadas pelos releases ? enquanto não chega um comunicado apocalíptico ninguém se abala. E as autoridades só emitem comunicados apocalípticos na 25? hora quando a situação é irreversível, efetivamente crítica.

Neste meio tempo, ninguém se empenhou em cruzadas de racionalização do uso da água, ninguém advertiu que a água é um bem esgotável e ninguém reparou que jornalismo é um serviço público.

Exagero: na internet, na CNN e na BBC pode-se ter uma boa noção do que os céus estão armando para nós.

Mas então para que temos rádios, jornais e poderosas redes de TV?

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