Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Só vendo para crer

AO VIVO, EM CORES

Beatriz Singer

Não houve como desgrudar os olhos da TV ou do computador no dia 11 de setembro. Seja porque a mídia não deixou por um minuto de noticiar detalhes e andamentos dos ataques terroristas a Nova York e Washington, seja porque apenas vendo as cenas horripilantes várias vezes fosse possível acreditar na tragédia que assolara a cidade mais poderosa do mundo.

Sem efeitos especiais, as imagens lembravam Inferno na Torre e Independence Day. Mas ali tudo era real, e os espectadores ficaram paralisados, impotentes e traumatizados ao acompanhar cada passo do desastre, segundo Tom Shales [The Washington Post, 12/9/01]. Para a TV, foi um dia tão angustiante quanto o do assassinato do presidente Kennedy, em 1963; para os EUA, foi o dia em que o povo americano sofreu a maior catástrofe desde o ataque a Pearl Harbor, em 1941. O deputado republicano Newt Gingrich, entrevistado na Fox News, pode ter sido o primeiro a chamar o ataque de "o Pearl Harbor do século 21". Outros usaram a frase com o passar do dia.

Tudo começou com certa desconfiança. Na ABC, Diane Sawyer, do Good Morning América, disse aos telespectadores que "uma espécie de explosão atingiu o World Trade Center". Em poucos minutos ficou claro o que ocorrera. Um correspondente da ABC podia ser ouvido ao fundo gritando, atônito, "Oh, my God!", quando a segunda das torres gêmeas foi atingida. Pouco mais tarde, foi a vez do Pentágono, um prédio que os americanos acreditavam inatingível.

As emissoras decidiram suspender os comerciais e deram início a uma cobertura intensa do pior ataque terrorista da história dos EUA. Quando telefones, celulares e até a internet pareciam não funcionar, a TV manteve-se firme, informando cada detalhe ao espectador mais compulsivo. Apesar de não ter havido pane nas emissoras, as equipes de reportagem por diversas vezes tropeçaram ao tentar receber informações no ar, com as cenas pulando rapidamente de Nova York para Washington e de volta a Nova York.

As imagens eram incomparavelmente poderosas e entristecedoras, mas palavras também se faziam necessárias e, com o passar do dia, minguaram.

"Foi um filme de televisão, certo? Algum espetáculo de ficção científica do patamar de Independece Day, aliens pairando no alto, planos aparentes de atacar o governo americano?". Assim começou Howard Rosenberg sua coluna no Los Angeles Times, no dia 11. Não foi ficção, claro, muito embora uma nação inteira pudesse, por pouco mais de um segundo, ter pensado isso.

A seqüência de um dos aviões explodindo numa das torres, segundo Rosenberg, foi possivelmente a imagem épica da TV de nossos tempos. Os correspondentes estavam angustiados a ponto de começar a recordar o passado, como Harold Dow, da CBS. Foi, também, um dia de eloqüência. "Nós estamos vulneráveis por causa de todas as coisas que nos fazem tão bons", disse Tom Brokaw, da NBC News.

De forma geral, as imagens se destacaram em relação à narração dos repórteres. As reportagens, responsavelmente contidas, foram dirigidas por jornalistas que sabiam que palavras descuidadas poderiam pôr em pânico os americanos ? que naquele momento confiavam piamente no que era dito e exibido pela TV.

Na tarde do dia 12, quase todas as emissoras noticiosas utilizaram a reportagem ao vivo da CNN em Cabul, capital do Afeganistão, onde ocorriam explosões desencadeadas por mísseis. Segundo Howard Rosenberg [The Los Angeles Times, 12/9/01], ninguém parecia saber se aquilo era retaliação americana contra o governo dos talibãs.

Tudo apontava para um dia de poucas palavras. Acima de tudo, foi um dia em que a TV sentiu orgulho de si mesma, pois desta vez a poeira e os escombros não vieram das bocas dos que estavam cobrindo o caso.

Erros inevitáveis

Naturalmente, houve muitos erros, na maioria pequenos. Na Fox News, um âncora disse "Vamos agora ao aeroporto Logan, em Washington"; o Logan, de onde os dois aviões seqüestrados partiram, fica em Boston. No estúdio da ABC News, o âncora Peter Jennings conversava com Anthony Cordesman, especialista em assuntos militares. Jennings disse que um rádio ao fundo fazia muito barulho. Cordesman virou-se e gritou à equipe: "Estou no ar com Peter! Vocês podem baixar isso?" Cordesman soou nefasto para um dia com notícias tão nefastas.

Para os telespectadores, o número de dúvidas pareceu infinito. Haveria outros ataques? Estavam os EUA, de fato, em guerra? Dan Rather, da CBS, referiu-se aos ataques como "a guerra mundial terrorista de 2001", depois que o prefeito de Nova York Rudolph Giuliani disse que a cena na cidade lembrava a Segunda Guerra Mundial. Mais tarde, Tom Brokaw comparou a tragédia a uma chuva nuclear, à medida que a câmera mostrava vítimas e ruas cobertas de cinzas

Julgamentos perigosos

Jennings fez uma cobertura maravilhosa, na opinião de Tom Shales. Antecipou-se em alertar aos telespectadores para que não atribuíssem a culpa aos árabes prematuramente pelo terrorismo. Mais tarde, pareciam inacreditáveis as cenas de palestinos dançando de alegria nas ruas, em festa pelo desastre ocorrido nos EUA. A Liga Árabe Antidiscriminação dos EUA se apressou em enviar porta-vozes às emissoras e novamente alertaram contra julgamentos precipitados.

Pouco antes das 18h, a história pareceu ter dado uma guinada total quando a CNN noticiou explosões em Cabul, aparentemente causadas pelo disparo de mísseis. Cerca de oito horas após o colapso das torres gêmeas, as pessoas assistiram, horrorizadas, à queda do anexo 7 do World Trade Center.

Diane Sawyer, então, disse à câmera da ABC: "Esta não é apenas mais uma reportagem, nem para repórteres que foram treinados para fazer isso por muito tempo. Tudo o que podemos fazer é reviver o horror cada vez que o vemos". A experiente Diane estava, definitivamente, assustada.

    
    
                     
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