Friday, 29 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Samuel Navaz

COLÔMBIA

"Colômbia, jornalistas e direitos humanos", copyright Folha de S. Paulo, 31/12/01

"Depois de ler a reportagem ?Colômbia é pior país para jornalista? (Mundo, pág. A12, 26/11), achei ser necessário apresentar alguns elementos adicionais sobre a situação da Colômbia, buscando dar mais profundidade e propiciando uma melhor compreensão sobre a complexa realidade em que vivemos dentro de nossa nação.

A Colômbia passa por um dos momentos mais difíceis de sua história. Nunca antes as ameaças contra suas instituições por parte de grupos armados à margem da lei haviam sido tão notórias nem os efeitos das hostilidades sobre a população civil haviam sido tão marcados. O sequestro, os massacres, a destruição sistemática de elementos vitais de nossa infra-estrutura econômica, os ataques a populações inocentes com o uso de armas não-convencionais e de grande poder de destruição, o deslocamento interno de uma parte considerável dessa população e suas graves e negativas consequências sociais, culturais e psicológicas se converteram em parte da vida cotidiana de nossa nação. O problema é fortemente agravado quando agregada a espantosa e lucrativa indústria do narcotráfico, que tem servido de combustível, incrementando e possibilitando a continuação do conflito.

O presidente Andrés Pastrana, desde o início de seu governo, vem priorizando a busca da paz mediante uma solução negociada do conflito armado, que inclui vários componentes fundamentais, entre eles a política de respeito e promoção dos direitos humanos e do direito internacional humanitário.

Se é certo que nosso país vive uma situação difícil devido às complexidades advindas da acentuação do conflito armado, o que entre outras coisas tem levado a um incremento de ameaças contra a vida e assassinatos dentro de vários grupos vulneráveis, entre eles os de jornalistas, comunicadores, indígenas e sindicalistas, é necessário destacar de igual forma a política de promoção, respeito e garantia dos direitos humanos que o governo definiu como prioritária.

Os jornalistas, por causa de sua profissão, se converteram em vítimas do conflito armado. Em muitos casos, eles se erguem como defensores dos direitos humanos, pois, no exercício de suas atividades, eles assumem a difusão, a defesa e a preservação dos direitos humanos. Alguns foram atacados fisicamente; outros se viram forçados a sair do país por causa das ameaças. Por suas implicações para a liberdade de expressão, as violações dos direitos humanos dos jornalistas representam custos enormes para a democracia e têm uma grande repercussão social.

Levando isso em conta, o governo colombiano criou o o Programa de Proteção a Jornalistas e Comunicadores Sociais (decreto n? 1.592, de agosto de 2000), seguindo recomendações de organismos intergovernamentais de direitos humanos. Os mecanismos do programa foram acertados com as associações de jornalistas e colocaram em execução medidas de segurança para eles nas zonas de conflito.

O programa acolhe jornalistas que, em exercício de suas atividades profissionais, assumam a difusão e a defesa dos direitos humanos e que, por tal circunstância, se encontrem em situação de risco. Foram implementadas medidas dirigidas à cobertura de gastos de proteção, transporte e ajuda humanitária; medidas de proteção e de fortalecimento de uma rede de jornalistas; medidas pedagógicas sobre o papel dos jornalistas no conflito; e estão sendo elaborados manuais de autoproteção. Foi colocado em operação um comitê de avaliação de riscos, encarregado de definir os distintos aspectos da prestação de proteção aos jornalistas que a solicitem.

A vontade do Estado colombiano em esclarecer os casos e lutar contra a impunidade se demonstra na criação de uma subunidade especial de investigação sobre jornalistas na Unidade Nacional de Direitos Humanos do Ministério Público. Atualmente, ela investiga 28 processos em que foram vítimas jornalistas, dos quais 24 são casos de homicídio, 3 são casos de ameaça e 1 é caso de sequestro. Desses casos, 21 estão em fase preliminar, 2 estão em fase de instrução e 3 estão em fase de julgamento. Nos restantes, há uma sentença de absolvição e uma de condenação.

O trabalho do Ministério Público recebe o apoio do governo por meio da Vice-Presidência da República e de seu Programa Presidencial de Direitos Humanos e Direito Internacional Humanitário, com apoios logísticos e um pequeno fundo de ajudas de emergência, que conta com a cooperação internacional. Esses esforços institucionais da Vice-Presidência são ainda coordenados com os do Ministério do Interior e com os da Defensoria Pública.

A Colômbia mais do que ninguém reconhece a situação que atravessa. Os custos dessa dolorosa guerra têm sido assumidos por nosso país como nenhum outro país jamais o fez. Os assassinatos de jornalistas -como também os de juízes, de sindicalistas, de indígenas e até de candidatos à Presidência- fazem parte de uma injusta carga que nossa nação tem tido de carregar nos ombros por causa de um problema que é de natureza global.

Por isso seguimos insistindo na necessidade de atuar conjunta e solidariamente em resposta ao narcotráfico e ao crime transnacional. Trabalhar na aplicação do princípio de responsabilidade compartilhada, desde uma perspectiva integral e equilibrada, é a única maneira para a luta frontal e decidida da comunidade internacional contra o problema mundial da droga e seus delitos conexos. O contrabando e o desvio de componentes químicos, a lavagem de dinheiro e o tráfico ilegal de armas, munições e explosivos são elos de uma mesma cadeia de morte. Resultados globais satisfatórios na luta contra esse problemas certamente trarão reflexos na equação do conflito interno colombiano.

Espero que, com os elementos expostos, os leitores tenham maiores e melhores ferramentas para compreender os esforços da Colômbia -dentro de nossa complexa realidade de nossa nação- para conseguir a paz . (Samuel Navaz é o embaixador da Colômbia no Brasil)"

 

INTERNET

"Internet ganha mais com menos empresas", copyright Folha de S. Paulo, 1/01/02

"O número de empresas virtuais no Brasil encolheu, mas a ?nova economia? brasileira está mais saudável. Hoje, um número menor de concorrentes disputa um mercado que cresceu de forma sustentada em 2001: o volume de vendas online quase triplicou. Os investimentos de capital de risco, que somaram US$ 1,4 bilhão em 2000, caíram, mas chegaram a US$ 800 milhões.

Apenas parte do dinheiro foi investida em empresas de tecnologia. Os investidores, assustados com as perdas no mercado norte-americano, onde mais de 500 empresas virtuais faliram no ano passado, ficaram mais seletivos e cautelosos. ?Se antes os fundos analisavam dez projetos para escolher um, hoje a regra é analisar cem e, muitas vezes, não investir?, diz Mário Fleck, presidente da Accenture Brasil.

A estimativa de investimentos de capital de risco em 2001 é de Robert Binder, da ABCR (Associação Brasileira de Capital de Risco). Ele avalia que os investimentos ficaram em US$ 800 milhões no ano passado. É dinheiro investido em vários setores. Mas a preferência dos investidores é sempre por negócios com perspectivas de crescimento rápido e boa lucratividade. Ou seja, empresas ligadas a novas tecnologias como aplicativos para internet, biotecnologia, etc.

Sem especulação

?De maneira geral, não houve grande especulação no Brasil. Principalmente porque tivemos a oportunidade de observar o que acontecia no mercado norte-americano?, diz Binder.

Ele lembra, no entanto, que muitos investidores perderam dinheiro por aqui. Desapareceram provedores, como o Super11.net, varejistas, como o Fera.com e o Superofertas e sites especializados, como o Guialocal. ?O estouro não apareceu muito porque algumas empresas foram absorvidas, outras desapareceram silenciosamente?, afirma André Castellini, consultor da Bain & Company.

O estouro da pequena bolha especulativa no Brasil, a exemplo do que acontece nos EUA, não significa o fim dos negócios de internet. ?É óbvio que existiu uma bolha. Mas por trás dessa bolha havia uma onda de inovações. O que acabou foi a bolha especulativa, mas a onda continua?, diz Fleck.

Para quem sobreviveu, o resultado do ajuste é positivo. Primeiro porque com um número menor de empresas, cada uma pode ficar com um pedaço maior do mercado. Segundo, porque o mercado de internet continua crescendo a taxas estratosféricas. Terceiro porque, com o fim da especulação, acaba o dinheiro fácil, e as empresas que tendem a surgir são mais viáveis e sólidas.

?As empresas gastaram menos e cresceram mais em 2001, o que é um sinal de amadurecimento?, diz Paula Fonseca, que dirige a Invent, uma incubadora que cria e desenvolve novos negócios.

Ela lembra que, em época de dinheiro fácil, muitas empresas gastaram excessivamente com publicidade. ?Eram gastos irracionais. Isso não existe mais.?

Em 2001, o varejo online no Brasil movimentou US$ 906 milhões, quase o triplo dos US$ 335 milhões do ano anterior. A estimativa é do Boston Consulting Group e da Visa, que em novembro do ano passado divulgaram estudo sobre as tendências do comércio eletrônico na América Latina.

O mesmo estudo avalia que, mesmo que as economias da região não cresçam em 2002, as empresas virtuais podem se expandir. Motivo: o varejo virtual representa apenas 1% do varejo total e há, portanto, espaço para aumentar essa participação.

Seleção natural

Murillo Tavares, presidente do Submarino, chama o saneamento pelo qual passou o mercado de ?darwinismo quase cruel?. Mas, diz o executivo, depois da seleção natural pela qual passaram as empresas, ?acabaram as distorções?.

A empresa dirigida por Tavares foi uma das sobreviventes. Fecha o ano vendendo o triplo do que vendia em 2000. O site faturou R$ 76 milhões, vendendo de livros e CDs a perfumes e ferramentas.

Apesar de ter visto seus principais concorrentes virtuais irem à bancarrota, o Submarino continua enfrentando competidores. Agora, os oponentes são os varejistas tradicionais, como a livraria Saraiva, Lojas Americanas e Ponto Frio, que também abriram suas lojas virtuais.

Concentração

O saneamento do mercado de internet acabou por revelar também que a nova economia não é tão diferente do mundo que seus entusiastas chamavam de ?velha economia?: de maneira similar ao que ocorre em muitos setores tradicionais, no mundo online, um número pequeno de empresas domina o mercado.

No Brasil, os três maiores sites de varejo online de cada setor abocanham cerca de 70% do mercado, revela a pesquisa do Boston Consulting e da Visa.

Ou seja, com algumas exceções, mais nos EUA do que no Brasil, quem acabará ganhando muito dinheiro com as novas tecnologias são as grandes empresas e fundos já estabelecidos.

O relatório do Boston Consulting mostra que a concorrência tende a se acirrar. O motivo: mesmo as empresas tradicionais que já estão na rede ainda não ?aprenderam? qual a melhor maneira de usá-la em seus negócios. O razoável é que invistam cada vez mais para tirar proveito da internet."