Alberto Dines
O caso do cientista taiwanês Wen Ho Lee, massacrado pela mídia americana, tem alguns pontos capitais que a imprensa brasileira ainda não discutiu:
- The New York Times , responsável pelas primeiras denúncias, embora tenha feito um esforço de checagem, basicamente apoiou-se nas informações vazadas pelo FBI de que Ho Lee teria passado segredos militares à China continental.
- O FBI (polícia federal americana) é uma agência do Poder Executivo. Seu compromisso com a sociedade consiste em levantar provas que o Judiciário irá julgar. A imprensa (com outros compromissos e funções) não pode submeter-se aos desígnios específicos dos outros poderes. Sobretudo aqueles comprometidos com a investigação (caso das agências policiais e o Ministério Público).
- Antes de acusar, a imprensa deve reunir um mínimo de evidências e provas. A imprensa não é tribunal, mas deve obedecer a um mínimo de ritos para não confundir sua ação com a da justiça sumária que condena antes de julgar.
- O benefício da dúvida é um dos ritos iniciais e fundamentais nos procedimentos jornalísticos que envolvem a divulgação de suspeitas, denúncias e acusações.
- Quando um veículo esquece de examinar a hipótese de que o acusado pode ser ou estar inocente, submete-se à Lei de Lynch e entra na arena dos linchamentos.
- Dentro de uma redação, o responsável pela implantação e gestão do princípio da dúvida é o editor. O repórter – mesmo quando sinceramente empenhado em ouvir os dois lados – está apenas envolvido em levantar e apurar fatos. O editor está comprometido com o equilíbrio da cobertura.
- O New York Times, além de deixar-se influenciar pelo FBI, atrelou-se ao lobby dos políticos interessados em explorar o caso. O legislador também não está comprometido em buscar a justiça, mas apenas em atender seus eleitores. Logo, a "repercussão" política de uma determinada acusação não é fator definitivo de aferição de sua veracidade.
- Embora não tenha sido o único a vocalizar as denúncias, o jornalão novaiorquino considerou-se responsável pelo início da cruzada. E deu a mão à palmatória – da forma mais ostensiva possível. Seus dois editoriais são inequívocos e só o engrandecem.
- As entrevistas e satisfações prestadas pelos editores e altos executivos do jornal a outros veículos fazem parte da política de "dar a cara": prestar contas à sociedade e acatar o debate.
- O benefício da dúvida no exame de acusações e as explicações públicas sobre procedimentos controversos são marcas de veículos jornalísticos responsáveis.
- O resto é onipotência e arrogância.
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