Friday, 29 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Sobre liberdade e credibilidade

OI EM QUESTÃO

Gilmar Antonio Crestani (*)

Embora irregulares, minhas contribuições ao Observatório da Imprensa pautaram-se sempre no sentido de fazer jus ao slogan "Você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito". Agora também aprendi que também não vou mais ler o Observatório do mesmo jeito.

Duas edições anteriores, o editor Observatório da Imprensa, Alberto Dines, apodou minha colaboração para introduzir leve modificação no slogan, com a seguinte sentença:

"Nota do OI: Sem juízos de valor sobre o autor e sua denúncia, repetimos o que já foi dito em outras edições: o crítico perde sua credibilidade porque, apesar de servir-se com freqüência deste fórum e apesar de instado, recusa-se a comentar, condenar ou defender a intervenção censórea sofrida pelo Observatório da Imprensa na TVE-RS a partir de 1999. (A.D.)"

Jamais imaginei que fosse ler, da lavra do Dines, a minha condenação de forma tão cabal quanto sumária. "O crítico perde sua credibilidade porque, apesar de servir-se com freqüência deste fórum e apesar de instado, recusa-se a comentar…". Foi também oportuna a lembrança de outras admoestações. Estou aprendendo com mestre Dines que a credibilidade está diretamente ligada com a pauta. Tinha para mim, na minha completa ignorância da labuta jornalística, que a credibilidade está na informação e não na pessoa que a reproduz.

Gostaria de esclarecer que não há nenhum vínculo que me obrigue a encaminhar colaborações e tampouco ao Observatório de as publicar. Mais. Liga-me ao OI apenas a liberdade que me outorgo em opinar, sem o cabresto da pauta que costuma pegar o jornalista pela jugular. Não há nenhum vínculo de fogo que atrele este escrivinhador ao Observatório que não seja a liberdade de escrever o que pensa quando acha que pensa, e o Observatório de publicar, se assim o desejar.

Brasil heterogêneo

Assim, não só me julgava livre para dizer sobre o que entendia correto, como eximia-me de enveredar-me por sendas que não me diziam respeito. Até porque o assunto de que sou cobrado já foi debatido no Observatório pelas pessoas mais capacitadas a respeito disso, incluindo o Dines e os diretores da TVE, anteriores e atuais.

Dines afirma que minha desobediência em seguir a pauta que lhe convém tira minha credibilidade. Ora, o fato de o editor do Observatório não se posicionar a respeito do arrastão que a mídia faz em benefício dos governos federal e paulista lhe tira credibilidade? Isto teria algo a ver com o fato de constar na grade da emissora pública paulista e o sítio do Observatório contar com o patrocínio do Banco do Brasil? Li na edição passada o Dines condenando o linchamento a que foi submetido Rubens Ricupero. O mesmo Dines pinçou duas declarações do Lula, uma na França a respeito dos subsídios agrícolas, e outra a respeito do papel do Exército e do Brasil na questão atômica, e o linchou. A quem aproveita?

Por indiferença ou incapacidade, não via e não vejo nenhum prejuízo para o Observatório não constar na grade de programação da TVE-RS. É sabido que os canais a cabo ou satélite incluem a programação da TV Cultura de São Paulo. No interior, ou mesmo nas cidades, aqueles que usam exclusivamente antena parabólica também desfrutam do OI na TV. Ora, logicamente a TVE-RS tem produção e interesse local, e é sustentada pelos gaúchos. Aquela que antes era notícia quando era tirada do ar por proselitismo político em época de campanha agora não é mais pautada pelo monopólio. Aliás, até hoje não encontrei nenhum posicionamento do Dines a respeito da manipulação operada pelo coronelismo eletrônico sulista. E aqui também se "desconstróem" candidaturas… Aliás, o jornal Correio do Povo, de propriedade de uma família de políticos conservadores, sábado, 5/10, véspera de eleições, traz em matéria de capa uma manchete que é coisa rara ver no seu principal concorrente: "Balanço positivo na geração de empregos no RS."

O Brasil é heterogêneo não só na geografia mas também em termos socioculturais. Recentemente a revista Imprensa fez uma reportagem contundente sobre as relações da RBS com o governo do estado. O OI apenas reproduziu, sem maiores adendos. Diante da excelência e da pertinência do Observatório na TV, não vejo razões para que não seja transmitido pelas demais emissoras locais, que já têm know how em reproduzir coisas do eixo Rio-São Paulo.

Distância que cega

O fato é que a TVE-FM Cultura, da Fundação Piratini, passaram a incomodar o coronelismo eletrônico sulista. A rádio FM Cultura, talvez inspirada no Observatório da Imprensa, toda quinta-feira, das 21h às 22h, leva ao ar o programa Mídia em Debate. A cada programa muda o enfoque e os convidados.

De 1999 para cá, a TVE/RS recebeu nove prêmios. A rádio FM Cultura, dez! Alguns inclusive de âmbito internacional. Só neste ano, recebeu o Prêmio Embratel de Jornalismo ? TVE Repórter (menção honrosa/2002), e a FM Cultura recebeu o Prêmio Imprensa Embratel 2002 ? documentário Os Filhos do Exílio, feito para o programa Cultura Documenta, produzido e apresentado pela repórter Elen de Oliveira, e a Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI) 2002 concedeu o título de Jornalista Amiga da Criança à jornalista Paula Coutinho.

A verdade é que atuação da TVE gaúcha tem incomodado o coronelismo de plantão. Talvez se constasse de sua grade o Observatório incomodasse ainda mais. Não por acaso, todas as iniciativas de um meio de comunicação voltado aos interesses da comunidade gaúcha têm sido torpedeadas pela RBS. Vide o aparato judicial que a Agert arregimentou para coibir as rádios comunitárias. E a Anatel não só faz o jogo da Agert, mas sequer se digna a discutir com as associações e suas rádios comunitárias. Comportamento muito diferente do adotado em Minas Gerais, terra do ministro Pimenta da Veiga. Lá o fenômeno Sarney da distribuição de rádios foi copiado com eficiência, agora com apoio de filósofos a quilo.

O Observatório é lido e distribuído por todo o RS. Alguns sítios na internet reproduzem artigos de críticas da imprensa, desde que a imprensa criticada não seja gaúcha. Minhas colaborações recebem a rubrica "Mídia Gaúcha", e não são reproduzidos pelos tais, embora um editorial do jornal Zero Hora tenha mencionado um "servidor público já identificado", como se as colaborações disponibilizadas pelo Observatório fossem apócrifas, tachando-me de "obsessivo". Além disso ameaçaram com "medidas judiciais". Não pedi nem recebi nenhuma solidariedade do OI, pois nada do que havia escrito faltava com a verdade.

Talvez a distância geográfica impeça uma visão mais apurada do que acontece nestes pagos. Quando escrevo a respeito das relações do coronelismo eletrônico com o macarthismo gaudério não estou apenas fazendo um juízo de valor. Estou cumprindo um papel que a mídia esconde. Talvez na Alemanha nazista e na Itália fascista a elite empresarial não tenha combinado de uma maneira tão avassaladora quanto a que se desenrola neste estado.

Capacidade de indignação

Tudo aquilo que vinha denunciando neste período a respeito do mais avassalador consórcio do atraso, envolvendo os presidentes da Federasul, da Farsul (associada da RBS), da Fiergs, sob o patrocínio midiático do coronelismo eletrônico sulista, recebeu a sentença executória da "parcialidade" por não defender o Observatório no Sul… Agora esta fina flor do retrocesso faz roteiro no interior fazendo campanha antipetista, coisa jamais vista aqui e alhures. Constrangendo funcionários através de todo tipo de pressão. Se isso é correto e natural, por que condenam a CUT quando patrocina as causas da esquerda nas eleições?

O presidente da Federasul, sob aplauso da mídia local, tascou no prato de Lula, convidado para o evento chamado "Reunião-Almoço na Federasul": "Por que o presidente Lula deseja ficar com a chave do Banco Central? Para emitir dinheiro falso?" Agora, ao ver o candidato que haviam turbinado caindo, os coronéis passaram a régua, formaram um novo consórcio e adotaram a alternativa, que lhes sirva. Quando a candidatura destes grupos despencou de 36% para 18%, o momento Casseta & Planeta foi representado pelo principal colunista político do grupo RBS, no rádio, no jornal e na TV(22/9): "Nova alternativa de quem pretende tirar o PT do governo". E, pasmo, deu o tiro de misericórdia no ex-aliado ao apresentar em sua coluna no jornal Zero Hora (27/9) os sete pecados capitais do ex-funcionário da RBS.

Detalhe, os sete pecados apareceram nessa mídia somente na hora do nocaute, não quando tinham sido protagonizados pelo dito cujo.

Reitero que não há nem nunca houve qualquer vínculo que obrigue o Observatório a publicar minhas colaborações, assim como não tenho nenhum vínculo com o que quer que seja que me obrigue a fazer ou deixar de fazer. Nasci na roça, onde permaneci por 20 anos, fui seminarista, balconista e bancário. Consegui cursar duas faculdades. Beirando os 40, sou funcionário público federal há 13 anos. E o que tenho conseguido obtive sem me servir de ninguém. Posso garantir que contei e conto exclusivamente com minha disposição em aprender com as oportunidades que se me oferecem e também meus próprios erros. E mantenho viva a capacidade de me indignar, principalmente com manipulações.

Leia também

 

 O comentário acima não mereceria qualquer comentário se não contivesse, além do perigoso ressentimento, três tremendas e deslavadas mentiras sobre este Observador e este Observatório. Que exigem breve e veemente repúdio:

** Este Observatório não pauta assuntos nem colaboradores. Este é um fórum franqueado a todos para discutir o desempenho da mídia. Tem sido cobrada do observador gaúcho qualquer manifestação a respeito da violência que este Observatório sofreu ao ser excluído da programação da TVE-RS logo depois da posse do atual governador. Solidariedade não se cobra mas coerência, sim. Um crítico de mídia não pode deblaterar contra mazelas que lhe convém deblaterar e fechar os olhos às outras que não lhe convém.

Se o signatário não quer prestigiar o OI com a sua candente e inspirada pena libertária, por que não defende a decisão eminentemente política de seus companheiros de partido? Seria melhor e mais digno do que este constrangido e vexatório silêncio.

** Este Observador vive de sua profissão, ao contrário de outros, militantes de partidos ou facções. Contratado como opinionista pelo Jornal do Brasil (depois de demitido da Folha justamente porque emitiu conceitos que desagradaram à sábia direção), escreve no jornal carioca opiniões numa coluna semanal, obrigatoriamente claras, inequívocas e transparentes. Se não o fizesse estaria ludibriando o leitor, fingindo aquela abjeta “imparcialidade” que certamente também incomoda o media critic gaúcho. 

** Confundir o que este Observador escreve como opinionista e o que escreve como crítico de mídia não é apenas incorreto. É prova de grave disfunção no discernimento profissional e na capacidade de avaliação humana.

** O crítico gaúcho está desafiado a apontar qualquer texto assinado por este Observador, originalmente publicado neste OI e que possa ser considerado como uma tomada de posição política e partidária. O mesmo não se pode dizer da farta obra do signatário: TODOS os seus textos na qualidade de observador da mídia são intensamente militantes, engajados e partidarizados. Com isto ele abandona por vontade própria a categoria dos buscadores da verdade para ingressar na outra, dos que estão comprometidos com verdades pré-fabricadas e, por isso, toscas. (A.D.)


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(ver item VIII)

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