J.S.Faro
A conjuntura atual do ensino de Jornalismo é rica em contradições e, ao mesmo tempo, repleta de perspectivas animadoras. As contradições, segundo consigo perceber, são o resultado de três movimentos que se equilibram no peso que têm na configuração dos cursos; mas eu diria que se trata de forças que se alternam na dinâmica do quadro presente. A primeira dessas forças tem um sentido claramente imobilista, e recebe sua inspiração dos quase 25 anos do currículo mínimo que norteou a estrutura das escolas de Comunicação. Ainda agora, passados poucos meses do debate provocado pela elaboração das Diretrizes Curriculares, não é difícil encontrar propostas didático-pedagógicas que insistem na formação de profissionais burocratas da imprensa, vivendo uma profunda dissociação entre o que aprendem nas faculdades e aquilo que se exigirá deles. Na maioria das vezes, quando esse movimento se manifesta, o que se vê são propostas anacrônicas que vivem entre a formação geral do estudante e um certo praticismo inconseqüente que nem sequer aproveita toda a insatisfação que elas mesmas têm gerado onde são postas em prática, invariavelmente em escolas que mais se confundem com empresas, salas de aula abarrotadas, corpo docente inseguro e recursos físicos e laboratoriais precários.
A segunda dessas forças vem também dos cursos, mas sua natureza é diferente, porque seu espírito de renovação tem contagiado as iniciativas de reforma que tomaram conta de muitas escolas nos últimos dois anos. Em diversas instituições de ensino, a simples notícia de que a Lei de Diretrizes e Bases havia revogado a obrigatoriedade de cumprimento do currículo mínimo de 1984 foi suficiente para motivar o debate em torno de novas propostas, liberadas das antigas exigências e insistentemente preocupadas em promover uma espécie de aggiornamento de seus estudantes com a formação humanística, com a formação técnico-profissional e com a formação ética. Nessas faculdades – estejam ou não integradas a estruturas universitárias – o que se passa é uma saudável busca de caminhos que estejam em sintonia com os desafios da profissão – embora em muitos casos os desafios da profissão sejam confundidos com uma visão simplista das demandas do mercado. Mas, pelo menos agora, isso não importa muito, porque o impulso reformista descontrolado é muito recente para que se exija dele resultados finais conclusivos a respeito da qualidade de suas propostas.
A terceira força que tem atuado na conjuntura do ensino de Jornalismo vem de fora da escola, mas nem por isso deixa de ter sobre ela um peso expressivo. Refiro-me a uma complexa e intrincada estrutura de avaliação dos cursos que vem sendo posta em prática pelos organismos do MEC. Independentemente da posição que se possa ter a respeito dela, o fato concreto é que, mesmo nas instituições de ensino com posturas políticas hegemônicas marcadamente independentes frente às exigências do Exame Nacional de Cursos e da Avaliação das Condições de Oferta, a divulgação dos resultados obtidos acaba exercendo sobre a administração acadêmica um papel de constrangimento que a leva a repensar, ou a rever, a qualidade de seu trabalho, ainda que isso possa servir para a reafirmação de concepções em torno das quais e para as quais a massa crítica do corpo docente empresta seu apoio.
À espera de frutos
Mas não é só isso: em relação aos cursos, ainda vem dos estudantes representados na ENECOS uma grita geral por outras formas de mensuração de sua qualidade; e em relação à própria imprensa, não deve ter existido na história do ensino de Comunicação em geral e do Jornalismo em particular momento mais intenso de crítica pública à mídia, de aferição do trabalho da imprensa, de cobrança ética dos postulados sobre os quais seus profissionais desempenham suas funções. Pois bem: esse conjunto de crivos, se nas empresas de Educação tem seus efeitos escamoteados e eventualmente tem servido para que se ludibrie ainda mais os estudantes, nas instituições de ensino tem estimulado aquele ímpeto reformista referido acima.
A Comissão de Especialistas do MEC tem procurado refletir sobre esse quadro na medida em que chega às suas mãos essa diversidade de situações. E em torno delas está agora empenhada em reformular os padrões mínimos de qualidade exigidos tanto para a autorização de novos cursos quanto para o reconhecimento dos existentes. Se não tem outra função se não a de encaminhar seus pareceres ao Conselho Nacional de Educação – que é, na verdade, a instância que delibera sobre tudo isso –, resta-lhe a tarefa de extraordinária responsabilidade de oferecer à comunidade da área os parâmetros que podem legitimar as iniciativas sérias e reflexivas e isolar a postura conformada com o ensino de baixa qualidade.
A rigor, portanto, frente à conjuntura atual do ensino de Jornalismo, a CEE/COM não tem qualquer poder de instaurar uma nova realidade nem de normatizar de forma inibidora as iniciativas de mudança, mas pode contribuir para que dessa nossa época de mudanças se produzam cursos mais conseqüentes com as necessidades da sociedade brasileira.
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