Monday, 18 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Um bom susto e alguma consolidação

BALANÇO & PERSPECTIVAS

Victor Gentilli

Por essa ninguém esperava. Cada um estava acomodado no seu canto, deixando o barco correr, quando uma decisão de uma juíza, acionada pelo Ministério Público, derruba a obrigatoriedade do diploma para o ensino de Jornalismo. A surpresa e a desmobilização era tanta que as reações tardaram e vieram fracas, anódinas. A liminar da Fenaj contra a decisão foi derrotada na Justiça (um dos passos da longa batalha judicial) e os jornais praticamente ignoraram.

Pessoalmente, entendo que o caminho foi o pior possível, mas a decisão é boa. O sistema midiático, apesar das dificuldades e da crise, evita discutir a formação dos seus profissionais, em particular a dos jornalistas. Os grandes diários preferem os seus próprios cursinhos de adestramento ? literalmente, sem aspas ? e os pequenos acham melhor ter mais alternativas de recrutamento além do mercado reservado.

Se o tema do diploma estava adormecido, outras questões estavam acesas.

No final do ano 2000, quando os novos padrões de qualidade foram encaminhados ao MEC pela Comissão de Especialistas, então coordenada pelo professor J.S. Faro, havia uma perspectiva de entendimento na área, que se confirmou em fevereiro, quando os documentos passaram a valer e vieram a público na página do MEC na internet.

As reações foram as melhores possíveis. Todos aqueles que iam conhecendo os novos critérios e parâmetros de avaliação imediatamente viam que se tratava de um documento sério, capaz de fazer com que novos cursos fossem autorizados somente quando efetivamente cumpriam exigências mínimas de qualidade.

Os processos de reconhecimento de cursos passaram igualmente pelo mesmo processo, com novos padrões, bem mais rigorosos que o anterior. Já ouvi de gente séria o epíteto de "draconiano" para os novos padrões. Diante da permissividade e leniência dos antigos, até que faz algum sentido.

Alguns meses depois, com o fechamento do protocolo do MEC, tornou-se impossível avaliar o efetivo impacto destes novos instrumentos. Ficou a impressão de que diminuíram significativamente os pedidos de novos cursos, mas nada que pudesse se comprovar efetivamente. Uma pena, até porque quando o protocolo for reaberto, no início deste 2002, é praticamente certo que os padrões terão, na melhor das hipóteses, um peso relativo bem menor no processo de autorização de cursos novos. Lamentavelmente, os indícios que vêm de Brasília apontam para o fim das Comissões de Especialistas e um afrouxamento de normas e critérios para autorização de novos cursos. Escapam apenas aqueles cujos conselhos ? ou ordens profissionais ? já participavam institucionalmente dos processos de autorização.

Universidades e centros universitários ? que contam com autonomia para criar novos cursos ? fizeram a festa em 2001, ano em que as instituições menores ficaram, na prática, impedidas de crescer.

Tudo isso sob o mais absoluto silêncio da mídia.

Só no final do ano a mídia foi acordar e mostrar a realidade do ingresso no atual sistema privado de ensino superior. Numa matéria do Fantástico, um padeiro analfabeto conseguiu aprovação em nono lugar num vestibular para Direito na Universidade Estácio de Sá.

A verdadeira reação da Estácio não foram os artigos de Felipe Pena, ghostwriter de plantão dos dirigentes da instituição. O corte, total e absoluto, de toda a verba publicitária da Estácio para qualquer veículo das organizações Globo em 2002 mostra, com toda a crueza, a forma de agir deste tipo de empresário-educador. A informação, divulgada pelo sítio Comunique-se, não foi desmentida.

Resta ver como os veículos premiados com os recursos vão se comportar diante das eventuais irregularidades do bom anunciante. O Dia e o Jornal do Brasil são os diários que vão receber a bolada da Estácio e dividir o que estava destinado ao Globo. O pasquim que teve o mérito de publicar a entrevista com o fundador da Estácio de Sá também vai continuar recebendo os anúncios da empresa do ramo educacional.

Relembremos: o Jornal do Brasil já começara com problemas sua nova fase, não apenas recebendo os tijolaços da tal UniverCidade do senhor Levinsohn como dobrando-se às suas pressões. Enquanto um recebe anúncios e silencia, o que não se cala vê verbas publicitárias cortadas. Faz sentido.

Área acadêmica

A realização do IV Fórum Nacional de Professores de Jornalismo em abril de 2001 tornou mais efetivos e concretos os espaços de troca de experiências. Há uma enorme expectativa em relação ao V Fórum, que se realizará em Porto Alegre, nos dias 28 a 30 de maio.

Professores e pesquisadores de jornalismo vão encontrando espaços novos e dinamizados para a troca de experiências. Além do Fórum, que este ano, ao que parece, vai se reunir sem a carona do seminário do provão, o GT de Estudos de Jornalismo da Compôs, coordenado pela professora Sônia Serra, da UFBA, e o Núcleo de Jornalismo da Intercom, coordenado pela professora Marialva Barbosa, mostram senão um vigor um crescimento quantitativo na pesquisa na área.

Avaliação

Esses mesmos cursos que vão valer apenas pela sua qualidade e não pela reserva de mercado que produzem foram este ano avaliados pela quarta vez consecutiva. Contrariamente aos demais cursos, o chamado boicote dos estudantes (que não boicota coisa alguma, apenas pune a escola que lhe dá diploma) cresce entre no Jornalismo. Este ano, saltou de 14% para significativos 22%.

Com essa consciência, é hora de os estudantes buscarem formas mais efetivas de protesto.

Mas o provão se consolida e ? ao seu lado ? o MEC incorpora definitivamente a Avaliação das Condições de Ensino, com os mesmos instrumentos que valerão para reconhecimento de cursos. O esforço para a produção dos novos padrões de qualidade por parte da Comissão de Especialistas só não vai se perder se seus critérios forem incorporados nestes novos documentos.

No dia 5 de junho quase duas dezenas de coordenadores de cursos de Jornalismo de universidades federais tiveram audiência histórica com o ministro da Educação, Paulo Renato Souza, em seu gabinete em Brasília. O encontro foi proveitoso, embora o que o ministro prometesse para menos de 30 dias até hoje não tenha se concretizado. Como entre o encontro e esta virada de ano houve uma greve de mais de 100 dias, não custa nada lembrar dos compromissos assumidos naquela oportunidade. Passada a greve, vale refrescar a memória.