Carlos H. Knapp
Já comentei aqui que não podemos exigir muita lógica e coerência da publicidade, mas às vezes ela se supera. Veja só o comercial da Ford, que anuncia uma série limitada do Fiesta. O filme, muito bem produzido, mostra cenas de triatlon. Vemos alguém nadando e o locutor diz: nadar tantos metros em tanto tempo? "Não é para todo mundo." Vemos um atleta pedalando enquanto o locutor afirma: pedalar tantos quilômetros em tantas horas? "Não é para todo mundo." E vemos o atleta correndo: percorrer tal distância em X tempo? "Não é para todo mundo." Feitas essas premissas, entra a venda do peixe que "não é para todo o mundo", o Fiesta.
Se a sentença não é para todo mundo pudesse se aplicar igualmente, tanto aos atletas como aos compradores dos carros, a lógica estaria satisfeita. Mas não há relação, são privilégios de gênero diferente. Você não precisa ser um atleta para ter o carro. Basta chegar primeiro e poder pagar. Se a comparação se desse entre coisas relacionáveis no contexto – um carro e um diamante, o Fiesta e o prêmio no alto do pau de sebo – a mensagem estaria dada.
Desconfio que a intenção é comunicar que só existem mil carros e, portanto, quem quiser um precisa correr. Daí as imagens de corrida e o clima de competição. Entretanto, um anúncio não pode exigir ginástica mental do consumidor. A Ford não manda você ir depressa à concessionária, só sugere que é preciso muito preparo físico para dirigir o Fiesta… o que não é um bom argumento de venda.
Posso também estar inteiramente enganado: a estratégia de marketing reservou essa série de carros para o segmento dos atletas e afins. Daí a ambientação dirigida do comercial. Neste caso, desculpe-me agência da Ford, você está certa.
Observatório da Propaganda – próximo texto