SEMINÁRIO VEIGA DE ALMEIDA
Antonio Queiroga (*)
Em um certo sentido, o jornalismo é um registro taquigráfico da história social do nosso tempo. É a história feita à queima-roupa, na hora mesmo de sua ocorrência; não por outra razão, os arquivos jornalísticos são uma das principais fontes de consulta para historiadores. O objetivo ideal desse tipo de informação, tão presente nos nossos dias, é relatar fielmente os fatos sociais de relevo, bem como apresentar opiniões que ajudem os leitores a entender melhor esses mesmos acontecimentos. O resultado desse processo dinâmico é a possibilidade de integração efetiva do indivíduo na sociedade em que vive.
A informação jornalística tem na sua origem uma relação direta com os fatos, com a notícia, com a verdade. Ela é uma tentativa de apreender o mundo na sua complexidade. Em uma sociedade onde a informação tem importância extrema, um dos objetivos essenciais para o jornalismo é fazer o mundo inteligível para seus leitores.
Como diz o ombudsman da Folha de S.Paulo, Bernardo Ajzenberg: "diante da profusão inédita e cada vez mais intensa de dados e informações por diversos meios ? rádio, TV, internet, para mencionar apenas os mais abrangentes ?, diante da sofisticação imposta à imprensa pela concorrência, a qualidade de um jornal tende a ser determinada pela sua capacidade de trazer informações exclusivas, de selecionar aquilo que realmente importa, de apresentar notícias com precisão, clareza e didatismo, de analisar os acontecimentos de modo contextualizado e fornecer a seus leitores subsídios para formar opinião ou adotar opções práticas no dia-a-dia. Por suas características, o jornal é, dentre os meios de comunicação, aquele que mais pode e deve cumprir essas exigências. Disso depende, crescentemente, sua própria utilidade."
Na sociedade da informação que nos caracteriza atualmente, estar bem-informado é fundamental, não apenas para a nossa vida profissional e social, mas também para podermos tomar decisões pessoais cotidianas. Os meios de comunicação de massa, e em especial o jornal, são instrumentos que todos nós utilizamos nessa tarefa. Eles são os intermediários privilegiados na nossa relação com o mundo.
Ora, se a tarefa básica do jornalismo é se debruçar sobre a realidade do mundo e filtrá-la para o leitor, permitindo uma visão coerente e útil, essa atividade passa a ser cada vez mais importante e complicada na medida em que essa realidade se torna mais e mais complexa. É o que vivemos hoje em dia.
Desafio: um mundo inteligível
Durante o século 20, em especial em suas últimas décadas, com o avanço desenfreado da ciência e do conhecimento humano em geral, uma enormidade de assuntos e temas se tornou importante para podermos continuar sintonizados e participantes do nosso tempo. Ao contrário do que aconteceu com nossos pais e avós, a velocidade em que o mundo se modifica não permite que possamos entendê-lo com um conhecimento estático. Para aquela geração, a escola quase sempre bastou para alcançar emprego e razoável entendimento do mundo. Todo conhecimento atualmente é transitório. Como profetizou Marx no Manifesto do Partido Comunista, o homem vive hoje uma sucessão histórica vertiginosa, em que "tudo que é sólido se desmancha no ar".
Para tornar o panorama ainda mais complexo, existe hoje um excesso de produção e circulação de informação. Somos cotidianamente bombardeados por um número tão grande de informação, das mais diversas espécies (notícias, entretenimento, mensagens comerciais, filmes etc.), que é virtualmente impossível assimilar tudo. Pelo contrário, nessa situação de, como denominam os americanos, "information overload", não é incomum a situação de informação excessiva ser o mesmo que informação alguma. O excesso nos cega, é impossível ver quando se tem muita luz.
É nesse cenário que o jornalismo contemporâneo se vê desafiado. E aqui temos a destacar que a sua modalidade impressa é a que mais recursos tem para se defrontar com o problema, seja pela sua periodicidade diária, por ser menos efêmero que as versões eletrônicas, além de mais capaz da analisar e ter espaço para isso.
A questão está posta: um mundo cada vez mais complexo, onde o conhecimento humano avança se expandindo e especializando, onde a ciência se aproxima da vida de todos nós ? e não é possível nos alienar de tudo isso sob a pena de deixarmos de ser atores da nossa própria vida ?, necessita de uma forma de fazer jornalismo mais qualificada. Essa qualificação passa pela capacidade de selecionar, editar, explicar e analisar essa diversidade cambiante que é a vida. Como fazer de assuntos como globalização, realidade política, economia mundializada, biogenética e sua ética em formação, cultura pop e suas inúmeras ramificações algo que se possa compreender?
O desafio é: como tornar inteligível, para um público de massa, heterogêneo, dispersivo e participante de uma sociedade democrática, um mundo continuamente em mutação e cada vez mais complexo?
(*) Coordenador do Curso de Comunicação Social da Universidade Veiga de Almeida; mestre pela ECO/UFRJ