Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Usos e abusos da publicidade machista

PORNÔ CHIC

Leneide Duarte, de Paris

Na semana passada, Nicole Péry, secretária-adjunta de Estado para o direito das mulheres, veio engrossar o coro dos franceses que protestam contra o uso na publicidade de imagens que degradam a mulher. Nicole era a porta-voz de um número cada vez maior de pessoas que se dizem irritadas com o abuso do corpo feminino na propaganda francesa. Segundo recente pesquisa de opinião, 50% das mulheres ouvidas se sentem revoltadas ao verem o corpo feminino seminu ser pretexto para vender perfume, sapato, roupa de lã, meias e todos os produtos imagináveis. [Um anúncio em especial é chocante: vende uma barra de chocolate chamada Magnum, anunciada "para homem", e que aparece saindo da calcinha exígua de uma mulher. É chocante e grotesco: é como se fosse um pênis no corpo de uma linda moça, em big close da cintura ao início da coxa.] O relatório intitulado "A imagem das mulheres na publicidade", produzido pela Secretaria dos Direitos das Mulheres e divulgado na quarta-feira [11/7], propõe "um reforço da capacidade de expressão e ação da sociedade civil", em particular das associações de luta contra a violência e a discriminação das mulheres. "Não quero tomar uma atitude moralizadora, mas não gosto de ver as mulheres humilhadas", disse Nicole Péry.

A primeira conseqüência dessa ação oficial contra o abuso da publicidade vai ser a modificação das regras do "Código sobre a utilização da imagem da mulher na publicidade". As regras atualmente em vigor foram elaboradas em 1975 pelo Bureau de Vérification de la Publicité (BVP), que controla os anúncios publicitários. Vale a pena lembrar algumas delas:

  • "A publicidade deve respeitar a dignidade da mulher e não chocar a sensibilidade do publico";
  • "a imagem da mulher não deve ser vista como uma provocação"; "a exploração da nudez é desaconselhada";
  • "a mulher não deve ser reduzida à função de objeto publicitario";
  • "a publicidade não deve sugerir a idéia de uma inferioridade da mulher".

O que mais pode ser acrescentado para proteger a imagem da mulher? Se Nicole Péry quer realmente ver banido o corpo das mulheres como isca para a venda de produtos, as regras devem ser mais claras. Nada mais vago e impreciso que o texto das regras atuais. Os publicitários que criaram a propaganda do perfume Opium, de Yves Saint Laurent, por exemplo, não devem achar que estavam "reduzindo a mulher à função de objeto publicitário" ao fotografarem uma mulher nua, deitada, lânguida, oferecida, à espera de ser possuída. Tudo o que ela veste é um colar e uma pulseira de pedras preciosas e uma
sandália de salto agulha. Apesar de ser inatacável do ponto de vista estético, no erotismo que dele emana, graças à beleza da modelo e ao jogo de claro-escuro que destaca o corpo perfeito da moça, o anúncio é um exemplo perfeito e acabado do uso mercantilista do corpo feminino. Ele é tão eloqüente que não necessita de texto. Embaixo, à direita da foto, apenas o nome do perfume e a assinatura de Yves Saint Laurent. É um dos exemplos do que se convencionou chamar na França de "publicidade pornô-chic".

Ao BVP cabe o controle e avaliação da publicidade impressa em jornais e revistas, além dos spots de rádio e televisão. No ano passado, o bureau examinou 11.799 spots televisuais, 2.814 anúncios destinados à imprensa e 279 para outdoors. Desses, 71 anúncios foram "desaconselhados". A partir do novo texto sobre as regras de controle a serem propostas no proximo mês de setembro, o BVP deverá estar atento para não permitir que sejam veiculadas campanhas que chocam os franceses, como aquelas apontadas pela pesquisa realizada em junho.

Entre as perguntas do questionário da pesquisa havia a seguinte: "Que tipo de publicidade choca mais você?" As respostas, na ordem decrescente, foram: a) aquelas que mostram as mulheres em atitudes sexualmente provocantes; b) aquelas que caricaturizam as mulheres: no fogão, no volante, mulheres objeto; c) aquelas que mostram mulheres inteiramente nuas; d) aquelas que mostram mulheres que sofreram violência.

    
    
              
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