LUTERO SOARES / PERFIL
"Lutero, velho de guerra!", copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 9/11/01
"Daqui a dois anos, o jornalista Lutero Soares completa 50 anos que anda por gráficas e redações. E que serão coroados com sua assinatura em um livro de arte, contando a saga do Jornal do Brasil. Dos áureos tempos até as últimas lutas. ?Se há uma história que eu conheço é a do JB?, orgulha-se. Mais uma batalha jornalística vencida pelo gaúcho de Alegrete, morador de Moscou por seis anos (1960-66), onde estudou língua e literatura russa na Universidade Patrice Lumumba. ?E nunca fui comunista e nem me filiei a partido algum!?, faz a ressalva. É que o namoro com a terra de Dostoievski começou só porque tinha familiares no Partidão.
?A minha ida para a ex-URSS foi casual. O Kruchev queria abrir a universidade a estudantes de todo o mundo. Escrevi uma carta e acho que foi a primeira que chegou. Fui, em seguida, a Montevidéu e o embaixador uruguaio pagou minha passagem?, explica. Na capital da antiga URSS, aos 24 anos, vivia com apenas 90 dólares. ?Mas, dava porque tinha alojamento e comida?, frisa. Lá, casou com sua ex-mulher e mãe de seu casal de filhos, a mineira Maria Aparecida Botelho Pereira, que, coincidentemente, foi fazer o mesmo curso de Filologia. Recentemente, ela colaborou na realização do dicionário da língua portuguesa, de Antônio Houaiss. ?Eu me dou bem com as mineiras?, brinca, referindo-se à namorada de Juiz de Fora e colega de muitos anos, Rita de Cássia.
A saga do guerreiro
A saga de Lutero não faria feio em nenhum livro. O problema é que sua modéstia o impede. ?Sempre fui peão nas redações?, subestima-se. E quantas redações! Só no Rio, Globo e JB por inúmeras vezes. Não esquecendo que participou do projeto da ressurreição da Última Hora, junto com o conterrâneo José Silveira e com ?o genial?, como ele diz, João Rath, já falecido. ?Só não deu certo porque faltou dinheiro ao Ary Carvalho (dono de O Dia) e o projeto gráfico – de José Carlos Avellar – era um pouco exagerado. Mas, de tão bom foi aproveitado por toda a imprensa de hoje?, explica. E cita jornalistas que dali saíram prontos para dirigir redações como Eucimar de Oliveira (Extra) e Orivaldo Perin (Diário de S. Paulo).
A história de Lutero mostra que ele é um corajoso gauchão, tchê! Aos 13 anos brigou com a família – ele tem três irmãos – e foi embora para Porto Alegre. ?Mas eu os visito até hoje?, ressalta. Menino de cidade pequena, parou de estudar cedo e só voltou aos livros quando foi para uma escola agrícola. ?Ali tinha uma coleção de Dostoievski que li toda. Anos mais tarde fiz o mesmo em Moscou no original?, orgulha-se.
Aos 17 anos, começou sua vida jornalística quando foi parar numa gráfica, passando a revisor, auxiliar de redação, revisor e aí decolou. Mas decidiu seguir para a cidade de Rio Grande trabalhar no jornal comunista A Voz do Povo. Não sentou praça e logo mudou-se para Santana do Livramento, na fronteira com o Uruguai. ?Por isso, metade do A Platéia, era impresso em espanhol e um avião ia fazendo a distribuição naquela área?, explica.
Ao voltar à capital gaúcha, em 1959, foi para A Hora, dos Diários Associados. ?Naquela época, os jornais eram tablóides porque ficava mais fácil lê-los nos cafés e nos bondes?, conta. Mas o hábito pegou por lá e, hoje, até a Zero Hora é impressa nesse formato. ?Ainda passei também pela TV Piratini onde usávamos os filmes utilizados nas televisões do Rio, na véspera?, ri. Depois foi para Moscou onde tinha discussões com os russos sobre as dificuldades do regime. ?Eles não se importam em discutir. Só não aceitam é que falem mal da terra deles?, analisa.
Na ex-URSS, ele compensou o tempo perdido e tomou um banho de cultura. ?Lia muito?. Além disso, fez traduções do russo para o português para a agência Novosti. ?Mandavam material traduzido por mim para o treinador de remo do Flamengo, Buck, e também para o Assis Chateaubriand. E me pagavam?, conta. Depois de se formar na primeira turma da Patrice Lumumba, voltou ao Brasil com o filho Cássio – hoje doutor em Modelagem Matemática – com apenas quatro meses. ?E o fim da União Soviética surpreendeu-me da mesma forma que à KGB e à CIA?, diz, com bom humor.
Aportando no Rio
Na volta, tentou Porto Alegre de novo na tevê como redator, mas decidiu que era hora de aportar no Rio. Em 1967, visitou José Silveira, subsecretário de redação do JB, na sede da Avenida Rio Branco, lá encontrando Alberto Dines que conhecera em Moscou. Foi um pulo para fazer um teste, chefiado por Lago Burnett. ?Todo mundo queria trabalhar no JB naquela época . Era o mais disputado do Rio?, afiança. Entrou no copy-desk, foi subeditor de Esportes e acumulou com a revista Pais e Filhos, da Bloch. ?Eu dei o título a essa revista que tirei de um romance russo escrito por Turguini. Escreva como quiser o nome dele porque em russo é outro alfabeto?, libera.
Mais uma vez não sentou praça. Carlos Lemos decidiu levá-lo para a editoria de pesquisa, que seria ainda criada. ?Tínhamos que abastecer o jornal com textos para suprir os buracos que aconteciam sempre devido à censura?, explica. O grupo da pesquisa era da pesada: Mário Pontes, Juarez Barroso, Marsal Versiani, Luiz Paulo Horta, Raul Ryff (que saiu preso pelo Dops da redação), Marcos de Castro, Alfredo Lobo, Argemiro Ferreira e Renato Machado. ?Mas eu só pegava no pesado. Tinha dificuldade com as palavras. Fazer texto é bom para o Élio Gaspari e o Fritz Utzeri que brincam com elas?, comenta, modestamente. E não esquece de falar nos famosos livrinhos editados pela Pesquisa JB sobre os tristes momentos de censura sofridos pelo jornal nos anos da ditadura.
Em 1974, Lutero chegou à chefia de reportagem já na sede da Avenida Brasil, ficando por cinco anos. Deixou esta chefia e, pela primeira vez, foi demitido pelo próximo editor depois de Walter Fontoura, Paulo Henrique Amorim. Alegou que precisava de seu salário. Partiu, então, para fazer revistas na Associação dos Engenheiros Sanitaristas. Mas Henrique Caban, que era do Globo, ofereceu-lhe um emprego com salário inferior ao do JB. ?Ele me disse que era melhor eu topar. Caso contrário, quando eu descobrisse que após três dias ninguém mais me ligava, eu me sentiria um m….!?. Pagou pra ver. Até que o amiguinho Aluízio Flores convenceu-o e ele se tornou o editor de Política. ?Apostei, inclusive, na vitória do Brizola quando ele só tinha 2% nas pesquisas?, relembra. Saiu do Globo, voltou como redator por mais um ano e foi-se para o projeto da Última Hora que, infelizmente, afundou. Voltou ao O Globo onde aposentou-se.
Cansado, decidiu comprar um Land Rover e fazer matérias de turismo para O Globo. ?Fui até Ushuaia?. Cansou de novo, ficou uns tempos em casa e voltou o velho JB como secretário. Até junho, Lutero era encontrado no prédio da Avenida Brasil o dia inteiro. Ao sair, voltou às caminhadas na Lagoa e a ouvir seus mil CDs de óperas. Mas agora acabou a boa vida. Voltou ao JB para fazer o livro de arte com a história do jornal, encomendado pelas Docas S.A. ?É aquele livro para ler no coffee-break?, diverte-se. Nada disso. Lutero e Argeu Afonso – que ficou com a parte administrativa – tocam o projeto num cantinho da Agência JB. ?Não temos prazo; acabaremos qualquer dia desses?, informa o niilista Lutero. ?Niilista é um dos personagens de Turguini do livro Pais e Filhos?, replica o jornalista, que completou 65 anos no dia 24/9. Diz ele, timidamente, que sem festa no simpático apartamento térreo de Ipanema, onde o velho Land Rover de guerra fica paradinho na porta. Aviso aos amigos: ele merecia um festão!"
DICIONÁRIOS
"Qual é o melhor?", copyright Epoca, 12/11/01
"Época ouviu especialistas para eleger o mais completo dicionário brasileiro – deu o Houaiss. Mas os três gigantes do mercado têm problemas
Até pouquíssimo tempo atrás, o Aurélio reinava intocável no campo dos dicionários de língua portuguesa – não só no Brasil, mas em todos os países que compartilham do idioma de Camões. Nem o aparecimento do Michaelis, em 1998, obra respeitada entre estudiosos, ameaçou seu trono. Em agosto, porém, surgiu o Houaiss. E o recém-chegado fez barulho. Os números impressionam: 228.500 verbetes, 68.500 a mais que o Aurélio. Apesar do luxo das três edições e do preço salgado, no entanto, a língua portuguesa ainda não possui um dicionário do padrão das grandes obras internacionais, cujo modelo de perfeição é o Oxford English Dictionary.
Iniciado em meados do século XIX, muito antes dos brasileiros, esse modelar dicionário britânico de 450 mil verbetes se apóia em uma rígida metodologia lexicográfica – a ciência dos dicionários. Para explicar termos contemporâneos em suas páginas e incluir palavras, ele recorre a um banco de textos que reúne a estratosférica cifra de 500 milhões de vocábulos. O Bank of English, como é conhecido, é alimentado por registros representativos da língua contemporânea, adicionados ao caldo geral em doses estudadas. Um tanto de fontes literárias, outro de jornais e revistas e assim por diante. O método permite à obra dicionarizar palavras que realmente aparecem com freqüência na vida dos falantes do inglês. O lastro dos textos de referência preserva ainda o significado exato dos termos no contexto em que eles foram usados.
Nenhum dos três grandes dicionários brasileiros usa um banco dessa magnitude. Eles se utilizam de nominatas – relações de verbetes recolhidos pelos lexicógrafos a partir de publicações variadas. ?Falta critério científico para produzir uma obra dessas dimensões?, explica a lexicógrafa Maria Tereza Biderman. ?A conseqüência é que a inclusão de vocábulos é aleatória.? Maria Tereza é uma das criadoras do Corpus do Português Brasileiro Contemporâneo da Universidade Estadual Paulista (Unesp), o maior banco textual do português brasileiro, com 100 milhões de palavras. Desse arquivo sairá no ano que vem o Dicionário de Usos do Português Contemporâneo. As equipes do Aurélio e do Michaelis admitem que não possuem um banco semelhante. Já o Houaiss alega que tem o arquivo, mas não dá seu tamanho.
ÉPOCA ouviu oito especialistas no assunto – filólogos e lexicógrafos -, além de escritores, tradutores e editores, profissionais que têm a palavra em alta estima. Eles fizeram um raio X do Aurélio (Editora Nova Fronteira), do Houaiss (Objetiva) e do Michaelis (Melhoramentos). A maioria apontou avanços que, somados, elegem o Houaiss como o mais completo dicionário do Brasil. ?Ele supriu lacunas deixadas pelos demais?, resume Francisco da Silva Borba, lexicógrafo da Unesp.
As qualidades do Houaiss vão desde uma introdução mais aprofundada à obra – chamada convenientemente de ?chave do dicionário? – até o requinte de acabamento do livro. E passam por questões mais sensíveis aos leitores que recorrem a ele para matar dúvidas. Em primeiro lugar, o Houaiss reformulou a organização interna dos verbetes, facilitando a vida do leitor. Expandiu informações que os concorrentes já forneciam, adicionou outras que eles não traziam e deu mais destaque a seções do verbete, como o campo de antônimos e o de etimologia, que narra as transformações da palavra no tempo. ?É uma organização superior?, avalia Evanildo Bechara, lexicógrafo e membro da Academia Brasileira de Letras (ABL). Pelos verbetes estão distribuídas 380 mil acepções, que são os diferentes significados atribuídos às palavras – um acréscimo de mais de 100 mil significações em relação ao que o soberano do mercado oferece. O novo pretendente à coroa contempla um universo mais amplo da língua.
O Houaiss mergulhou fundo no enciclopedismo. Abusa de informações que complementam as definições das palavras. A mania é flagrante em verbetes tão simples quanto ?banana?, que chega a descrever a fruta madura. Não há como confundir com a banana verde. A inovação fica por conta da introdução de um recurso inédito nos concorrentes, a datação histórica. Esse índice aponta, sempre que possível, a data do mais antigo registro da palavra – o impressionante recuo vai até o século IX. ?Ele conta a história da palavra?, afirma Ieda Maria Alves, lexicógrafa da Universidade de São Paulo (USP). Parece luxo. Mas, além de saborosa, a datação é extremamente útil para tradutores. Um exemplo: a versão em português do best-seller O Nome da Rosa, de Umberto Eco, passado no século XIV, não poderia grafar o termo ?burlesco?, porque ele só apareceu 300 anos depois. Outra melhoria do verbete é o destaque dado aos sinônimos e antônimos. Por tradição, os dicionários de língua costumam sugerir sinônimos e, em menor freqüência, antônimos. O Houaiss agregou à montanha de informações um completo dicionário do gênero. ?É uma forma de enriquecer o vocabulário?, diz a escritora Lya Luft.
Dicionários capitaneados por um único e grande lexicógrafo, caso do Aurélio e do Houaiss, refletem a personalidade de seu autor. Antônio Houaiss (1915-1999), que morreu sem ver sua obra publicada, era um respeitadíssimo filólogo que tinha obsessão pela minúcia e fome de informação. ?Ele ia fundo no detalhe?, lembra Antonio Olinto, companheiro do filólogo na ABL e colaborador dos rivais Aurélio e Houaiss. ?Ele fez enciclopédias e carreou a experiência para o dicionário?, diz Evanildo Bechara.
Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1910-1989) era outro apaixonado pela palavra. Filólogo e lexicógrafo, realizou um salto ao lançar seu dicionário, em 1975, pela abrangência e qualidade da obra. Só no Brasil, as vendas já passaram dos 45 milhões de cópias nas várias versões. ?Aurélio virou sinônimo de dicionário no Brasil e em Portugal?, conta Ieda Maria Alves, da USP. A obra também tem o DNA do autor. Do gosto pela literatura, nasceu uma das marcas: as abonações literárias, exemplos de usos das palavras retirados da literatura. Machado de Assis é um dos 1.400 ?professores? da língua. As citações são um trunfo que deleita usuários. O Michaelis o seguiu. O Houaiss dá exemplos, mas deixou a literatura de lado.
A função primordial dos dicionários de língua é dizer qual o significado nato de uma palavra e revelar outros sentidos que ela assume em situações especiais. Nesse ponto, os analistas são unânimes: só a consulta contínua e demorada dirá quem é mais preciso, o rei ou o candidato ao trono. ?São projetos diferentes: o Aurélio é conciso, o Houaiss detalhista. Ambos são bem realizados em seus objetivos?, diz Antonio Olinto.
Há uma armadilha comum: explicar o significado das palavras a partir de sinônimos. Nesse ponto, a indicação é de que o Houaiss se sai melhor. O Aurélio diz que ?lacranar? é igual a ?lacerar?, ?dilacerar?, obrigando o leitor a nova busca. Só então descobrirá que ?lacranar? quer dizer ?rasgar em pedaços?. No Houaiss, uma única busca confirma que ?lacranar? é ?produzir esfoladuras, especialmente em animais?. Na visão do lexicógrafo Geraldo Mattos, ?em geral, o Houaiss recorre menos aos sinônimos?.
O mais conhecido deslize do Houaiss envolve o termo ?bauru?. A receita original do sanduíche não leva ovo, como diz o novo verbete. ?No Rio de Janeiro, o bauru tem ovo?, defende Mauro Villar, do Houaiss. O problema é que o lanche é uma invenção paulista. O Michaelis escapou de um tropeço quando sua primeira edição estava no forno. Às vésperas da publicação, notou-se a falta do verbete ?rúcula?. A palavra foi incluída e tornou-se sinônimo de ?escorregão? entre os dicionaristas. Para lembrar o susto, foi servida uma farta salada da hortaliça na festa de lançamento do livro."
MTV
"Geração Jackass", copyright No. (www.no.com.br), 9/11/01
"Nunca conheci quem tivesse levado tanta porrada como Johnny Knoxville. Não é a porrada existencial do Pessoa. Porrada mesmo. Johnny forma fila de trogloditas marombeiros e pede que, com o joelho, o golpeiem nos genitais protegidos apenas por um suporte atlético. Outra: colocado num carrinho de supermercado, Johnny é despencado ladeira abaixo contra um poste. Está no ar, desde sábado passado às 22h30, na Multishow, o Jackass estrelado pelo mega-idiota Johnny.
Trata-se de uma produção da MTV americana, mas a coisa é tão nojenta e perigosa que a similar nacional, em fase de menina veneno, não topou exibir. É a nova obsessão da TV. Testar os limites do ser humano. A Globo no domingo colocou um casal disputando quem comia mais, e em menor tempo, um bolo de espaguete com minhoca. O SBT empacotou quase famosos numa casa durante 45 dias. Agora o Multishow pesa ainda mais a mão. No programa de estréia, Johnny é alvejado com balas de pimenta e pequenos anzóis, informando didadicamente em seguida, em meio a gritos de dor, qual dos dois tiros machuca mais. Depois – infelizmente a internet ainda não disponibiliza saquinhos de vômito para download – enche um banheiro químico de cocô, tranca-se dentro e espera que a cabine seja içada, virada de cabeça para baixo e sacolejada. A transmissão só pára quando até a câmera, coberta de excremento, não consegue enxergar mais nada.
Já houve o horror, o horror, o horror do Conrad em No Coração das Trevas. Era o romance de uma guerra. Agora é o nojo, o nojo, o nojo no coração das trevas televisivas. É a programação de tempos entediados. O erotismo já revirou os corpos em todas as posições, embora eu nunca tivesse visto uma moça se aplicar desodorante íntimo diante das câmeras como aconteceu quarta-feira no Casa dos Artistas. Revirado os corpos, reviram-se agora o que lhes vai por dentro: as entranhas. Cérebro que é bom, nada.
Jackass é o No Limite dos adolescentes. Os pais não acordam mais com as guitarradas do metal. Beavis e Butt-Head ficaram previsíveis demais em sua melequeira presa debaixo do sofá. Num dos próximos programas do Multishow, várias pessoas vão tentar comer 50 ovos crus, mas tudo que conseguem a partir do décimo é vomitar uma gosma amarelada. Para obter todo o efeito deste quadro, sugere-se ao querido telespectador que deixe bem nivelada a sincronia das cores do seu aparelho.
Nos Estados Unidos, o programa está entre os dez mais vistos da TV paga, mas tem trazido muitos problemas para a MTV. Jackass, em inglês, quer dizer burro, idiota, porque só um deles se deixaria atropelar por um carro usando roupas de plástico como proteção. Jackass também é espírito de porco, porque só um deles andaria de bicicleta com uma boneca se passando por bebê para, no meio de uma praça, se jogar contra uma árvore – fazendo com que todos em volta corram penalizados para socorrer a ?criancinha?. Noventa por cento da audiência é de adolescentes, gente ainda não muito certa de que exista morte ou limites de dor para os desvarios físicos. Pois foi aí, quando os garotos em casa tentaram repetir as idiotices de Jackass, que começaram os problemas da MTV.
Num dos primeiros programas da série, Johny Knoxville, vestindo uma roupa que retarda o efeito das queimaduras, é revestido por bifes e deita-se em uma churrasqueira acesa. Em Connecticut, um menino de 13 anos tentou o mesmo no jardim, sem a tal roupa de proteção, e ainda adicionando gasolina à peripécia. Burro. Jackass total. Conseguiu cinco semanas num hospital para tratar queimaduras de segundo grau. Outro menino de 12 anos colocou repelente de insetos na mão e ateou fogo. Quando tentou apagar as chamas com a manga da camisa, botou fogo na parte superior do corpo. Como desgraça pouca é bobagem, mergulhou na piscina.
No início do programa anuncia-se que as cenas são feitas por profissionais ?ou idiotas?, e que são perigosas, não devendo ser repetidas em casa pelos adolescentes ou seus coleguinhas ?burros?. Educadores americanos acham que o efeito de um anúncio desses é o mesmo do ?Fumar faz mal à saúde? depois da propaganda do cigarro cheia de gatas boazudas.
Assim caminha a humanidade e, se Chacrinha estava mesmo certo, logo uma emissora brasileira vai copiar a sandice para as gincanas adolescentes da Babi, do Serginho Groissman ou da Fernanda Lima. Qual equipe, dos meninos ou das meninas, agüenta mais tiros de chumbinho no traseiro? Nos próximos capítulos de Jackass, um rapaz mergulha em uma piscina de esterco de elefante; menino engole peixe dourado, coloca o dedo na garganta e vomita o bicho ainda vivo; rapazes pulam de bicicleta de uma rampa e, disputando quem se machuca mais, caem em um arbusto cheio de espinhos.
O Brasil está num ótimo momento para uma produção assim. Com a greve de um semestre inteiro nas universidades federais há uma multidão de jovens dando sopa, topando qualquer veneno anti-monotonia. Sem aulas, bestando em casa com uma televisão dessas ligada, não vai dar outra. Vem aí uma geração totalmente jackass."