Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Vera Saavedra Durão

MÍDIA DE PIRES NA MÃO

“Setor de mídia quer apoio do BNDES”, copyright Valor Econômico, 29/10/03

“Os donos de jornais, TVs e revistas e representantes das associações da mídia brasileira em geral estiveram ontem, no BNDES, onde expuseram ao presidente do banco, Carlos Lessa e seu vice, Darc Costa, a situação atual do setor de Norte a Sul do país, sem discriminações de grupos.

Cerca de 12 representantes de empresas de mídia estiveram presentes a reunião. Entre eles, João Roberto Marinho, vice-presidente das Organizações Globo; Antonio Manoel Teixeira Mendes, superintendente da Folha de São Paulo e Alberto Saad, dono da TV Bandeirantes.

O presidente do BNDES disse aos representantes da mídia nacional que o banco vai estudar a questão desse setor sobre o ponto de vista da revitalização da indústria brasileira em geral visando a retomada da atividade econômica. O pleito dos donos de jornais, TVs e revistas seria examinado em conjunto a pleitos apresentados pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e outras instituições do setor produtivo do país. Lessa prometeu estudar com simpatia as reivindicações do setor.

A ex-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), Maria Sílvia Bastos Marques, contratada das três entidades ANJ, ABERT e ANER para levar as propostas do setor ao BNDES, esteve presente ao encontro. A tendência do BNDES é emprestar para a mídia por meio de operações indiretas, ou seja, via agente financeiro, apurou o Valor.

O trabalho da consultora ressalta a importância estratégica do setor de comunicação como gerador de emprego e de impostos e apresenta dados sobre os segmentos de Rádio, Televisão, Jornais e Revistas, a situação e o contexto atuais, a conjuntura macroeconômica e seus efeitos sobre a evolução das receitas, dos custos e resultados, e sobre o endividamento.

As empresas de comunicação geram mais de 280 mil empregos diretos e indiretos, segundo a nota. As entidades reiteram a autonomia de opinião e a independência da imprensa.”

 

“Nonagenários”, copyright Zero Hora in Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 31/10/03

“Ao denunciar que o governo está ?pondo a mídia de joelhos?, o big boss da Folha de S. Paulo, Otávio Frias de Oliveira, disse o que todo mundo já sabia mas ninguém queria reconhecer em público. Estrangular as empresas para depois ir em seu socorro com verbas oficiais é um jogo totalitário demasiado sórdido para não dar na vista.

É admirável que um empresário de 91 anos tenha a coragem de falar, quando seus colegas mais jovens e vigorosos preferem fazer-se de desentendidos, seja por timidez, seja por julgar que é um grande negócio barganhar a liberdade pelas migalhas caídas da mesa do BNDES, a mesma na qual Hugo Chávez e Fidel Castro se empanturram sem ter de dar nada em troca.

Mas não se pode esperar que um só homem, mesmo com experiência nonagenária, diga tudo. Frias só falou da pressão econômica de cima. Mas e o controle político das redações? E a censura interna que, há décadas, mantém a opinião pública na ignorância de fatos essenciais para que não enxergue a escalada neocomunista no continente? E a desinformação organizada, que, por meio de uma retórica diversionista antiamericana, busca ocultar do povo o auto-sacrifício da soberania nacional à volúpia de poder do novo governo mundial que vai se formando na ONU? E a ditadura cultural que expeliu das livrarias e das universidades toda a bibliografia inconveniente aos propósitos do esquerdismo, aprisionando duas gerações de brasileiros numa nova caverna de Platão em que os escravos já não podem sequer saber que são escravos? E a lenta e irrevogável imposição dos cacoetes verbais ?politicamente corretos? no vocabulário da mídia e das escolas, que obriga o pensamento coletivo a ceder à mentalidade esquerdista mesmo quando tem veleidades de fazer-lhe oposição? E a sorrateira política de ?ocupação de espaços?, que fez da esquerda um fiscal onipresente que não pode ser fiscalizado por ninguém?

Sem essa longa preparação do ambiente, jamais um governo petista teria a ousadia de tentar controlar a mídia por meio da chantagem econômica. Sem ela, não haveria talvez nem sequer o governo petista. Sem ela, nenhum brasileiro teria aceitado como coisa normal o engodo de uma eleição pré-calculada para obrigar o eleitorado a escolher entre a esquerda e a esquerda mesma. Para a mídia ser posta de joelhos, foi preciso primeiro colocar de joelhos o país inteiro.

Frias não falou de nada disso, nem tinha a obrigação de falar. O que me pergunto é: quando aparecerá um reitor de 91 anos para denunciar que é prisioneiro da inquisição petista na universidade? Quando aparecerá um escritor de 91 anos para denunciar a ditadura esquerdista no establishment cultural? Quando aparecerá um repórter de 91 anos para revelar as conexões PT-Farc? Quando aparecerá um policial de 91 anos para denunciar o governo que entrega a polícia inerme nas mãos dos delinqüentes? Quando aparecerá um militar de 91 anos para denunciar a manipulação esquerdista que ao mesmo tempo debilita por todos os meios as Forças Armadas e fomenta nelas a loucura antiamericanista para induzi-las ao suicídio?

Antigamente, a tarefa de mostrar a nudez do rei incumbia às crianças. Mas estas já estão corrompidas demais pelos ?parâmetros curriculares? politicamente corretos para poder enxergar a diferença entre corpos nus e vestidos, ao passo que os adultos, quando a enxergam, preferem calar-se porque têm pequenos interesses e grandes ilusões a preservar. Só homens de 91 anos lembram-se ainda dessa diferença e não têm a esperança louca de sobreviver indefinidamente por meio do silêncio covarde. Por isso o futuro, hoje, depende desses homens sem futuro.”

 

“Mídia, uma indústria peculiar”, copyright Aol Notícias (www.aol.com.br), 30/10/03

“Representada por suas associações de classe – a ABERT, de rádios e emissoras de TV, a ANJ, dos jornais e a ANER, das revistas – a mídia brasileira deu mais um passo esta semana para ter acesso a financiamentos do BNDES. Em nota divulgada na terça-feira, informa que entregou estudo aos técnicos do banco que mostra a importância econômica do setor. Deve sugerir também caminhos pelos quais as empresas de comunicação possam desfrutar, num futuro próximo, de linhas de crédito disponíveis para investimentos ou equacionamento financeiro. Disso, além do que pouca informa a nota, não se sabe.

O assunto é uma tremenda novidade, como registrou o repórter Guilherme Barros no jornal Folha de S. Paulo. Até 1997, o BNDES estava proibido de colocar recursos na mídia. A proibição foi suspensa, mas o governo Fernando Henrique não regulamentou os investimentos do banco no setor. Na prática, deixou tudo como estava. Lula, diante do quadro de penúria geral das empresas de comunicação, resolveu fazer a coisa andar e deu ordem para que os parâmetros de investimento fossem definidos.

A novidade também atinge muita gente e envolve muito dinheiro. Segundo diz a nota que acompanhou o estudo entregue ao BNDES, a indústria emprega 280 mil pessoas. Ela tem milhões de consumidores. No ano passado, a propaganda, sua principal fonte de receita, gerou investimentos da ordem de R$ 10,7 bilhões.

A antiga restrição sobre o acesso da mídia ao dinheiro do BNDES pode parecer uma discriminação. Afinal, do ponto de vista estritamente econômico, não deveria haver grande diferença entre um projeto de expansão do parque industrial de uma empresa petroquímica e um investimento para ampliar o parque gráfico de um jornal. Ambos em princípio geram empregos e podem muito bem se encaixar em políticas desenvolvimentistas financiadas pelo banco.

O problema é que a mídia é uma indústria muito peculiar. Seu prestígio lhe dá muitas vezes poder político vastamente superior à sua capacidade financeira. A tentação de governos em influenciá-lo é imensa. Historicamente, poucos foram os que não caíram nela. O BNDES, do seu lado, também não é um banco qualquer. É um banco de desenvolvimento, gerido pelo Estado. Obedece, portanto, menos à racionalidade econômica do que a políticas de governo – que aliás nem sempre perseguem causas ou investimentos nobres.

Tanto a mídia quanto a presidência da República e o BNDES sabem que sempre que a comunicação e o dinheiro público se tocam, há potencial para confusão. Por isso mesmo, têm discutido a regulamentação dessa relação com razoável cautela e se esforçado para calçar futuros investimentos na objetividade de seu desempenho e importância econômicos. Infelizmente, ainda não está muito claro é como isto será feito.

O governo pouco fala. A mídia até fala – informou sobre a reunião do BNDES – mas pouco revela – não dedicou atenção ao que nela foi discutido. Quanto ao estudo entregue ao exame do banco, nada se soube. Não foi dada nenhuma razão para a escolha de seus autores e nem tampouco se revelou por onde ele insinua, se é que faz isso, que a discussão caminhe.

A nota distribuída pelas associações de classe dá o justo tom de importância ao encontro de terça-feira na sede do banco, no Rio de Janeiro. Seus sítios na Internet, no entanto, nem se interessaram pelo fato. O da Abert, por exemplo, destaca num pop up editorial contra rádios piratas. Na capa, há uma profusão de links para temas de interesse do setor – mudanças de horário na Voz do Brasil, regionalização de programas, alteração de normas técnicas. Não há nada sobre a reunião ou sobre o estudo que nela se debateu.

Nas páginas da ANER na Internet, a situação não é diferente. Quem as visita no máximo recebe uma boa lição sobre venda de revistas em bancas e eficiência na venda de assinaturas. O endereço da Associação Nacional de Jornais ensina que seu comitê de liberdade de expressão tem feito louvável trabalho contra a censura e a violência contra jornalistas. Nada indica que ele se debruçou sobre as eventuais implicações que o uso do dinheiro público pode trazer para a autonomia da imprensa. Tampouco o acesso aos cofres do BNDES parece ter ocupado seu comitê de relações governamentais.

É ruim que as associações de empresas de comunicação não façam um esforço maior para deixar o público informado sobre o tema. É uma timidez que não se justifica diante do tamanho do assunto e nem da competência do meio em informar. Dá até a impressão de que tem gente doida para se ajoelhar.”