LEITURA DE VEJA
Clóvis Luz da Silva (*)
Nos mais variados comentários sobre os episódios de 11 de setembro em Nova York, a imprensa escrita brasileira, a revista Veja como exemplo, tem deixado mensagem implícita quanto ao caráter do confronto entre extremistas islâmicos e americanos: a de que essa luta na verdade é um simbolismo, uma redução sociológica de um conflito maior, mantido em espera de forma estratégica, urdido nas mentes dos protagonistas no decurso de séculos de contida mágoa pelo desrespeito que cada lado reservava ao outro, vindo a explodir no século 21 pelo caráter insidioso, avassalador e, por isso mesmo, irremediável de sua natureza ? trata-se da oposição entre o Ocidente e o Oriente.
Um, coroado pelo sucesso dos empreendimentos capitalistas, pelo avanço do saber cultural e científico, põe-se nesse suposto conflito, por obra dos que o idealizaram, como a expressão suprema de tudo o que significa evolução, desenvolvimento, progresso, iluminação etc. O outro, pelos motivos opostos, foi colocado pelos roteiristas como a personificação do atraso, da pobreza ? cultural e material ?, do obscurantismo e, pior, do fanatismo irracional, dando mesmo a entender que os fanatismos materialistas do Ocidente, e mesmo os de caráter religioso, são menos nocivos exatamente por terem surgido no contexto da Civilização Ocidental.
A imprensa dos países de "vanguarda", e a dos que sonham em sê-lo (a revista Veja, aqui no Brasil, é um perfeito exemplo), porta-voz fiel dos etnocêntricos ocidentais, escancara manchetes e matérias a sustentar essa visão de mundo maniqueísta, sendo específica quando afirma que o Talibã mantém o Afeganistão e o seu povo presos à Idade Média, sendo esse mesmo o motivo que levou esse grupo radical islâmico a apoiar bin Laden (essa é a versão unânime entre os vanguardistas) nos atos terroristas.
Naquele contexto histórico da Idade Média, a riqueza se consubstanciava na posse da maior quantidade de terras possível. Era senhor, tinha poder e prestígio quem possuísse terra, muita terra. A riqueza naquele momento não se media pelos milhões, pela posse de poços de petróleo, pelos juros obscenos cobrados criminosamente de países miseráveis, coisas que só num futuro bem distante, com o "triunfo" do capitalismo, dariam uma nova forma à disputa pelo poder geopolítico.
No que é primordial para a auto-afirmação das nações, Afeganistão, EUA (e demais países), quando ameaçados naquilo que lhes é essencial, responderão com violência.
Tem sido essa a única razão para todas as guerras que houve e haverá na história.
(*) Estudante de Letras/UFPA