INTERNET
“Entrar no acaso ou num blog”, copyright No mínimo (www.nominimo.com.br), 24/7/02
“Não tenho como não voltar ao assunto. A quantidade de e-mails recebidos me dá a esperança de que, quando estiver com crise de rejeição, me sentindo sozinho, abandonado, já sei o que fazer: escrevo sobre blog. Antes, eu recorria ao conselho do poeta Carlos Pena Filho, que compôs um dos mais bonitos sonetos da língua portuguesa, algo para figurar numa antologia ao lado de Camões, Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes. Como infelizmente não é muito conhecido, peço licença para publicá-lo aqui, antes de continuar a conversa. Vejam que beleza:
A solidão e sua porta
Quando mais nada existir que valha
A pena de viver e a dor de amar
E quando nada mais interessar
(Nem o torpor do sono que se espalha)
Quando, pelo desuso da navalha
A barba livremente caminhar
E até Deus em silêncio se afastar
Deixando-te sozinho na batalha
A arquitetar na sombra a despedida
Do mundo que te foi contraditório
Lembra-te que afinal te resta a vida
Com tudo que é insolvente e provisório
E de que ainda tens uma saída
Entrar no acaso e amar o transitório.
Pronto. Acabo de realizar um feito inédito: começar uma matéria e, seis linhas depois, publicar um poema. O bom da internet, dizia Marcos Sá Corrêa ao me trazer para cá, é que todas as liberdades são possíveis: você pode escrever um artigo de cinco linhas ou cinco laudas (lauda é uma coisa que eu e Gutemberg usávamos nas redações). O problema, digo eu, é manter as pessoas interessadas, quando se trata do segundo caso. Às vezes fico me perguntando se alguém lê mais de duas telas de computador. Eu tenho dificuldade, preciso imprimir para ler. Mas eu sou do tempo em que se lia em papel.
Voltando ao nosso tema. Não sei se vocês viram a seção de cartas ?Dos leitores? (carta é uma coisa que existia quando não existia e-mail). Como tem gente interessada em blog, meu Deus! Fiquei impressionado. Por ter viajado, não consegui tempo de aceitar os convites para visitar os endereços que me mandaram. Mal pude ler as mensagens. Hoje vou passar o dia fazendo isso. Me diverti perguntando a quem eu encontrava: ?você sabe o que é blog??.
Descobri que uma porção de gente da minha idade (?porção de gente da minha idade? é um exagero. Digamos, os que sobraram) nem desconfiava: ?blog? Como se escreve??, perguntavam. Um, esse já meio gagá, respondeu com segurança: ?ele fez muito pelo jornalismo, mas já morreu?. Estava confundindo blog com Bloch, de Adolfo. Como dizia Pedro Nava, velhice é uma merda.
Mas mesmo entre jovens encontrei quem ainda desconhecesse o tema em que eu já estava posando de doutor. Ao descer em Londrina para uma palestra, fui logo fazendo a pergunta à gatinha que estava me esperando no aeroporto para me servir de anjo-de-guarda. Inteligente, surpreendentemente lida (com 25 anos parecia ter lido tudo na vida), dona de uma livraria, Marisa me deu o prazer de aplicá-la na novidade. Nunca tinha ouvido falar.
À noite, pedi à platéia de quase 300 pessoas, entre estudantes, professores e jornalistas, que levantasse a mão quem soubesse o que era blog. Mais ou menos metade da sala respondeu sim. Alguns até _ há gosto para tudo também no Paraná _ haviam lido o meu artigo, o que permitiu um bom debate sobre a importância do tema.
Nessa altura eu já lera e-mails suficientes para corrigir aquela primeira impressão de que os weblogs eram apenas uma versão eletrônica, pós-moderna, dos antigos diários, embora este gênero seja talvez o de maior sucesso pelo que tem de confessional, de expressão subjetiva e confidencial, daquilo que antigamente a escola romântica chamava de estados d?alma: o ?spleen? tipo Byron, o ?mal du siècle? de Alfred de Musset ou mesmo o narcisismo sofrido do nosso Álvares de Azevedo.
Mas agora já sei que os blogs vão além, não têm limitações temáticas. Em uma das muitas mensagens recebidas, o leitor Hernani Diamantas anexou um artigo em que resume o que quis dizer sem conseguir. Eis um trecho:
?Na internet somos todos publishers. Postamos em listas, escrevemos em sites, e fazemos um jornalismo mambembe nos blogs. Estamos presenciando uma nova forma de conversação. Pessoas comuns estão mostrando a cara. Alguns preferem a obviedade do dia a dia, outros preferem elocubrar temas mais arrojados, outros se contentam com seus 15 minutos de fama. Esta conversação, embora totalmente caótica e sem controle, tem tomado uma forma gigantesca. Os mercados estão sendo formados, e micro-canais de comunicação passam a ter importância diferenciada?.
Continuaria escrevendo sobre isso, mas me dei conta de que já passei de duas telas. Até.”
“Conteúdo gratuito x pago”, copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 23/7/02
“Vou começar o artigo com uma pergunta: você pagaria para ter acesso a um conteúdo online, se este fosse realmente de seu interesse? Talvez esta seja uma das questões mais polêmicas no meio virtual desde a criação do conceito de conteúdo online.
Monica Miglio, diretora de conteúdo do portal Universia Brasil, acredita que o conteúdo online pago possa funcionar em alguns casos: ?Se o serviço contiver informações exclusivas, não disponíveis em outros meios, ou se contiver informações estratégicas, como cotações da bolsa online, notícias de agências como Reuters e outros que fazem diferença nas tomadas de decisão das empresas, acho que pode funcionar?, diz.
O abominável monstro da Net
É perfeitamente compreensível que algumas pessoas se revoltem pelo fato de o conteúdo online ter nascido gratuito e agora muitas empresas pensarem em cobrar por ele. Para alguns, as palavras conteúdo pago e internet são incompatíveis. Mas será que esse tal de conteúdo online pago é um monstro tão abominável assim? Apesar de muita gente ser contra a cobrança para acesso a notícias e serviços online, esse processo já se tornou uma cultura em sites como o Slate.com e o do jornal Wall Street Journal.
De acordo com pesquisas, milhões de internautas se mostram dispostos a pagar. Segundo recente estudo da Content Matrix, empresa de pesquisa de conteúdo online, quatro milhões é o número de usuários pagantes do NCsoft, site sul-coreano de jogos online e considerado o de maior número de internautas pagantes. Outro serviço conhecido que figura na lista é o American Greetings, rede de sites de cartões virtuais, com 1,4 milhão de usuários. Tudo bem que esses dois sites não possuem notícias como principal conteúdo, mas mostram que uma boa quantidade de pessoas paga por serviços online.
A resposta de Andiara Peterle – jornalista e gerente de projetos da Solar Filmes – à pergunta feita no início do artigo também é positiva: ?eu definitivamente pagaria para ter acesso à informação relevante. Claro que não me refiro só a notícias, mas também a vídeos, multimídia, pesquisas, entretenimento interativo etc. Imagina que maravilha, por exemplo, ter acesso a filmes e vídeos de todo o mundo, num canal exclusivo na internet (já que a maioria dos filmes fora do circuito não chega ao Brasil)? Certamente eu pagaria por isso. Embora as pessoas já estejam bastante acostumadas a ter acesso à informação especializada e gratuita na internet, creio que não deixarão de pagar para tanto, sobretudo quando a informação de que falamos extrapola o texto e oferece muitas outras possibilidades?, diz.
Conteúdo pago vira foco de sites noticiosos
O assunto é tão polêmico e digno de discussão que logo surgiram sites noticiosos especializados no tema. Com menos de um mês de vida, o weblog norte-americano Paidcontent.org, criado pelo jornalista Rafat Ali – gerente editorial do Silicon Alley Reporter -, surge com a finalidade de comentar sites que cobram por seus conteúdos, assim como analisar suas atitudes.
Outro blog norte-americano, o The End of Free, já faz tal cobertura há mais tempo. Segundo seu editor, Olivier Travers, o weblog traz informações sobre conteúdo pago desde março de 2001.
Ah! Vocês querem saber a minha opinião? Bom, eu nunca paguei para acessar conteúdo na Web, mas sou uma pessoa que gosta de absorver informações assim como uma esponja absorve água. Certamente eu pagaria para acessar alguma informação de qualidade e que fosse de real interesse para mim. Dependeria também do custo/benefício.
Outra polêmica: o que aconteceria se os principais jornais do mundo decidissem cobrar pelo acesso às edições virtuais? Talvez uma ascensão de canais de notícias alternativos? Aguardo comentários…
Até a próxima!”