A agenda ignorada
Como toda a imprensa internacional, os jornais brasileiros acompanham desde sábado, dia 14, a série de negociações iniciada com o encontro entre os presidentes Barack Obama e Lula da Silva nos Estados Unidos.
Apesar da descrença de alguns analistas, que no dia seguinte da primeria reunião já decretavam a inutilidade da agenda, nesta segunda-feira alguns jornais e agências de notícias dão conta de algumas definições para a reunião de cúpula dos vinte países mais importantes, o G-20, marcada para o dia 2 de abril.
A imprensa, como sempre, deu maior destaque aos gracejos trocados entre Obama e Lula, e alguns correspondentes internacionais destacam a “química” havida entre os dois presidentes.
Mas o noticiário revela que alguns pontos importantes foram decididos nessas primeiras conversas.
A questão das barreiras para a entrada do etanol brasileiro nos Estados Unidos, destacada pela maioria dos jornais, foi incluída entre os temas a serem debatidos nas comissões bilaterais, mas dentro de um contexto em que se vai discutir a recaída protecionista dos países desenvolvidos.
Além disso, ficou definido que Brasil e Estados Unidos vão buscar uma posição conjunta sobre a nova regulamentação do mercado financeiro global, a natureza dos pacotes de estímulo nacionais e o controle do dinheiro que passa pelos paraísos fiscais.
Os jornais e revistas brasileiros têm dado muita importância às medidas pontuais destinadas a interromper a espiral recessiva que ameaça a economia, mas a agenda que se desenha para a reunião do G-20 deverá se concentrar essencialmente na natureza da atuação do poder estatal e no novo equilíbrio de forças entre as nações desenvolvidas e os países em desenvolvimento.
A revista Veja, repercutindo um debate que se dá marginalmente nos Estados Unidos, tenta explicar aos seus leitores que as intervenções do governo Obama na economia americana não significam que ele esteja levando o país mais poderoso do mundo na direção do socialismo.
A longa reportagem, em tom didático e recheada de adjetivos, chega a ser divertida.
Mas passa longe dos temas que realmente interessam ao leitor.
A questão central é a nova ordem mundial.
Essencialmente, a crise revelou que a seita do livre mercado não passou pelo teste de realidade.
Sem o controle da sociedade, seja através do Estado ou de outras instituições, o que se pode esperar é o que se vê: fraudes, especulação desenfreada e irracionalidade.
A tentativa de regular os paraísos fiscais é um dos pontos centrais da superação da crise.
Mas a hipótese de abrir a realidade das contas que passam por essas lavanderias financeiras assusta muita gente boa.
Inclusive da imprensa.
O menino da discórdia
Alberto Dines:
– Barack Obama agradeceu a Lula por ter encaminhado o caso do menino Sean Goldman à Justiça Federal brasileira. Enquanto isso, o caso ganha as ruas. Ontem em Copacabana houve uma manifestação organizada pelos avós maternos para que o menino fique aqui. A mídia brasileira enfiou o rabo entre as pernas durante cinco meses e permitiu que um juiz de primeira instância decidisse o que pode ou não pode ser noticiado.
A revista Piauí mostrou que o bom jornalismo consegue milagres, inclusive driblar a censura togada. Agora, convém que a mídia, sobretudo a mídia brasileira que foi mantida à distância, saiba respeitar a privacidade desta criança. Sean deverá ser ouvido, como informou o desembargador Siro Darlan na última edição do “Observatório da Imprensa” [3ª feira, 22:40, TV-Brasil, link para o compacto e para a matéria]
Isto significa que doravante os meios de comunicação devem compenetrar-se da sua responsabilidade e tratar o caso sem sensacionalismos.
Esta criança de apenas nove anos sofreu uma sucessão de perdas irreparáveis: primeiro foi afastado do pai, depois perdeu a mãe e agora corre o risco de perder o sossego a que tem direito.
Melhor esquecer o patriotismo e as patriotadas: há americanos que acreditam que o menino deva ficar com os avós e a irmã recém-nascida, assim como há brasileiros que acham melhor que Sean fique com o pai americano. Há soluções menos drásticas capazes de oferecer a Sean a tranqüilidade para superar os traumas. O clima de “guerra” é a pior delas.