A campanha está nas ruas Os jornais desta sexta-feira registram a desistência do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, de disputar as eleições deste ano. Ele se compromete a permanecer à frente do BC até o final do atual governo. Meirelles, que representa um raro ponto de convergência entre o governo e a oposição, era o candidato dos sonhos do presidente Lula da Silva à vice-presidência. Mas ele não tem o perfil dos sonhos do PMDB – não tem tradição partidária nem demonstra aquela habilidade de negociação por mais benesses do poder, principal característica do maior partido do país. A coalizão governamental vai mesmo de Michel Temer, o presidente da Câmara que representa como ninguém o caráter ideologicamente anódino do PMDB. Sua trajetória política é a do colecionador de oportunidades. Entre seus compromissos mais duradouros, sua biografia registra a fidelidade aos empresários do bingo, dos quais foi dedicado defensor como advogado desde 1987. Confirmada a candidatura, os persistentes homens de negócio da jogatina já mandam lustrar suas máquinas viciadas. Um projeto nesse sentido desliza sorrateiramente no Congresso, longe do noticiário. Mas essas são histórias antigas, que a falta de memória da imprensa deixa repousar no limbo. Os jornais estão preocupados com outra questão: o pano de fundo das principais candidaturas ao governo federal é o tamanho do Estado. No entanto, uma montanha de problemas institucionais aguarda a definição dos candidatos, e ajudaria muito os eleitores conhecer os pensamentos da cada coalizão sobre esses temas. Parte desses desafios foi apresentada ao debate público no pacote do Programa Nacional de Direitos Humanos, mas a imprensa enxergou apenas aquilo que lhe interessava diretamente – a questão do controle social da mídia – e deixou no esquecimento tudo o mais. No fragor da campanha, as sutilezas tendem a desaparecer e o próprio jornalismo costuma se transformar em caixa de ressonância de acusações e baixezas. A partir da próxima semana, com ou sem apoio na legislação eleitoral, as candidaturas estarão lançadas. Esse é o período em que o melhor jornalismo costuma entrar em recesso. Palhaços em campanha O Tribunal Superior Eleitoral promete rigor no controle da campanha deste ano. As normas de conduta para o funcionalismo durante o período pré-eleitoral, divulgadas há duas semanas, são bastante severas. Oficialmente, a campanha só pode começar no dia 6 de julho. Mas pelo menos um setor da mídia já está em plena atividade eleitoral, sem que as autoridades e os jornalistas se tenham dado conta. Trata-se de alguns programas de televisão e rádio que misturam política e entretenimento e que, atuando como crítica social e política, influenciam as opiniões tanto quanto o jornalismo de verdade. O fato chama atenção para uma controvérsia que anda esquecida: programas humorísticos feitos ou comandados por jornalistas são atividades jornalísticas? Apresentadores de programas como o CQC, Pânico na TV e outros, que costumam invadir eventos e instituições políticas, devem ter o mesmo tratamento que se dá à imprensa, como credenciais para entrevistas coletivas? No ano passado, o senador Eduardo Suplicy andou perto de ser punido pelo Conselho de Ética por ter aceitado vestir uma sunga vermelha no Senado, a pedido de uma dessas humoristas. Tais profissionais, muitos deles portadores de diploma de jornalismo, afirmam que são parte da imprensa, e, nessa condição, costumam alegar o direito de informar quando são barrados em algum desses eventos. Mas a que código de conduta eles estão submetidos? Certamente, aplicar um nariz de palhaço no rosto de um parlamentar não é propriamente o trabalho de edição de um jornalista na televisão. Da mesma forma, promover discussões surrealistas e constranger autoridades em público não deve fazer parte dos objetivos de um repórter. No entanto, muitos humoristas se valem de credenciais de imprensa para interromper entrevistas, usando ardis e chicanas para se aproximar de personalidades, com a intenção de produzir situações risíveis. A imprensa poderia esclarecer se tais programas também estão submetidos às restrições impostas pelas regras das campanhas eleitorais. Marqueteiros de candidatos já podem ter alguns desses humoristas sob contrato.