Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

>>A crise no curto prazo
>>Mais do mesmo na política



A crise no curto prazo


Hoje é um dia em que os jornais parecem ter combinado o jogo: não há notícia mais importante do que a crônica do socorro anunciado ao sistema financeiro americano.


As diferenças entre as edições ficam por conta dos comentários e artigos, a maioria deles repetindo que o pacote pode ser indigesto para o consumidor mas é inevitável.
E aí, onde a imprensa encontra sua convergência, é que mora a controvérsia.


Literalmente todo o material noticioso e informativo aborda a crise sob o olhar do curto prazo, e nem mesmo as cronologias que tentam dar ao leitor uma noção do desenrolar dos acontecimentos, até culminarem com a quebradeira de bancos, estimulam a uma reflexão sobre as raízes do problema.


Sem essa reflexão, a massa dos investidores, aqueles que tentam preservar o patrimônio acumulado ao longo de suas vidas, continuam sem informações que os ajudem a se prevenir contra novas turbulências no futuro.


Mesmo considerando-se que o pacote é um remédio de emergência, espera-se sempre da imprensa que, ao informar o leitor, o ajude a entender o contexto em que os fatos acontecem.


No detalhamento do noticiário, ficamos sabendo que os senadores americanos foram muito sensíveis à ação dos lobistas, e aumentaram o custo do programa de resgate em 150 bilhões de dólares.


Agora, em vez dos anunciados 700 bilhões, o custo será de 850 bilhões de dólares.


No final, o pacote que vai à votação na Câmara dos Representantes nesta sexta-feira abriga, junto com o socorro aos bancos, uma ajudazinha a setores que não são diretamente afetados pela crise, como a indústria farmacêutica e as empresas que organizam corridas nos autódromos.


Segundo o Globo, ‘lobistas de vários setores fizeram a festa, aproveitando-se da necessidade do governo de fazer concessões a dezenas de parlamentares, para que votassem a favor do pacote’.


Além disso, os jornais destacam que o fator eleitoral pesou na decisão dos senadores, já que muitos deles são candidatos à reeleição.


Uma pesquisa realizada antes da votação no Senado revelava que a maioria da população mudou de idéia depois da rejeição do pacote na Câmara.


Se os eleitores mudaram, muda-se o voto.


Alguma relação com as votações no Congresso brasileiro?


Mais do mesmo na política


Todos os anos em que acontecem eleições, os jornais fazem seminários e reuniões para planejar a cobertura.


Em muitas dessas ocasiões, são contratadas consultorias especializadas para ajudar os editores a apresentar o melhor aos seus leitores.


Mas ainda não foi desta vez que a imprensa ofereceu ao público um trabalho inovador.


A campanha eleitoral chegou à reta final e não se pode afirmar que tenha saído do lugar-comum.


A imprensa fez pouco mais do que acompanhar as passeatas e carreatas dos candidatos, registrando os tapinhas nas costas, os afagos nas crianças pobres, a indefectível coxinha no boteco.


Em São Paulo, nem mesmo o ingrediente adicional de um partido – o PSDB – dividido entre dois candidatos – foi suficiente para inspirar os editores a reportagens mais consistentes, capazes de ajudar o eleitor a entender o que está por trás da disputa municipal.


O desfile dos candidatos a vereador repete a galeria de horrores de todas as eleições, sem que a imprensa coloque em discussão os critérios da Justiça Eleitoral para o registro das candidaturas.


Ah, houve, sim, algum debate sobre a possível anulação de candidatos com ficha suja, mas ele foi iniciado pela Justiça Eleitoral do Rio de Janeiro e apenas acompanhado pelos jornais.


Ficaram faltando as reportagens investigativas relacionando certos candidatos a suas parcerias fora da lei.


No Rio, a ação das quadrilhas em favor de seus candidatos prediletos resultou na intervenção das Forças Armadas mas, salvo um ou outro nome mais notório, a maioria dos eleitores vai às urnas neste domingo sem saber direito quem é quem.


No caso dos candidatos às Prefeituras das grandes cidades, os jornais mal conseguem disfarçar suas preferências.


Em praticamente toda a cobertura, a política nacional vazou para dentro das questões municipais, e perdeu-se a oportunidade de colocar em debate público o que interessa às comunidades.


Sejam quem forem os eleitos, a imprensa perdeu mais essa.