A euforia está de volta
Os jornais desta terça-feira descarregam uma onda de otimismo sobre o leitor nas seções de economia e negócios e ao mesmo tempo lhe tiram as esperanças nas editorias de política e de problemas nacionais.
Títulos no alto das páginas anunciam que a confiança da indústria supera os melhores momentos do período anterior à crise financeira de 2008.
Os investimentos produtivos voltaram, as encomendas do comércio se multiplicam e as vendas de grandes eletrodomésticos cresceram 35% entre maio e outubro, com o incentivo da redução de imposto.
O Ibovespa, principal indicador da Bolsa de Valores do Brasil, acumula alta de mais de 120% nos últimos 12 meses e, mesmo com a taxação de investimentos estrangeiros, não dá sinais de perder fôlego.
Esse Brasil de sonhos poderá chegar a 2016, ano das Olimpíadas no Rio de Janeiro, como o dono do 5º maior Produto Interno Bruto do mundo.
Ao mesmo tempo, poderá estar amargando alguns dos piores indicadores de desenvolvimento social de todo o planeta.
Nas mesmas edições em que celebra as conquistas econômicas, a imprensa brasileira registra o fato de que 33% dos casos de trabalho degradante ou análogo à escravidão são flagrados na região Sudeste, a mais desenvolvida do País.
Além disso, as autoridades e representantes dos agronegócios não se entendem quanto ao conceito de terra produtiva, que pode influenciar a eficácia das medidas de proteção ambiental.
Poucas páginas adiante, os jornais anotam que a Câmara dos Deputados conduz a votação da lei que trata do Fundo Nacional e outras normas da política brasileira para as mudanças climáticas sem levar em conta muitas advertências de especialistas.
Nos cadernos de questões metropolitanas, prossegue a repercussão das cenas de violência que têm atingido o Rio de Janeiro e discute-se a criação de penas mais rigorosas para grandes traficantes.
Lido de uma forma transversal, esse noticiário é uma lição prática para quem procura entender o conceito de desenvolvimento sustentável.
Porque o que os jornais trazem é o oposto, o retrato do crescimento econômico sem sustentabilidade.
Pressionados pelo mercado, que celebra a recuperação econômica, os protagonistas da cena pública tendem a deixar de lado as questões estruturais que mantêm o Brasil preso a indicadores sociais africanos e dificultam a criação de políticas inteligentes para conciliar crescimento com preservação do patrimônio ambiental.
E a imprensa parece estar embarcando alegremente na euforia geral.
Observatório na TV
A relação perversa entre crescimento econômico e permanência das mazelas sociais e ambientais não pode ser percebida à primeira vista na leitura dos jornais.
Por que a imprensa não consegue ampliar a visão do leitor, dos fatos assustadores no Rio de Janeiro, para o contexto maior dos problemas institucionais, que incluem a corrupção?
Alberto Dines:
– O narco-terrorismo só existe no Rio, o crime organizado opera apenas na Cidade Maravilhosa? A mídia está conseguindo dar a devida dimensão ao sistema nacional de delinquências que culminou com a derrubada de um helicóptero da Polícia no Morro dos Macacos, em Vila Isabel? A ousadia dos bandidos não será acentuada pela certeza da impunidade e a impunidade não está associada ao poder da corrupção? Estas e outras perguntas serão respondidas hoje no “Observatório da Imprensa”. Às 11 da noite na TV-Brasil, ao vivo, em rede nacional. Em S. Paulo pela NET, canal 4 e TVA, canal 181.