Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

>>A imprensa ‘verde’
>>Lições da escola Base

A imprensa ‘verde’

A imprensa brasileira começa lentamente a descobrir a importância da questão ambiental.

Depois do relatório sobre o aquecimento global, divulgado em fevereiro do ano passado sob patrocínio da ONU, jornais e revistas começaram a investir naquilo que chamam de ‘jornalismo verde’.

O problema é que esse tipo de jornalismo ainda separa economia de meio ambiente, e durante muito tempo ainda poderemos diagnosticar certa esquizofrenia: as novas seções especiais, dedicadas à causa ambiental e à responsabilidade social corporativa, parecem se chocar com o noticiário político e econômico de todos os dias.

Hoje, por exemplo, o Estado de S.Paulo publica uma notícia importante sobre o risco real que o aquecimento global traz para os negócios.

O jornal reproduz conclusões de um estudo da empresa de consultoria KPMG, que analisou a atuação de empresas de dezoito setores da economia global nos cinco continentes, com base em relatórios das próprias empresas e de onze especialistas em economia e mudanças climáticas.

O estudo indica que trinta por cento dos relatórios consideram as mudanças climáticas como um risco que já afeta o dia-a-dia dos negócios.

O trabalho é interessante porque, como se sabe, o processo de poluição e devastação produzido pelo modelo econômico de exploração indiscriminada dos bens naturais só vai ser interrompido ou colocado sob controle quando seus efeitos atingirem as finanças das empresas.

A incidência de risco em 30% das atividades econômicas é um índice suficiente para fazer com que as empresas comecem a se preocupar com o problema que é de todos.

Esse é o valor positivo da reportagem, publicada na página dedicada a Projetos Sociais, que sai sempre às quartas-feiras no Estadão.

Outros jornais também costumam dedicar uma seção, geralmente semanal, a temas ligados à questão da sustentabilidade.

E aí é que mora o problema.

Isolado das matérias sobre economia e política, por exemplo, e longe das reportagens sobre consumo, o noticiário sobre problemas ambientais e sociais continua sendo visto como uma concessão filantrópica dos jornais, um espaço dedicado ao ‘bem’ no meio da vida ‘real’.

E aí é que os jornais podem parecer esquizofrênicos.

Nas edições de hoje, por exemplo, reportagens como a que o Estadão publica sobre os riscos do aquecimento global para os negócios, convivem com notícias como a que se refere ao conflito entre populações indígenas e produtores de arroz na reserva indígena Raposa Serra do sol, em Roraima.

Todos os jornais, claramente, tendem a condenar a decisão do governo de fazer valer a demarcação da reserva.

O argumento é o de sempre: a preservação versus o progresso.

Trata-se de um falso dilema, mas os jornais ignoram as alternativas de desenvolvimento sustentável que superam essa questão primária.

O problema do jornalismo ‘verde’ da grande imprensa é que ele demora a amadurecer.

Lições da escola Base

A imprensa paulista está muito cautelosa no caso da menina de cinco anos que morreu no sábado, aparentemente após cair ou ter sido atirada do sexto andar de um prédio em São Paulo.

Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:

– Ainda há muito o que apurar no caso da morte da menina Isabella Nardoni, de cinco anos, ocorrida na noite do último sábado, em São Paulo. A garota foi deixada dormindo sozinha no apartamento do pai, durante alguns minutos, enquanto este descia à garagem do prédio para ajudar a segunda mulher a trazer outros dois filhos do casal. Ao retornar, uma das redes de proteção das janelas do apartamento estava cortada e Isabella estatelada no jardim do prédio, seis andares abaixo.

O assunto foi destaque no Fantástico, na noite de domingo. Os jornais paulistas correram atrás do assunto na segunda e na terça, e certamente deverão acompanhar os próximos desdobramentos. Vale registrar o cuidado da imprensa na cobertura do caso. Folha de S.Paulo e Estadão, para ficar nos dois principais jornais da cidade onde ocorreu o fato, trataram com sobriedade a tragédia. Muito embora, como relatou a Folha, uma delegada de plantão no distrito em que está instalado o inquérito tenha se referido ao pai da garota, aos berros, como ‘assassino’.

As lições do caso da Escola Base, quando a principal fonte foi um delegado, parecem não ter sido esquecidas. Menos mal para a imprensa.