Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

>>A queda da ministra
>>Uma lista incompleta

A queda da ministra

O governo do presidente Lula da Silva perdeu seu melhor cartão postal e seu mais seguro aval em influentes círculos políticos e de negócios da Europa e dos Estados Unidos.

Além disso, perdeu a única voz lúcida na sua  equipe que ainda ponderava que a corrida pelo desenvolvimento não pode ser vencida a qualquer preço.

Os grandes jornais de hoje, cada um à sua maneira, lamentam a saída da ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, e fazem mais um risco na lista de derrotas dos defensores do patrimônio natural do País no atual governo.

O retrato de Marina Silva nas paredes dos órgãos oficiais era uma lembrança de que, no meio da obsessão pelo crescimento econômico, alguém ainda pensava na preservação do meio ambiente.

Isso é o que os jornais dizem hoje, numa ampla cobertura, destacando os conflitos que Marina Silva teve com outros ministros, especialmente o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, e a  ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.

O que os jornais não exploram devidamente é que, além das divergências quanto ao programa de desenvolvimento, havia entre Dilma e Marina outro mal-estar: Dilma é a predileta de Lula para disputar sua sucessão, em 2010, mas a candidatura de Marina vem sendo cultivada por setores do PT que sonham em retomar a trilha ideológica original do partido.

Os jornais param pouco para refletir sobre a causa imediata da renúncia da ministra: a nomeação do ministro Roberto Mangabeira Unger, da Secretaria de Ações de Longo Prazo, como coordenador do Plano Amazônia Sustentável.

A decisão anunciada pelo presidente Lula surpreendeu Marina Silva, que era considerada a candidata natural ao posto, por conta de sua longa história pessoal de luta pela Amazônia.

É fato conhecido que Mangabeira Unger, por mais brilhante que seja considerado nos meios acadêmicos entende tanto de Amazônia quanto de futebol.

Para se ter uma idéia de como seria um quadro do tipo ‘quem ganha, quem perde’, junto à notícia da saída da ministra do Meio Ambiente, basta ler as declarações dos representantes do agronegócio e dos parlamentares ruralistas.

O clima entre eles era ede festa, sem disfarces.

Os jornais parecem lamentar a demissão de Marina Silva, como se tivessem lhe dado apoio durante as disputas que manteve enquanto esteve no governo.

Uma olhada rápida nos arquivos mostra que, em todos esses episódios anteriores, ela foi tratada como alguém que se opunha ao desenvolvimento do País, ao combater a liberação do plantio da soja transgênica e exigir o cumprimento de todos os requisitos de prevenção ambiental e social para as obras do PAC.

Hoje o Estado de S.Paulo lhe faz justiça, publicando reportagem de página inteira para afirmar que, durante sua gestão, Marina colocou a floresta em agendas políticas, econômicas e ambientais do mundo.

O título da reportagem: ‘Desmatamento caiu 60% em três anos’.

Parece um epitáfio. E é quase cínico.

Uma lista incompleta

O Globo publica hoje, no alto da primeira página, um quadro com cinco ‘notícias de corrupção’.

O jornal carioca foi modesto.

São muitos mais os casos de corrupção, todos eles com novidades todos os dias.

Todos os casos organizados pelo Globo no quadro exposto acima da manchete de hoje estão nos outros jornais.

Mas, embora pareça uma enxurrada de denúncias, eles não representam o volume da corrupção real nem representam qualquer novidade.

Se o leitor tem a sensação de estar consumindo material requentado, não é por falta de  assunto.

Seria arriscado afirmar que a corrupção é maior hoje no Brasil do que sempre foi.

O mais conveniente é observar que a sociedade conta atualmente com mais instrumentos de mídia para tomar conhecimento dos feitos e mal-feitos de governantes e agentes públicos.

Mas apenas noticiar isoladamente os casos sob investigação oficial, mesmo que colocados num quadrinho, não ajuda o leitor a entender a dimensão do problema.

Por que cinco denúncias e não dez?

Por que esses cinco casos, e não outros, que também são do conhecimento da imprensa?  

Porque os jornais, mesmo o Globo, que pertence ao mais poderoso grupo de comunicação do Brasil, não possuem estrutura para acompanhar um número razoável de casos ao mesmo tempo.

Ficam dependendo das declarações de autoridades ou da divulgação de relatórios oficiais.

E fazem suas escolhas de acordo com preferências que não têm necessariamente a ver com os interesses do leitor.

A corrupção é uma doença endêmica no Brasil e em muitos outros países.

Ao tratar a questão como se fosse uma epidemia, a imprensa omite da sociedade o conhecimento que poderia ajudá-la a manter o problema sob controle.