A queda das máscaras
Na semana que começa, os leitores de jornais ainda digeram o picadinho de informações servido nos últimos dias, no qual se incluem números mais ou menos indigestos e alguns sinais de otimismo na economia.
Na política, ao contrário, o que se vê é a repetição do espetáculo de mentiras, dissimulações e traições que sempre marcam as transições de comando no Congresso Nacional.
As eleições dos presidentes da Câmara e do Senado nada ficam a dever às intrigas palacianas dos tempos de Lucrécia Bórgia.
Até mesmo o notório senador Renan Calheiros, que foi personagem da crônica policial por tantos meses em 2007, retorna em grande estilo, como chefe da campanha de José Sarney ao círculo mais elevado do poder republicano.
No varejo das más notícias, sempre referentes ao mês de dezembro passado, o leitor ficou sabendo que a indústria brasileira teve um desempenho pífio, que o desemprego aumentou e que outros indicadores apontavam para uma visão pessimista dos negócios.
Mas no atacado, a imprensa informa que o ano de 2008 registrou intensa atividade industrial, queda do desemprego e outros índices favoráveis.
Na abertura de fevereiro, os jornais destacam que o setor público fechou o balanço de 2008 com um superavit primário correspondente a 4% do Produto Interno Bruto, o que indica que o governo está gastando menos do que arrecada.
Duas outras notícias podem ser confrontadas para um entendimento melhor do momento econômico.
A informação de que os gastos da indústria brasileira com juros subiram 17,3% no último trimestre de 2008 combina com os dados segundos os quais o setor financeiro nacional cobra as maiores taxas do mundo, em comparação com os custos de captação.
Mas essa informação precisa ser analisada no cenário pintado pelo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, em entrevista publicada hoje pela Folha de S.Paulo.
O presidente do Banco Central, assegura, segundo a Folha, que o problema de liquidez no sistema financeiro nacional acabou, e que nada impede a retomada dos créditos.
A questão, que remete à notícia dos altos juros pagos pela indústria, e que dificulta a retomada das atividades produtivas, passa agora para o âmbito das negociações entre os bancos e seus clientes.
A rigor, não há na imprensa explicações visíveis para a permanência dos altos custos financeiros a não ser o oportunismo dos bancos.
Neste início de fevereiro, as máscaras começam a cair ainda antes do carnaval chegar.
A imprensa tem candidato
A imprensa não deveria acompanhar tão passivamente a disputa pela presidência do Senado.
Afinal, seus interesses podem estar em jogo.
Alberto Dines:
– José Sarney não lembra mas jornalistas e leitores não podem esquecer que o senador maranhense foi o responsável direto pelo atraso de 14 anos na criação do Conselho de Comunicação Social estabelecido pela Constituição de 88.
Acuado pela pressão da sociedade, quando presidia o Senado pela primeira vez depois da redemocratização, Sarney fingiu que instalaria o Conselho: Manhoso, armou uma lista inaceitável de nomes – incluiu até um assessor pessoal – de modo a inviabilizar a criação do órgão.
Conseguiu. Ramez Tebet, que substituiu Sarney em meio a uma grave crise no Senado, emplacou afinal em 2002 o sonhado Conselho graças ao trabalho conjunto de senadores do PT e do PSDB entre eles o falecido Artur da Távola. Pela primeira vez na história da República discutia-se a imprensa e os meios de comunicação num foro oficial dentro do Legislativo.
A festa durou pouco. Sarney reassumiu a presidência do Senado em 2003 e quando terminou o primeiro da mandato dos Conselheiros deu um jeito de desativar o Conselho de Comunicação com a indicação de outro apaniguado para presidi-lo e liquidá-lo. Deste então estamos novamente sem Conselho de Comunicação, em completo desacordo com a Carta Magna.
Uma curiosidade histórica: a primeira edição do ‘Observatório da Imprensa’ em Abril de 1996 cobrava de Sarney a constituição do Conselho de Comunicação Social. Treze anos depois estamos de volta fazendo a mesma cobrança. A escolha de Sarney para presidir o Senado trará, entre outras coisas, a certeza de que o Conselho continuará inativo e inoperante. Tião Viana é a esperança do retorno à legalidade.
Este é um caso em que a grande imprensa deveria tomar partido. Pergunta-se: a grande imprensa quer mesmo um Conselho de Comunicação Social?
*
Leia também: E a Sociedade Civil?’, de Alberto Dines, primeira edição, abril de 1996