Ações ofuscadas
A crise boliviana reduziu o espaço para dois casos importantes. Primeiro, as pesadas condenações do ex-juiz Nicolau dos Santos Neto e de seus parceiros na construção do Fórum do Trabalho em São Paulo.
Segundo, a prisão de dois ex-deputados e outras pessoas envolvidas no escândalo das ambulâncias.
Garotinho continuará com fome
O ex-governador Garotinho calculou mal e deu azar: sua greve de fome, ofuscada pelos fatos na Bolívia, até agora teve como único resultado prático liberar o PMDB para conversar sobre alianças com o presidente Lula e o PT.
Concessões espúrias
Alberto Dines pede que o Congresso reveja a situação promíscua de parlamentares com meios de comunicação.
Dines:
– Apesar do pesadelo do gás boliviano, o presidente Lula está em plena lua de mel com a imprensa. Já era tempo, mas a proximidade das eleições certamente apressou o fim da zanga. A adesão do presidente ao compromisso de Chapultepec no Dia Internacional da Liberdade de Imprensa foi uma belíssima oportunidade para desfazer os mal-entendidos entre o Executivo e a mídia. Dias antes, no 1º de Maio, quando soube da greve de fome de Anthony Garotinho, o presidente Lula, além de ironizar o pré-candidato do PMDB, foi taxativo ao dizer que a imprensa é vital para a democracia, tanto quando fala bem ou fala mal dos políticos.
Seguidor fidelíssimo da linha do governo, o presidente da Câmara Federal, Aldo Rebelo, não quis ficar atrás e anunciou que vai apressar a tramitação do projeto que libera a divulgação dos documentos secretos. Em vez disso, o deputado Aldo Rabelo poderia prestar um serviço transcendental à comunicação no Brasil se tomasse providências para acabar com um dos maiores escândalos da Casa que preside: a concessão de canais de rádio e tv aos colegas deputados. Isso é absolutamente ilegal. O pecado original da nossa mídia eletrônica está neste trambique que vige desde os tempos de Sarney. Um deputado não pode ser concessionário de um serviço público e, além disso, um deputado não pode legislar em causa própria. Se o governo quer efetivamente aproximar-se da mídia e através dela da sociedade, deveria determinar aos deputados da base aliada que abandonassem uma prática tão aberrante e tão ilícita quanto a do mensalão. Mas será que o revolucionário Aldo Rebelo terá coragem para tocar uma revolução desta importância?
Crítica sem nexo
A revista Exame é deliberada e ostensivamente opiniática. Tudo bem. Mas a editorialização da Exame na edição desta quinzena soa estranha: “Na tentativa de fugir da órbita de influência das grandes nações do planeta e assumir um papel de liderança entre os países emergentes, o governo Lula vem produzindo uma série de fiascos com sua política externa”.
Ora, qualquer governo que se preze procurará fugir da órbita de influência das grandes nações do planeta. Quanto a procurar exercer liderança entre os emergentes, também é algo que o Brasil, pelo seu tamanho e pela importância de sua economia, está condenado a fazer.
Isso não significa que o governo Lula não cometa erros. Comete. Na crise atual com a Bolívia, por exemplo, não deveria ter aceitado a descabida presença do presidente Hugo Chávez no encontro de ontem na Argentina.
Contraprova das desventuras da política externa atual é que, como notou o ex-embaixador Rubens Barbosa, o Brasil não teve, diante do ato unilateral e nada diplomático da Bolívia, a solidariedade de nenhum de seus vizinhos.
Condoleezza compreende
Uma boa síntese da situação energética da América do Sul foi feita ontem pelo Houston Chronicle, do Texas, terra do petróleo americano. Cita um especialista para quem a situação havia se tornado insustentável porque não é possível que empresas estrangeiras invistam bilhões e o povo não receba nenhum benefício, como é o caso da Bolívia, onde a renda per capita é hoje menor do que há 25 anos.
O Houston Chronicle dá uma informação que não saiu nos jornais brasileiros: as autoridades americanas se recusaram a condenar o decreto boliviano de nacionalização. Na quarta-feira (3/5), no Conselho das Américas, a secretária de Estado, Condoleezza Rice, falou algo parecido com o que tem dito o presidente Lula. Disse que o governo dos Estados Unidos reconhece que muitos latino-americanos esperam mais ajuda de seus governos: “Muitas pessoas ainda não sentem em seu cotidiano os benefícios da democracia”.
Clique aqui para ler o discurso (em inglês) da secretária de Estado americana.
Crise desperta
A imprensa brasileira dormiu desde a posse de Evo Morales, mas procura agora recuperar o tempo perdido. A cobertura ficou mais rica e mais competente. Mas terá fôlego para tudo o que vem pela frente na América do Sul?
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