Apagão de informações
Audálio Dantas era presidente do Sindicato dos Jornalistas em São Paulo quando, em outubro de 1975, Vladimir Herzog, diretor do departamento de jornalismo da TV Cultura de São Paulo, foi torturado e morto em dependências do II Exército. Audálio está escrevendo um livro sobre o episódio, no qual teve atuação destacada. Recentemente, ele pediu as informações sobre Herzog guardadas no Arquivo Nacional, em Brasília, e teve o dissabor de ver sua solicitação embaraçada por descabidas exigências burocráticas. O assunto foi abordado pelo jornalista Ricardo Kotscho em seu blogue de forma contundente [ver “A terceira morte de Vlado”], o que levou o ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, ao qual o Arquivo está subordinado, a determinar que a documentação fosse liberada para Audálio. Audálio teve, então, uma surpresa, como conta nesta entrevista ao Observatório da Imprensa.
Audálio Dantas – Ao solicitar os dados do Vlado, os papéis referentes a ele, eu solicitei os meus. Vem um resumo de cada citação. No meu caso, chegaram 97 páginas, cada uma com três ou quatro resumos. Isso significa de 350 a 400 citações a respeito aqui do seu prezado amigo. Aí tem um monte de coisas, assim: “Participou do evento de instalação da Comissão da Paz”, “Assinou…”, “Foi a Piracicaba numa manifestação de sindicatos”. Tem coisas mais longas, consistentes. Eu apareço como membro do PCB, depois como do PC do B… é uma confusão fantástica.
Quando chega no período do Sindicato dos Jornalistas, principalmente aquele que mais me interessa, que é desde a posse, em maio de 75, até a morte do Vlado… até o Fiel [Manuel Fiel Filho, operário comunista morto em 17 de janeiro de 1976]… Já em julho eu fui convocado pelo comandante do II Exército [atual Comando Militar do Sudeste], por causa de uma nota que nós fizemos censurando um associado, o Fausto Rocha, que disse num discurso, no Palácio dos Campos Elíseos – ele era locutor, mas se deu o direito de fazer um discurso − que as redações estavam infiltradas pelos comunistas, essa coisa. Era de encomenda, isso. Fizemos a nota, o general nos chamou para dizer que o jornalista tinha toda a razão, porque as redações estavam realmente infiltradas pelos comunistas… E aí começou todo o negócio. E eu queria ver o que tinha acontecido.
Pois olhe: nem isto, nem nada dos dias de prisões, antes do Vlado, nenhuma referência. O que ocorreu efetivamente é que eles apagaram isso. Ou o SNI [antigo Serviço Nacional de Informações, centro de espionagem política da ditadura] não mandou os documentos, ou o Arquivo Nacional sonegou, o que é muito grave.
Veja você. Aquele documento de 1.004 assinaturas de contestação do IPM [feito após a morte de Herzog e que concluiu que o jornalista havia se suicidado] não aparece. O general Dilermando Gomes Monteiro [que substituiu Ednardo D’Ávila Melo no comando do II Exército, após a morte de Fiel Filho] visitou o sindicato − isso já é no outro ano −, não consta.
Então, evidentemente, apagaram. É um novo apagão.
[Mauro – Esse foi Audálio Dantas. O Fiel a que se refere Audálio é o operário Manuel Fiel Filho, morto sob tortura em janeiro de 1976. O II Exército hoje se chama Comando Militar do Sudeste. O general Dilermando substituiu Ednardo D’Ávila Melo, demitido após a morte de Fiel Filho. Leia a entrevista completa no Observatório da Imprensa Online.]
Sader e a “velha mídia”
Não deixa de ser curioso que Emir Sader, demitido formalmente por uma ministra do governo Dilma da expectativa de ser presidente da Casa de Rui Barbosa, atribua ao que chama de “velha mídia” parte da responsabilidade pelo desenlace desfavorável.