Reação tardia
O espetáculo de violência oferecido pelo confronto entre policiais e traficantes, ocorrido no Rio, transmitido pela TV Globo na quarta-feira e relatado nos jornais de ontem, parecia absorvido pela mídia até hoje.
Apenas a manifestação da Ordem dos Advogados do Brasil, exigindo apuração sobre a perseguição e morte de dois homens por policiais a bordo de um helicóptero despertou nos jornais a preocupação com aspectos legais da operação.
Barbárie ou guerra?
O confronto na Favela da Coréia durou cerca de seis horas, a partir das 9 horas da manhã, mas as autoridades só foram procuradas no dia seguinte aos acontecimentos para falar sobre a violência dos choques.
O Estado de S.Paulo e a Folha publicam a justificativa do secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, de que as operações são planejadas conforme as características do local e os tipos de armas que os traficantes possuem.
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, ouvido pelo Estado, elogiou a decisão do governador Sérgio Cabral Filho de manter os ataques aos locais dominados pelos traficantes.
Para ele, trata-se de um enfrentamento necessário.
A guerra continua
Mesmo promotores que analisaram as cenas da televisão se dividiram entre a tese de que os policiais agiram em legítima defesa e a hipótese da execução pura e simples.
No meio da troca de opiniões, os jornais paulistas adotaram a posição cautelosa de apenas reproduzir as posições divergentes.
Mas o Globo, mais próximo do local dos acontecimentos, chama o confronto de ‘guerra’ e concorda com a polícia que não se pode enfrentar a violência do tráfico com operações leves.
Mas alerta para a necessidade de se abrir também uma frente interna para combater a chamada ‘banda podre’ da polícia e pede que os agentes da lei evitem situações que coloquem em risco a segurança dos moradores.
A imprensa fica em posição insustentável no episódio.
Se justifica a violência da ação policial com a violência dos traficantes, pode ser acusada de estimular a barbárie
Se critica a polícia por reagir com vigor contra os ataques dos criminosos, pode ser tida como leniente com relação ao crime.
Talvez ajude um pouco observar que os confrontos acontecem porque os policiais, agentes do Estado, tentam recuperar para a sociedade espaços públicos dominados por grupos criminosos.
O confronto tem mesmo características de uma guerra e a imprensa precisa se organizar para fazer uma cobertura condizente com esse cenário.
Sem entusiasmo
Trata-se de um dos maiores escândalos do mundo dos negócios no Brasil, envolve uma das maiores multinacionais do setor de tecnologia da informação e tem indícios de integrar um sistema ainda maior de fraudes e crimes corporativos.
Mas a imprensa não demonstra o mesmo entusiasmo que dedicou aos escândalos na política para relatar o caso que envolve altos dirigentes da Cisco Systems.
Dines:
– Os jornalões de ontem não estavam a fim de destacar a operação ‘Persona’ da Policia Federal que desbaratou o esquema de fraudes fiscais da multinacional Cisco, um dos maiores fabricantes mundiais de equipamentos para a Internet. Ao contrário do que acontece quando os denunciados são empreiteiras, autoridades e políticos brasileiros, a mídia impressa foi extremamente cuidadosa nesta nova incursão da PF. A Folha, sequer mencionou o assunto na primeira página, nem na capa do seu caderno de negócios. O Estadão, ao invés de esconder as fraudes da Cisco, deu um destaque na sua primeira página, pasmem — em benefício da multinacional: ‘Caso da Cisco é comum no Brasil’. Alega a fonte americana ouvida pelo Estadão que a culpa é dos altos impostos e da burocracia brasileira. Apenas o Globo noticiou o fato na sua primeira página e sem qualquer atenuante deu nome aos bois, mencionou os empresários indiciados e presos. Também os portais de notícias adotaram uma suspeitíssima prudência com relação ao escândalo [produzido pelo maior fabricante de equipamentos pesados para a web]. Este súbito cuidado na cobertura das operações da Polícia Federal deveria ter acontecido antes, na operação ‘Navalha’ quando a mídia em peso apresentou o ex-ministro Silas Rondeau como beneficiário de uma propina de 100 mil reais oferecida pela empreiteira Gautama que, aparentemente, não se confirmou. A precaução e o senso de responsabilidade são bem-vindos, mas a reviravolta foi rápida demais para parecer espontânea
Luciano:
A novela da CPMF
Os jornais finalmente abandonaram o terreno das barganhas, em que vinham patinando há três meses, para entrar no que realmente interessa quanto ao noticiário sobre a CPMF.
Depois de simplesmente gastar suas páginas reproduzindo declarações e registrando impasses fictícios na votação da proposta de prorrogação do tributo, a imprensa começa a admitir implicitamente que, na verdade, nem a oposição pensa em votar contra.
Ao noticiar que o movimento dos governadores pela prorrogação da CPMF é liderado pela gaúcha Yeda Crucius, do PSDB, os jornais estão declarando aos leitores que as manifestações da oposição publicadas até aqui podem não ter passado de mero jogo de cena.
Na verdade, o que se percebe na leitura cuidadosa dos jornais de hoje é que o projeto será aprovado no Senado, ainda neste ano, com pequenas modificações em relação ao que passou pela Câmara dos Deputados.
Mas enquanto a Folha de S.Paulo diz que a proposta de redução da alíquota é da base aliada, o Globo explica que a equipe econômica já tem um estudo que admite essa possibilidade.
O fato é que provavelmente já existe um entendimento sobre uma redução progressiva, mas a concentração do noticiário nas barganhas e declarações deixou o leitor por fora.
Desinformação
O Globo destaca que parte dos debates no Congresso tem acontecido num ambiente de muita opinião e pouca informação.
O jornal carioca noticia, por exemplo, que os senadores ficaram surpresos com o esclarecimento da Receita Federal de que as pessoas que ganham até 1 mil, cento e quarenta reais são isentas da CPMF.
Na verdade, os jornalistas que cobrem o assunto também ignoravam esse fato, já que nenhum jornal se referiu a ele quando os senadores propuseram a isenção para quem ganha pouco.
Desinformação e diz-que-diz encheram páginas e páginas de jornais nos últimos meses.
No fim, é bem possível que o projeto seja aprovado e o leitor continue sem saber qual a importância da CPMF.
Renan em nova jogada
Isolado e fora da presidência do Senado, Renan Calheiros sofreu ontem mais uma denúncia, levada pelo PSOL ao Conselho de Ética.
A origem é uma reportagem do Estado de S.Paulo dando conta de que ele aprovou emendas ao orçamento destinando verbas para empresas dirigidas por um ex-assessor do seu gabinete.
Os jornais de hoje consideram que a cassação do presidente licenciado do Senado é apenas questão de tempo.
Renan tenta emplacar um sucessor – o senador José Maranhão – e preparar uma saída que preserve seus direitos políticos.
Mas a cada dia ele está mais próximo da cassação.