Churrasco no shopping
Um abaixo-assinado que não chegou a 3.500 adesões fez a Companhia do Metrô de São Paulo rever o projeto da Linha 6-Laranja, do metrô da capital, e provoca uma controversa manifestação que pode levar a confronto moradores do bairro de Higienópolis e grupos que defendem a convivência democrática em todos os espaços da cidade.
A questão circulou por duas semanas nas redes sociais da internet antes de ganhar espaço nos jornais e obrigar as autoridades a virem a público explicar por que o desagrado de meia dúzia de moradores de um bairro nobre pode provocar mudanças em critérios técnicos para a localização de uma estação do metrô.
No projeto original, a estação Higienópolis deveria ser construida na esquina da Avenida Angélica com a rua Sergipe, local onde atenderia ao maior número de usuários.
Mas alguns moradores decidiram não aceitar a obra na área, e expuseram suas razões em abaixo-assinado.
Entre as preocupações manifestadas, ganhou repercussão o temor com a chegada ao bairro de “gente diferenciada” ou de uma “população flutuante” que poderia representar risco de criminalidade, conforme destacou a representante do bairro no conselho comunitário de segurança.
Um movimento de protesto contra o que foi considerado manifestação de elitismo e preconceito cresceu no Facebook e acabou por levar à organização de um “happening” em frente ao Shoping Higienópolis, marcado para este sábado.
Mas aquilo que começou com uma expressão de intolerância acabou ganhando tanta repercussão que chegou a preocupar as autoridades.
O presidente da Companhia do Metrô tentou se explicar, mas, segundo os jornais, não sabia até quinta-feira onde seria a estação.
Enquanto isso, as obras se arrastam e os problemas no trânsito evoluem na direção da paralisação total da maior cidade do país.
Nesta sexta-feira, dia 13, os jornais informam que pelo menos um dos lados envolvidos na polêmica está demonstrando bom senso.
Os organizadores da manifestação contra o preconceito decidiram cancelar o churrasco que havia sido marcado em frente ao shoping e realizar apenas uma concentração festiva e beneficente, com ajuda de policiais de trânsito e da PM.
E a imprensa?
Bom, os jornais perderam uma boa oportunidade para discutir a falta de planejamento urbano e a equivocada estratégia de estimular o surgimento de guetos na cidade.
A Imprensa em Questão
Jornalões homenageiam Maria Antonieta
Alberto Dines:
– Jornais concorrem através do noticiário, furos, lances dramáticos, análises profundas, opinião corajosa. A batalha das manchetes é a mais salutar, benfazeja e legítima das competições em todo o mundo democrático há cerca de 150 anos.
Mas no cabeçalho das suas edições de ontem, os dois jornalões paulistanos, Folha e Estadão, deixaram as suas obrigações de lado e disputaram algo que nada tem a ver com jornalismo — comida.
Não ofereciam cupões para cestas básicas nem sugestões de sopão para os famintos. Em vez de brigar para ver quem defende melhor o cidadão, assumiram-se como vitrines de quitutes.
Para enfrentar o caderno “Paladar” do Estadão (que dominava há anos o segmento gastronômico), a Folha lançou o caderno “Comida” com 16 páginas de seduções gustativas. Um show de dar água na boca.
Enquanto o noticiário local fica cada vez mais mirrado e o internacional cada vez mais comprimido, os dois jornalões imaginaram-se em Paris ou Nova York e partiram em busca de novos prazeres e sabores.
Cada vez mais frívola, cansada de ser o quarto poder, nossa imprensa encontrou uma maneira muito criativa de oferecer sua contribuição ao “Fome Zero” e, além disso, prestar uma justa homenagem à infeliz Maria Antonieta que sugeriu aos pobres comer brioches. Bom apetite!