Culpa coletiva
O Estado de S. Paulo se antecipou aos concorrentes e publica hoje o resultado do laudo do instituto de Criminalística de São Paulo sobre o acidente com o Airbus da TAM que causou 199 mortes no aeroporto de Congonhas em julho do ano passado.
Segundo o relatório técnico, a culpa pela tragédia é partilhada pela cúpula e altos funcionários da Agência Nacional de Aviação Civil, por servidores da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária, pela fabricante do avião, pela TAM e até pelos pilotos.
O tema é manchete do jornal paulista, que teve acesso ao documento, que deverá ser entregue segunda-feira à Polícia Civil, encerrando a fase de inquérito dezesseis meses depois do acidente.
Depois disso, o material deverá ser encaminhado ao Ministério Público Estadual para eventuais denúncias.
Os envolvidos poderão ser enquadrados no crime de atentado contra a segurança de transporte aéreo, estando sujeitos a penas de um a três anos de detenção, por homicídio culposo.
A parte do documento que trata da análise técnica dos fatores que teriam causado o acidente mostra uma sucessão de equívocos e retrata a soma das falhas, que vão das condições inadequadas da pista ao estado de estresse dos pilotos, passando por falta de informações da Airbus sobre um eventual erro no manuseio dos manetes de freio do avião.
O laudo indica que os pilotos realizaram um pouco perfeito, mas erraram ao deixar um dos manetes na posição de aceleração.
Essa teria sido a causa principal da perda de controle da aeronave.
Mas os computadores do Airbus não emitiram o sinal de alerta, o que induziu os pilotos a uma manobra errada.
As circunstâncias adicionais que colaboraram para o final trágico foram a pista molhada, a falta de ranhuras para escoamento da água, as condições meteorológicas, a falta de treinamento por parte da empresa aérea e as falhas nas normas e regulamentações.
Como era de se esperar em acontecimentos desse tipo, a complexidade do acidente não permite direcionar ou concentrar a culpa em um ou dois personagens da tragédia.
Agora convém aos leitores rememorar o noticiário da época e observar como as manchetes induziram a uma histeria geral sobre os riscos das viagens aéreas.
Como tratamos aqui de observar a imprensa e não o sistema de transporte aéreo, resta acrescentar um item na lista de equívocos: a imprensa também errou ao procurar uma causa central para o desastre.
Não havia uma causa, mas um enorme conjunto de erros.
Bisbilhotices na gaveta
Agora que a Polícia Federal volta a se ocupar do banqueiro Daniel Dantas, a imprensa tem uma boa justificativa para fugir da questão dos vazamentos de informação.
Alberto Dines:
– A Fase-2 da Operação Satiagraha segue a velha rotina da nossa cobertura jornalística: começa espontânea, autônoma. Em seguida, diante do potencial explosivo, produzem-se sutis mudanças no curso do noticiário até que, uma semana depois, o caso transforma-se e toma outro rumo.
Os primeiros movimentos da Polícia Federal ao investigar seus próprios procedimentos na espetacular operação Satiagraha foram na direção dos vazamentos para a mídia. A direção do órgão policial queria saber como funcionava o sistema que antecipava para a TV o local e hora das suas operações e também queria apurar quem vazava para jornais e revistas trechos inteiros dos relatórios secretos, inclusive gravações com pessoas que não estavam sendo diretamente investigadas (caso do Chefe de Gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho).
O interesse da PF era legítimo, assim como é legítima a publicação de informações que chegam a jornais e revistas. Espúrio seria o relacionamento direto dos investigadores com as redações de modo a criar fatos consumados e badalados antes mesmo de tomadas as decisões judiciais.
De repente, alguém mudou o foco das investigações e a PF em boa hora voltou a cuidar do banqueiro Daniel Dantas que já estava esquecido. Mas nessa alteração engavetou-se a imperiosa discussão sobre vazamentos.
Para a felicidade daqueles que não gostam discutir as suas mazelas em público.