E a gripe chegou
Como era esperado, o vírus da gripe A, conhecida como gripe suína, chegou ao Brasil.
Os jornais de sexta-feira registraram os primeiros quatro casos confirmados e, de modo geral, mantêm a linha de informar em primeiro lugar, evitando especulações e alarmismo.
A exceção segue sendo o Globo, que não perde, ou até cria, oportunidades para deixar no ar a tese de que o Brasil não estaria preparado para uma epidemia.
Os três jornais considerados de maior influência nacional apresentam em manchete a confirmação do contágio em brasileiros que retornaram de viagem ao exterior no mês de abril.
A Folha de S.Paulo destaca em título da reportagem interna de duas páginas que, segundo as autoridades sanitárias, não há motivo para pânico: o vírus tem baixa letalidade, revelando-se pouco mais grave que o da gripe comum.
Também o Estado de S.Paulo, com três páginas para o assunto, dedicou amplo espaço a informar seus leitores sobre cuidados a serem tomados na fase de expansão da doença e destacando a estrutura montada nas principais cidades brasileiras para fazer frente ao possível agravamento do quadro.
O Globo também repete o quadro com informações sobre “cuidados a tomar”, mas dedica apenas uma página ao assunto e inclui nela uma nota sob o título “Tendência é aumentar”.
Sob esse título, alinha-se uma curta entrevista com uma virologista que integra a Comissão para o Desenvolvimento dos Planos de Contingência Nacional para Influenza, órgão criado pela Organização Mundial da Saúde.
O repórter começa afirmando que, “segundo alguns especialistas, o Brasil não estava preparado e demorou muito para fazer o diagnóstico”.
A entrevistada rechaçou de bate-pronto, dizendo não concordar com a afirmação.
Ainda assim, o repórter insiste em uma resposta alarmista, até que consegue ouvir a obviedade segundo a qual o número de casos no Brasil pode aumentar, porque continuam chegando pessoas que viajaram para os países de maior incidência e porque também podem ocorrer casos de transmissão aqui mesmo no País.
O Globo, então, conseguiu o título que o editor buscava.
É assim que se produz o pânico: insiste-se na pior versão, até que um fato de menor importância acabe justificando a escolha pela interpretação mais tenebrosa.
Discute-se permanentemente o papel da imprensa diante de acontecimentos que podem provocar comoção geral ou movimentos coletivos de grandes proporções.
Os jornalistas conhecem perfeitamente os limites entre a informação que produz cautela e a que leva ao descontrole.
O Globo parece apostar na segunda alternativa.
A comédia dos erros
Alberto Dines:
– Prossegue a telenovela da Lei de Imprensa. Ontem, a Folha de S. Paulo publicou o candente parecer do jurista José Paulo Cavalcanti Filho, condenando a revogação total do estatuto pelo Supremo Tribunal Federal sem ter providenciado outro em seu lugar. Seu concorrente, O Estado de S. Paulo, deu enorme destaque à declaração do Ministro-Chefe da Secretaria de Comunicação, Franklin Martins, na mesma direção: sem uma regulamentação do Direito de Resposta haverá um retrocesso.
São duas opiniões de grande peso que não podem ser ignoradas: o jurista Cavalcanti Filho, além de ser um de nossos maiores especialistas em matéria de legislação sobre mídia, foi presidente do Conselho de Comunicação Social no único biênio em que funcionou antes de ser desmantelado pelo imortal Arnaldo Niskier a mando dos coronéis do Senado. O jornalista Franklin Martins nada tem a ver com a quixotada levada à suprema corte, a questão não diz respeito ao Executivo, foi decidida na esfera do Judiciário. Mas a autoria da ação é do PDT e o PDT faz parte da base aliada. Os presidentes da Câmara e do Senado, também fazem parte da base aliada, o jurista Michel Temer e José Sarney, barão da mídia maranhense estão na esfera da Secretaria de Relações Institucionais, comandada pelo ministro José Múcio Monteiro.
Os dois jornalões paulistas agora em oposição uníssona nada fizeram antes da votação da semana passada. Só se mexeram agora, quando a situação tornou-se irremediável e irreparável. A ANJ, que congrega os principais jornais do país, estava esfusiante com a possibilidade de extinguir o único estatuto capaz de exercer algum tipo de regulação contra eventuais excessos da mídia. A SIP, Sociedade Interamericana de Prensa, aliada da ANJ, se regozijou com o fim do autoritarismo. A SIP enganou-se novamente: o autoritarismo vai começar agora, quando a questão do Direito de Resposta depender de juízes de primeira instância, geralmente inclinados a punir a imprensa e até mesmo censurá-la. Telenovelas são, geralmente, movimentadas pelas paixões, a telenovela da Lei de Imprensa está impregnada de hipocrisia e de oportunismo.