“Empate de culpas”
Há uma estranha conjuntura política neste período pré-carnavalesco. No Congresso, a vontade cada vez mais evidente de encerrar as apurações sobre corrupção. Não porque os dois lados estejam cansados de golpear um ao outro. Mas sim porque chegou-se a uma espécie de “empate técnico”. Enquanto isso, mais podres são armazenados para eventual uso durante a campanha eleitoral.
A entrada em cena da chamada lista de Furnas teve o efeito de apontar para gente demais, graúda demais, ligada ao PSDB e ao PFL. Assim como o depoimento do juiz Julier Sebastião da Silva, que virou um duelo com o PSDB. Mas a imprensa prossegue intensa busca de novas denúncias.
Existe um “empate de culpas”, por assim dizer, mas a conjuntura é estranha porque ao mesmo tempo continuam a surgir na imprensa evidências de escândalos. Voltou à baila a participação da Telemar na empresa Gamecorp, produtora de programas de TV sobre jogos eletrônicos. Como se sabe, um filho do presidente Lula é sócio da empresa.
Na Folha, Mônica Bergamo informa que a situação de Duda Mendonça e de sua sócia, Zilmar Fernandes, complicou-se na CPI dos Correios.
Os erros da oposição
Muito lentamente a imprensa começa a fazer o balanço dos erros políticos cometidos pela oposição. Se de fato houve, como se anunciou na época, a intenção de fazer o governo Lula sangrar até a campanha eleitoral, o resultado é que o paciente nem anêmico ficou, quanto mais moribundo. E os erros foram se somando de tal modo que a escolha do candidato tucano se tornou mais do que complicada. Se tornou quase fratricida.
O preço do maniqueísmo
A imprensa demora a registrar os problemas da oposição não exatamente porque os donos de jornais sejam mais ligados ao PSDB e ao PFL. Isso é verdade, mas os repórteres não se submetem a essa lógica. O problema é que a mídia, desde sempre, e mais ainda depois que virou espetáculo, trabalha na base do maniqueísmo. Como posso colocar hoje no banco dos réus meu super-herói de ontem?
Vigiar as pesquisas
O Alberto Dines pede mais rigor no exame de pesquisas eleitorais. Dines:
– Parece que a nossa imprensa tem ojeriza a juntar os fatos. Prefere tratar as ocorrências em separado, fragmentadas. Nossa mídia detesta identificar tendências, talvez por isso esteja sempre atrasada, pega de surpresa pelos fatos. Aumentam as críticas e as dúvidas relacionadas com a última pesquisa Sensus/CNT. A reversão nas posições do presidente Lula e do prefeito Serra parece exagerada. Mas acontece que há três semanas outra sondagem eleitoral, esta paga pelo ex-governador Garotinho e publicada pela revista “IstoÉ”, também despertou desconfianças. Sérias desconfianças. Em apenas um mês duas pesquisas envoltas em suspeição. E a campanha eleitoral sequer começou. Não seria o caso de convocar a Justiça Eleitoral para ser mais rigorosa na autorização destas sondagens? Ou será que a imprensa não quer embaraçar a proliferação destas loterias estatísticas? Afinal, uma alteração rende manchetes, às vezes por muitos dias.
Carandiru sem simplismo
O hoje deputado Ubiratan Guimarães fez questão de concorrer sob o número 111, o número oficial de mortos no Carandiru, o que deixa clara sua ideologia, mas seria uma ilusão achar que a condenação dele, por si só, faria justiça. Houve muito mais gente envolvida no comando e na execução.
A cobertura do Massacre do Carandiru foi precária na época e continua precária até hoje. A melhor reportagem foi publicada em janeiro de 1998, mais de cinco anos depois do episódio, e não foi num jornal de São Paulo. Foi na Zero Hora, de Porto Alegre. O repórter Ricardo Stefanelli leu os 38 volumes do processo e sintetizou: “A operação desobedeceu à estratégia criada para a ação policial naquela penitenciária, desenrolou-se sem comando e terminou sob uma farsa”. Havia a expectativa de que o julgamento ocorresse ainda naquele ano de 1998. Foi o maior processo da história jurídica brasileira, o que teve o maior número de réus e de vítimas. Talvez por isso não tenha chegado a lugar nenhum. A reportagem da Zero Hora foi reproduzida neste Observatório da Imprensa.
Massacre em pílulas
A Rocinha é um Carandiru em pílulas. Ainda não houve um único banho de sangue gigantesco, mas há quase vinte anos os assassinatos se sucedem. A mídia registra, ouve o discurso oficial das autoridades e o lamento dos moradores. E fica por isso mesmo.
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