Enganando o leitor
A Folha de S.Paulo anuncia, na primeira página de hoje, a seção ‘Folha corrida’, serviço supostamente inovador em parceria com uma operadora de telefonia móvel.
Uma chamada no alto da página promete: ‘nova página fixa, na contracapa do caderno Cotidiano, traz notícias em cinco minutos’.
O leitor começa a imaginar que a página do jornal vai se atualizar como uma tela de televisão, a cada cinco minutos.
Depois, lembra-se que a tecnologia do papel é a mesma de 2 mil anos atrás e ainda não permite a atualização do conteúdo impresso.
Mas, como se verá, não se trata de uma surpreendente inovação tecnológica, mas de uma perigosa brincadeira de marqueteiros com o conteúdo jornalístico.
A lembrança da realidade faz o leitor pensar no parceiro da novidade da Folha: bom, então as notícias que aparecem no jornal vão ser atualizadas via telefone celular.
Fica, então, o leitor, mais curioso, pois estamos diante de uma possibilidade tecnológica real e até simples, com o advento da telefonia de terceira geração.
Busca, então, a última página do caderno Cotidiano.
E lá está, uma página inteira de notas curtas, basicamente de serviços e fofocas sobre celebridades.
O leitor procura, mas não há uma linha explicando do que se trata a tal ‘Folha Corrida’, além de conter um resumo do caderno Cotidiano.
No pé da página, um anúncio da operadora, que se confunde com o noticiário, avisa: Acesse tal endereço eletrônico e veja outras boas notícias.
Como quem brinca de gato e rato, o leitor persistente liga o computador e acessa o tal endereço.
Mas lá não encontra nenhuma referência à tal ‘Folha Corrida’.
Aliás, nem uma citação da Folha de S.Paulo.
Aí, então, o leitor entende: não é jornalismo. É publicidade.
A tal ‘Folha Corrida’ parece uma página de notícias, mas tudo indica que se trata apenas de um anúncio.
Provavelmente, anuncia a oferta de conteúdos da Folha para quem contratar os serviços da operadora.
Mas isso não está escrito na tal ‘Folha Corrida’.
Também não está explicado no site da operadora nem no da Folha de S.Paulo.
E o leitor se sente enganado.
Diz o artigo 66 do Código de Defesa do Consumidor que é crime: ‘Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços:
Pena – Detenção de três meses a um ano e multa.
A pena vale para quem publica e para quem patrocina.’
Aliás, no jargão do jornalismo policial, ‘folha corrida’ é o nome que se dá à ficha criminal, também chamada de ‘capivara’.
Revendo a história
O Observatório da Imprensa na TV trata hoje à noite de um episódio da nossa história ocorrido há quase um século.
Discute, assim, o papel da imprensa no registro dos acontecimentos que marcam a nacionalidade.
É disso que trata hoje o comentário de Alberto Dines:
– O Brasil está mergulhado em 1808 e isso é muito bom. Sem 1808 não haveria 1822. Uma nação que descuida da sua história não sabe corrigi-la nem continuá-la. Na semana passada a Folha de S. Paulo trouxe de volta em esmerada pesquisa histórica do repórter Marcelo Beraba, um episódio mais recente, ocorrido em 1910, a Revolta da Chibata, a rebelião de marujos contra os atrozes castigos físicos então em vigor em nossa Armada. A edição desta noite do Observatório da Imprensa vai retomar um assunto que já mereceu alguns livros e até um filme, porém permanece praticamente desconhecido do grande público. A intenção não é abrir velhas feridas, nem reacender ressentimentos ocorridos há quase um século. Ao contrário, a função da imprensa é relatar fatos e a função do ‘Observatório da Imprensa’ é provocar reflexões. Às 22:40, ao vivo, pela TV-Cultura e TV-Brasil.