Falta informação sobre o acidente nuclear
O físico Sergio Rezende, da Universidade Federal de Pernambuco, foi ministro da Ciência e Tecnologia do presidente Lula durante cinco anos. Ele esteve em Tóquio, Tsukuba e Sendai, de onde saiu seis dias antes do terremoto. Está chocado com o que o noticiário mostra e preocupado com a situação do Japão. Mas tem uma visão crítica sobre a maneira como a mídia trata o assunto. Ele foi ouvido ontem pelo Observatório da Imprensa.
O.I. – As informações ainda são relativamente precárias, mas as pessoas já estão tirando conclusões.
Sergio Rezende – As pessoas estão tirando conclusões, escrevendo artigo em jornal, emitindo opinião na televisão, e certamente há precipitação nisso. A gente não consegue dizer ainda o que vai acontecer. A situação é grave, certamente, deve ter consequências graves, ou não. Dependendo do que realmente estiver acontecendo. Algumas das pessoas têm falado da preocupação com as nossas usinas de Angra. Uma coisa importante é que os reatores de Angra, os que estão instalados e o que está previsto para Angra 3, são de um tipo diferente dos japoneses, e são tecnologias mais novas. O Brasil não tem nenhum registro de qualquer movimento de terra no lugar onde estão as usinas. O Japão sempre foi uma área suscetível a tremores de terra. E com isso os reatores são construídos para ser à prova de terremoto. Só que ter um terremoto e um tsunami ao mesmo tempo é um negócio complicado. E foi o que aconteceu. O problema não foi com o reator diretamente. Foi com o sistema de refrigeração, que deixou de funcionar porque faltou eletricidade. E faltou eletricidade porque eles não
previram que a água podia invadir lá e eventualmente prejudicar o fornecimento de eletricidade.
O.I. – Quando o senhor estava no Ministério, eu me lembro que propôs a construção de várias usinas, um programa ambicioso.
S.R. – O Comitê do Programa Nuclear, que se reuniu exaustivamente sob a presidência da ministra-chefe da Casa Civil, aprovou o reinício da construção de Angra 3 e a instalação de quatro a oito novas usinas nucleares. Por que isso? Porque o Brasil tem pelo menos a sexta reserva de minério de urânio do mundo, que está debaixo do solo guardadinha, e além disso nós temos a tecnologia para fazer urânio enriquecido. Não usar essa energia, quando nós vamos precisar de muita energia, não faz muito sentido. A não ser que a tecnologia seja realmente muito insegura. Ainda não estou convencido disso.
O.I. – A não ser que a tecnologia seja muito insegura…
S.R. – Mas ela não é insegura. Cada acidente desses torna a tecnologia mais segura. É a primeira vez que estamos tendo um acidente causado por um tsunami. Nunca teve isso antes. As usinas vão ter que passar a prever tsunami também. As que estão perto do mar.
A esquecida região serrana
A tragédia da região serrana do Rio de Janeiro foi esquecida pela maior parte da mídia. Com raras exceções – uma delas foi o Observatório da Imprensa na TV − , pouco se tem dito sobre o drama dos sobreviventes. Ontem, como se partisse do nada, uma manifestação popular sacudiu Teresópolis. O repórter André Oliveira, da Rádio Teresópolis, relata o que aconteceu.
André Oliveira – O que a gente observa é um clima de muita indignação, que começa principalmente na população, que não vê as coisas acontecerem nas localidades mais atingidas. Houve aquele serviço emergencial, simplesmente liberando acesso, jogando barro para o canto, e as pessoas não estão vendo ações diretas do poder público no sentido de se resolverem os problemas. Existem hoje localidades, principalmente na zona rural da cidade, que ainda estão sem acesso. Pontes foram levadas. É quase unânime a participação dos ouvintes nos nossos programas, e as pessoas reclamam disso. E um dos grandes pilares da economia da cidade é exatamente a zona rural, a produção de hortigranjeiros. Mas não é só isso. Nos bairros atingidos, pessoal indignado com aluguel social, achando que tem gente que está sendo beneficiada. E há muitos dias, a gente tem acompanhado, as pessoas têm falado sobre o prefeito, “não tem feito nada”, o prefeito, o prefeito. E houve uma grande mobilização, fala-se em três, quatro mil pessoas mobilizadas, isso é algo que nunca se viu antes em Teresópolis, pessoas pedindo a criação da CPI para chegar até, se possível, ao impeachment do prefeito da cidade. Não fosse a presença da Força Nacional, que ainda está na cidade mantendo a ordem, mantendo a paz, eu acho que a noite teria sido mais violenta do que aconteceu.