Ganhando com o inimigo
A Associação Nacional de Jornais está vivendo uma contradição em termos. Segundo sua presidente, Judith Brito, que também é diretora superintendente do grupo Folha da Manhã, que edita a Folha de S. Paulo, a imprensa brasileira atua como um partido de oposição porque a verdadeira oposição partidária está paralisada.
Ao mesmo tempo, a ANJ comemora um dos melhores momentos dos jornais e anuncia que o setor pode crescer até 8% neste ano. Os estudos que fundamentam o otimismo da imprensa apontam para as mesmas razões que colocam o Brasil como um dos países com melhores perspectivas de desenvolvimento: a política econômica do governo ao qual a imprensa oficialmente se opõe.
Segundo publica nesta quinta-feira a própria Folha de S.Paulo, a circulação média diária dos jornais brasileiros chegou a 4.279.482 exemplares nos quatro primeiros meses deste ano, com uma elevação de 1,5 % em relação ao mesmo período de 2009.
A medição, feita pelo Instituto Verificador de Circulação, mostra ainda que houve um ponto fora da curva na leitura de jornais, de 4.375.803 exemplares, no mês de março passado, o que representou um pico superior ao de um dos melhores momentos do setor, o mês de outubro de 2008, pouco antes de se refletir por aqui a crise financeira internacional.
Durante o ano passado, em função da crise, os jornais cancelaram suas campanhas de venda e a circulação caiu 3,5%.
A avaliação do IVC, segundo a Folha, é de que a crise ficou rapidamente para trás e as empresas jornalísticas voltaram a investir em promoções que estão atraindo leitores.
Além disso, a expectativa da Copa do Mundo sempre é um fator positivo adicional, pelo interesse dos torcedores em acompanhar os detalhes da competição.
Embora o levantamento tenha considerado 97 jornais filiados ao IVC, o cenário é semelhante para todo o setor, que se beneficiou claramente da política econômica que manteve em boas condições os fundamentos da economia e permitiu o desenvolvimento de uma ampla base de classe média resgatada da pobreza nos últimos anos.
Os jornais não costumam destacar esses êxitos da economia e a presidente da ANJ não se lembra deles ao comemorar o bom momento dos negócios da imprensa.
Afinal, negócios são negócios, política é política.
Imprensa em campanha
A polêmica declaração da presidente da Associação Nacional de Jornais, freqüentemente relembrada quando se discute a questão da postura da imprensa diante da disputa eleitoral deste ano, motivou uma reportagem interessante publicada na presente edição da revista Negócios da Comunicação, da editora Segmento.
Com o título “Apoio Político”, a revista questiona se a mídia deve ou não assumir o seu candidato.
Diversas personalidades do mundo jornalístico respondem a pergunta, alguns observando que nos Estados Unidos é tradição os veículos declararem sua preferência em editoriais.
Em 2008, por exemplo, o New York Times assumiu publicamente sua preferência por Barack Obama.
Entre os entrevistados, o jornalista Mino Carta, diretor da revista Carta Capital, afirma que o problema não é apoiar um candidato, mas a falta de clareza que se vê no Brasil. Apesar de nenhum dos grandes jornais declarar abertamente suas preferências, ele não tem dúvida de que todos apoiaram Fernando Collor em 1989, assim como apoiaram José Serra em 2002, Geraldo Alckminn em 2006, e voltam a apoiar Serra neste ano.
Mino Carta, cuja revista tem um viés claramente favorável ao atual governo, com críticas pontuais, acha que o Estado de S.Paulo é o mais claro e assumido entre os grandes jornais, porque todo dia lança um editorial para atacar o governo Lula.
Também entrevistado pela revista Negócios da Comunicação, o diretor de redação da Folha de S.Paulo, Otávio Frias Filho, afirma que seu jornal mantém uma tradição de apartidarismo, não apoiando candidatos, embora ele ache que a posição oposta também seria legítima.
Frias entende que, apesar de alguns deslizes aqui e ali, a cobertura política realizada pelos principais diários brasileiros é isenta e equilibrada.
Ele considera que o Globo parece menos isento, pelo menos no que se refere à política carioca. Já a revista Veja, na opinião de Otávio Frias Filho, tem um viés político tão explícito e ostensivo que compromete sua isenção.
Não é nada, não é nada, já é alguma coisa o fato de a imprensa começar a discutir suas idiossincrasias.