A privacidade dos meritíssimos
Que os presidentes de Tribunais de Justiça não queiram divulgar os vencimentos de juízes e funcionários se compreende, embora não se aceite. É o velho jus esperniandi, o direito de chiar. Trata-se, como em tantos outros casos, de um retrato da identidade brasileira, ou, melhor dito, da elite brasileira.
Mas comparar a Lei de Acesso à Informação com atos da ditadura militar, como fez o presidente do TJ do Rio de Janeiro, Manoel Alberto Rebêlo dos Santos, é uma afronta. O Globo desta sexta-feira (20/7), onde está a declaração, não deveria tê-la publicado desacompanhada de um reparo.
O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Nelson Calandra, considera que a divulgação nominal dos salários viola a privacidade dos servidores do Judiciário. Já declarou isso outras vezes. Calandra convoca agora em defesa de sua tese um argumento esdrúxulo. Por sinal, muito sintomaticamente, não se refere aos altos escalões, mas à base da pirâmide funcional.
É em entrevista também ao Globo. “Um moço, por exemplo, servidor de qualquer órgão público, pode se achar vítima de bullying porque foi publicada uma relação com seu salário. Se ele era cortejado na sociedade, pode sofrer bullying porque não ganha de acordo com sua aparência perante a sociedade.”
O juiz Calandra não está preocupado com transparência, equidade, prestação de contas. O que o preocupa são as aparências.
Magistrado censura imprensa
Em nome da Lei de Execuções Penais, o juiz Bruno André Silva Ribeiro proibiu Carlos Augusto Ramos, vulgo Carlinhos Cachoeira, de dar entrevista à Folha de S. Paulo. A notícia foi dada na quarta-feira (18/7). O juiz disse que a lei só permite contato com advogados e família.
Não é a opinião do advogado Manoel Alceu Afonso Ferreira. Para Manoel Alceu, a lei assegura ao preso, mesmo provisório, direito de ter contato com o mundo exterior. É evidente que falar à imprensa faz parte da defesa de um réu. Ou, mais genericamente, do direito de expressão de um indivíduo.
O contestado argumento baseado na Lei de Execuções Penais não foi o bastante para o magistrado do Distrito Federal. Ele tachou de sensacionalista uma entrevista que nem chegou a ser feita. E se julgou no direito de rejeitar a “escolha pontual” de Cachoeira “por um veículo específico da imprensa”.
Essa defesa da concorrência entre meios de comunicação leva à sugestão de que o juiz Silva Ribeiro promova no presídio da Papuda, onde está Cachoeira, uma entrevista coletiva.
O poder, no Brasil, insiste em questionar a liberdade de imprensa.
Há mortos e mortos
Na madrugada de sexta-feira (13/7), a PM de São Paulo matou oito pessoas, apresentadas como “suspeitos”, em seis ocorrências. A Folha de S. Paulo deu a notícia em manchete no sábado. O Estado consagrou ao assunto a foto principal de sua capa. Não houve espaço, em nenhum dos dois jornais, para publicar os nomes dessas pessoas.
Na noite de quarta-feira (18/7), um empresário, Ricardo Prudente de Aquino, foi morto com tiros na cabeça depois de tentar furar um bloqueio policial na Vila Madalena, bairro paulistano de classe média. Na edição desta sexta-feira houve espaço na primeira página da Folha para dar o nome e uma foto de Ricardo. O comandante da PM pediu desculpas à família do empresário. O mesmo fez o governador Geraldo Alckmin.
Mas quando os oito homens foram mortos, na semana passada, Alckmin atribuiu a violência policial ao clima criado por traficantes. Em 2011, dos 1.299 homicídios registrados na capital paulista, 290, ou 22 por cento, foram cometidos por policiais militares, em serviço ou fora dele.
A morte do empresário fará provavelmente com que durante alguns dias os dedos dos PMs fiquem menos nervosos em bairros ricos e de classe média da cidade.