Atenção: repórter à solta
De repente, o espetáculo midiático das eleições presidenciais muda de cenário.
A tática de entulhar uma das partes com uma sucessão de escândalos, que já não funcionou nas três últimas eleições, se torna inócua diante do fato de que nenhum dos candidatos que aparecem com mais chances nos levantamentos de intenção de voto está imune a ter seu nome envolvido em irregularidades.
O ex-governador Eduardo Campos (PSB), que anda de braço dado com a ex-ministra e ex-senadora Marina Silva, como uma espécie de amuleto contra o mal endêmico da corrupção, vê sua imagem abalada pela acusação de que sua campanha arregimenta apoios à base de propina.
É certo que o denunciante – o ex-deputado José Augusto Maia, ex-presidente do Pros em Pernambuco – tem uma folha corrida que aconselha a relativizar qualquer coisa que diga.
Mas, para o jornalismo declaratório, o dito é fato.
Então, Campos vê repentinamente seu papel de corregedor geral dos costumes abalado por uma suposta oferta de apoio financeiro que seu partido teria feito para obter a adesão da agremiação de José Augusto Maia à chapa formada em Pernambuco.
Condenado pela Justiça pernambucana por improbidade administrativa, Maia perdeu os direitos políticos por três anos mas conta com o amplo benefício dos recursos judiciais e alega que não teve ainda uma sentença definitiva.
Isso bastaria, segundo afirma, para dar credibilidade à sua denúncia.
Como a imprensa costuma atirar primeiro e verificar os documentos depois, fica Eduardo Campos, pelo menos até que se tudo se esclareça, na desagradável contingência de atuar na defensiva.
Como não tem nada a ver com isso, a ex-senadora Marina Silva sai de cena, esperando que seu parceiro de chapa se desincumba do encosto.
A presidente Dilma Rousseff, para-raios natural de todo malfeito passado, presente e futuro que vier a ser atribuído ao Partido dos Trabalhadores, ganha um alívio ao ver seu nome isentado das trapalhadas produzidas pela Petrobras na aquisição de uma refinaria de petróleo nos Estados Unidos.
Como a iniciativa de desvincular a presidente da República foi de um ministro do Tribunal de Contas da União vinculado ao oposicionista PSDB, o relator José Jorge, os jornais não podem alegar que houve uma manobra política por trás dessa decisão.
Coisas de jornalista
Por outro lado, o ex-governador Aécio Neves, candidato que conta com um sentimento de simpatia-quase-amor por parte da imprensa hegemônica, se vê enrolado em um episódio relativamente insosso que pode lhe custar uma tremenda dor de cabeça.
O caso do aeroporto privado construído com dinheiro público no município de Claudio, Minas Gerais, ganha proporções capazes de atrapalhar a campanha do candidato do PSDB.
Na sequência da revelação feita pelo repórter da Folha Lucas Ferraz, de que o então governador de Minas destinou quase R$ 14 milhões dos cofres públicos para modernizar o aeródromo da cidade onde sua família possui fazendas e outras posses, os jornais farejam algo mais.
Nesta quinta-feira (23/7), por exemplo, o Estado de S. Paulo observa que a pista de pouso original, construída em 1963 pelo avô de Aécio, Tancredo Neves, quando governava Minas, também fora feita com dinheiro público.
O Globo é o único dos grandes diários de circulação nacional a se desviar do assunto, seguindo o padrão de sua consorte, a Rede Globo de Televisão, quando se trata de questões que prejudicam o candidato do PSDB.
No entanto, o jornal carioca investe em reportagem sobre uma sucessão de irregularidades no Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, o que equivale a levantar o tapete das recentes administrações sob o comando de Aécio Neves.
A atual presidente do TCE, que está sendo investigada, foi indicada por ele.
Ligando lé com cré, o jornalista verifica o histórico das contas dos governos do Estado nos últimos doze anos e encontra algumas pautas interessantes.
Aqui e ali, os arquivos guardam denúncias de desvio de verba da saúde e referências a suspeitas de que o caso do aeroporto seria um entre outros problemas no programa de melhoria do sistema aeroportuário de Minas Gerais.
De repente, o candidato que navegava nas águas fraternas da imprensa amiga se vê cercado de más notícias.
E isso por que?
Porque a Folha de São Paulo permitiu que um repórter praticasse seu ofício.
Quem mandou deixar o repórter solto por aí?