Em busca do consenso
O final de semana foi da Rio+20 na imprensa brasileira. A Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável disputou linha por linha o noticiário dos jornais e dos portais da internet com o futebol, os escândalos da temporada e a crise na Europa.
Mas, em torno de fatos circunstanciais e relatos sobre personagens curiosos, como os índios que usaram pela primeira vez o metrô, o tema central continuou sendo a dificuldade dos representantes de chefes de
Estado de chegar a um consenso sobre o documento oficial que deverá marcar o compromisso global pela mitigação dos problemas ambientais e o combate à pobreza.
Na falta de uma decisão de maior impacto, a imprensa se satisfaz por enquanto com os progressos feitos pela rede de prefeitos de grandes cidades, que está muito próxima de definir suas metas de combate às causas das mudanças climáticas.
A tendência dos prefeitos é confirmar medidas já em fase de implantação ou consolidação em cidades de países desenvolvidos, como o incentivo a construções que reutilizam água, usam materiais e processos de baixo impacto ambiental e aplicam tecnologias para maior eficiência de uso da energia.
No caso das grandes cidades localizadas em países mais pobres, entra nos compromissos também a determinação de universalizar os serviços de saneamento básico, melhoria nas condições de habitação e plantio de florestas urbanas e outros espaços de área verde.
Por trás de todos esses planos, porém, rondam as dificuldades inerentes a um sistema econômico que, ao sacralizar o espaço da iniciativa privada, limita o alcance do poder público na defesa do interesse coletivo.
Nas grandes cidades, principalmente naquelas que se localizam ao sul do Equador, o principal problema ambiental ainda se chama especulação imobiliária, e vive de mãos dadas com a corrupção, conforme se pode observar no noticiário da capital paulista sobre grandes construções que prejudicam o espaço urbano, complicam ainda mais o trânsito e obtiveram autorização de funcionamento à base de propina.
Curiosamente, esses escândalos são isolados do noticiário sobre as próximas eleições municipais, que deveriam incluir os planos de candidatos com relação aos compromissos da Rio+20.
Jeitinho brasileiro
Nesta segunda-feira, dia 18, os jornais anunciam que a negociação dos chefes de Estado finalmente avançou, graças a uma proposta brasileira de uma definição imediata de metas, com um prazo maior para sua implantação.
O chamado “jeitinho brasileiro” deu um jeito de construir um consenso em torno da necessidade de destinar mais recursos e vontade política à luta global contra a pobreza extrema, estendendo as responsabilidades à iniciativa privada, o que deve reduzir as pressões sobre os governos dos países que enfrentam a presente onda de dificuldades econômicas.
Nas últimas horas, segundo o noticiário online, o acordo estava próximo de suas linhas finais, restando a preocupação com o risco de sair um documento demasiado vago a ponto de colocar em dúvida o resultado da conferência.
Não são poucos nem simples os desafios que estão sendo enfrentados no encontro. Entre outras questões, como a preservação da diversidade ambiental, o aumento da produtividade agrícola, a garantia de bem-estar para os povos tradicionais e os moradores das grandes cidades e das florestas, a preservação das fontes de água limpa e do patrimônio marinho, destaca-se no noticiário a preocupação com a construção de um modelo econômico que, na falta de melhor definição, vem sendo chamado de “economia verde”.
O ponto central desse quesito é a definição de um substituto do Produto Interno Bruto como indicador de desenvolvimento.
Quando eram fechadas as edições dos jornais desta segunda-feira, a imprensa apostava na criação do IRI – Índice de Riqueza Inclusiva – proposta do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.
Trata-se de uma métrica que procura incluir, no cálculo do crescimento econômico dos países, recursos como florestas naturais, áreas agrícolas, reservas minerais e de pesca, associados a indicadores de desenvolvimento humano, como educação, mortalidade infantil e outros fatores que apontam para situações de bem-estar da sociedade.
Os primeiros ensaios usando essa metodologia mostram grandes mudanças no quadro comparativo entre as nações, o que deve provocar alguma resistência entre os países que atualmente se destacam pelo desempenho do PIB.
Indiretamente, o que os jornais estão registrando é uma mudança no sistema econômico mundial, que pela primeira vez em todos os tempos começa a admitir a responsabilidade coletiva pelo desenvolvimento.