Tuesday, 26 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

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>>Celso Furtado e a cultura

Mensalão no STF

Começa daqui a dez dias o julgamento do processo do mensalão. Na quinta-feira (2/8) da semana que vem. A quantidade de material publicado sobre o assunto, em boa parte por iniciativa de defensores dos réus, começou a se erguer como uma onda ainda discreta. Mas vai se agigantar a cada dia.

No próximo fim de semana, jornais e revistas virão, presumivelmente, com reportagens e análises ainda calcadas em raciocínio frio. Mas do dia 2 em diante, a emoção e as paixões começarão a dar a tônica. O tiroteio midiático, que promete recompensa em audiência, fará alguns jornalistas afrouxarem mecanismos de checagem das informações. “Em tempo de guerra tem mentira como terra”.

Prepare-se, ouvinte.

Celso Furtado e a cultura

Foi lançado no Rio de Janeiro no início do mês e será lançado nesta segunda-feira (23/7) em São Paulo o livro Ensaios sobre cultura e o Ministério da Cultura, com ensaios, entrevistas e debates de Celso Furtado, ministro da Cultura no governo Sarney entre 1986 e 1988, um dos intelectuais latino-americanos mais importantes do século 20. O volume foi organizado por Rosa Freire d’Aguiar, jornalista e tradutora emérita, viúva de Celso.

Nesta entrevista ao Observatório da Imprensa, Rosa classifica como “um tanto esquizofrênico” o comportamento da mídia durante o período em que Celso Furtado foi ministro da Cultura, quando ele adotou o ponto de vista de que o debate sobre o desenvolvimento e o subdesenvolvimento deveria ser ancorado pela questão cultural.

O.I. − Rosa Freire d’Aguiar, o Ministério da Cultura é um organismo do governo que reúne artistas e intelectuais, que por sua vez têm muita importância e influencia na mídia. Eu gostaria de saber se ao fazer esse livro você se deparou com esse fenômeno, se já existia na década de 80 esse fenômeno, como era?

Rosa – Na década de 1980 era muito diferente, porque, pelo contrário, o Ministério da Cultura era muito pichado, digamos assim, pela mídia. O que me chamou muito a atenção agora, quando eu estava fazendo esse volume, é que em todas as entrevistas que o Celso dava, praticamente todas, havia aquela pergunta: “Mas para que existe o ministério da cultura?”. Todos os jornalistas, embora fazendo entrevistas com o Celso, questionavam a existência do Ministério da Cultura, e curiosamente era quase que um bordão os jornalistas questionando porque existia o Ministério da Cultura. Então, o ministério, de um lado, era muito presente na mídia, não como é hoje, mas ao mesmo tempo era presente para ter questionada sua existência. Era uma coisa muito estranha, uma coisa meio esquizofrênica, digamos, e os jornais, de modo geral, eu tenho aqui em casa os jornais com os editoriais dizendo “Está na hora de acabar com o Ministério da Cultura”.

A ideia era a seguinte: num país que passa fome não tem sentido ter Ministério da Cultura, o que era uma visão completamente míope, porque não tinha nada a ver. Exatamente no momento em que o Brasil estava se reencontrando com a democracia, era exatamente nesse momento que tinha que ter o Ministério da Cultura, mas era muito difícil alguém perceber isso. Agora, evidente, era um ministério que já nasceu polêmico, eu tenho a impressão, e sempre um ministério muito presente na mídia.

Junto a artistas e intelectuais havia ainda essa coisa muito dúbia dos intelectuais dizerem não ver sentido no ministério num país que passa fome, num país que tem problemas pra resolver. Eu acho [que eles sentiam] um pouco o medo do novo, curiosamente, os intelectuais, a gente conhece vários, a gente sabe o que é isso. Os jornalistas também têm no fundo certo medo da novidade.

Era um momento delicado, um momento em que o Brasil estava saindo da ditadura, a gente ainda era regido pela Constituição da ditadura, não foi um momento muito fácil, não, era a imprensa de um lado questionando demais a existência do Ministério, achando que não tinha que haver, ao mesmo tempo todo dia notinhas sobre o Ministério da Cultura. Muito curioso, presente na mídia, sem dúvida, presente entre os intelectuais, mas para ser pichado.

NOTA: O livro será lançado por Rosa Freire d’Aguiar nesta segunda-feira (23/7) às 19 horas, com debate, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional.