O filósofo falou, o filósofo disse
Os jornais do final de semana e desta segunda-feira (15/9) estão prenhes de análises, declarações e profecias a respeito do Brasil que vai acordar depois das eleições deste ano.
Também se pode ler, é verdade, uma ou outra tentativa de convencer o eleitorado a não fazer o que parece estar fazendo: abandonar a candidatura do PSDB e fazer refluir a onda que colocou em seu lugar na disputa a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, candidata do PSB à Presidência da República.
A menos de três semanas da comutação das urnas eletrônicas para o primeiro turno, a imprensa parece convencida de que o ex-governador Aécio Neves não tem qualquer possibilidade de reverter o quadro que o coloca em terceiro lugar, a mais de 20 pontos da candidatura da presidente Dilma Rousseff, que lidera a corrida.
A possibilidade, cada vez mais concreta, de que seu partido venha a perder também em seu Estado natal, onde tem fundas raízes políticas, faz com que alguns especialistas se arrisquem a profetizar que o PSDB é uma sigla sob risco de extinção.
São muitas as variáveis que podem produzir uma mudança radical nesse quadro – já virado de pernas para o ar após o desastre aéreo que tirou a vida do ex-governador Eduardo Campos e lançou Marina Silva para a cabeça da chapa do PSB.
No entanto, eventos como esse são daqueles que, por sua raridade, acabam registrados em capítulos relevantes da História.
Em circunstâncias normais, o que deve se produzir, no dia 5 de outubro, é o que apontam as tendências das pesquisas mais recentes: Dilma Rousseff se reelege em primeiro turno ou vai para a disputa com Marina Silva em segundo escrutínio.
Esse não é exatamente o contexto sonhado por dez entre dez editores da imprensa dominante no Brasil.
Enquanto esperam um sinal dos deuses, os controladores da mídia tradicional buscam razões para crer que, na perspectiva de ver seu candidato predileto despachado fora da disputa, uma outra possibilidade possa recompor, sob o manto do PSB, o conjunto de interesses e convicções que nos últimos anos se abrigou no Partido da Social Democracia Brasileira.
O partido partido ao meio
Em meio a conjecturas, adivinhações e profecias que animam as conversas nos salões, é preciso destacar a entrevista (ver aqui) concedida ao Estado de S. Paulo pelo filósofo José Arthur Giannotti, publicada no domingo (14/9).
Apresentado pelo jornal como "ligado a tucanos", ele faz uma correção: seria, na verdade, um "tucanóide", ex-petista, mas parece alguém que tenta se manter à tona no complexo debate político, agarrado ao que sobrou do ensaio de uma socialdemocracia europeia ao sul do Equador.
Para Giannotti, que eventualmente faz a dublagem do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, seu amigo e contemporâneo na Academia, o PSDB var perder as eleições deste ano, pode eleger governadores e senadores fortes, mas será "estilhaçado".
Basicamente, ele enxerga o partido que atualmente concentra a aliança de oposição aos ocupantes do Planalto dividido em duas pontas: uma face mais à esquerda, liderada pelo ex-governador de São Paulo José Serra, que tem possibilidade de se eleger senador novamente, e o atual governador paulista, candidato à reeleição, Geraldo Alckmin.
Considerado uma referência teórica respeitável entre integrantes do PSDB, conforme observa o jornal, o filósofo respondeu secamente a uma pergunta direta sobre o que pensa a respeito do candidato do partido na atual disputa: "E se Aécio vencer?", indagou o repórter. "Aécio não vai ganhar", sentenciou o pensador.
Giannotti entende que o partido corre o risco de derreter diante da derrota provável, com Aécio Neves voltando a ser "o que sempre foi" – uma liderança do PSDB, "mas não a ponta da pirâmide".
Questionado sobre quais, na sua opinião, seriam as razões para o desastre nas hostes tucanas, o filósofo afirmou que o PSDB não teve discurso. "Na medida em que o PT foi para o centro, ele roubou o discurso do PSDB. O PT virou o grande interlocutor com as forças capitalistas e populares, o que era o projeto da socialdemocracia", acrescentou.
Giannotti falou ainda sobre a força do voto chamado genericamente de "evangélico" e outros aspectos do momento político.
Mas esqueceu um fato essencial: a hipótese de que o PSDB, como oposição, tenha perdido sua capacidade de interpretar o País, ao amarrar e condicionar sua estratégia à agenda da imprensa hegemônica, avalizando a gritaria dos pitbulls da mídia e seu discurso obsceno.