O risco das mudanças
Os recentes investimentos das empresas tradicionais decomunicação na aquisição de tecnologia digital podem dar a impressão de queestá havendo uma verdadeira revolução na mídia brasileira.
Está em curso um acelerado processo de adaptações nasredações, com a evidência de que o jornalismo deverá ter como plataformacentral os aparelhos móveis.
Ao papel deve restar uma função marginal no conjunto demeios com que as empresas de jornalismo irão se relacionar com seus públicos.
No entanto, o conhecimento da necessidade e mesmo oinvestimento em sistemas de publicação voltados para equipamentos digitaisainda não parecem ter produzido uma mudança consistente na cultura dasredações.
Segundo consultores que prestam serviço a essas empresas, jánão ocorrem, como no surgimento da internet, episódios patéticos como o enviode duas equipes diferentes para cobrir o mesmo acontecimento, mas as redaçõesainda têm dificuldade para resolver a equação entre rapidez e qualidade domaterial jornalístico a ser entregue em cada plataforma.
Como estamos experimentando um sistema absolutamente novo deedição, no qual o texto se encontra com os conteúdos de áudio e vídeo desde aorigem, é preciso reorganizar o sistema desde a pauta.
Observadores das mudanças produzidas no jornalismo pelarapidez com que os tablets têmocupado o mercado de equipamentos de comunicação registram um esforço em todasas grandes empresas, e até mesmo nas editoras menores que produzem revistascustomizadas para nichos específicos de mercado, no sentido de dotar suasestruturas de sistemas publicadores multimídia.
No entanto, além da necessidade de aculturar seusprofissionais, as empresas precisam adaptar os processos decisórios, o quecostuma provocar mudanças estruturais importantes.
Mais do que nunca, as redações serão estimuladas a entregarprodutividade, para compensar os investimentos que estão sendo feitos.
E, como se sabe de experiências anteriores, esse tipo depressão não costuma produzir bons resultados em termos de qualidadejornalística.
Valor a ser preservado
As empresas tradicionais precisam reaprender como fazer opúblico encontrar o conteúdo que elas oferecem em meio à profusão de ofertas dodifuso ambiente digital.
Não é a mesma coisa de criar uma revista com uma capaatraente e colocá-la nas bancas ou quiosques ou contratar apresentadorespopulares e formatar programas atrativos para chamar a atenção do público datelevisão ou do rádio.
Agora não se sai à caça da audiência. A audiência é que podelocalizar e escolher o conteúdo que “flutua” nesse ambiente.
Descobrir como o usuário das mídias digitais encontra oconteúdo que determinada empresa está oferecendo passa a ser o processo devenda predominante.
Portanto, não se trata apenas de encontrar os processos deprodução que assegurem o conteúdo de melhor qualidade, mas também de garantirque esse conteúdo seja adequado àquilo que mais agrada aos novos hábitos dosleitores.
Entre outros detalhes, por exemplo, é preciso considerar quea leitura nos aparelhos móveis se dá de maneira muito diferente do modo comousamos um computador de mesa ou um laptop.
As decisões do leitor são tomadas muito mais rapidamente epequenos detalhes podem definir a que elemento de informação ele vai dedicarseu tempo cada vez mais precioso.
Portanto, todo o conteúdo, desde os textos, imagens earquivos de áudio, até mesmo aos ícones que orientam o uso têm que serextremamente eficientes e intuitivos.
Para isso, é preciso que as empresas tradicionais consigamentrar nessa competição com alguma vantagem em relação à diversidade dealternativas disponíveis – desde grandes empresas internacionais até as redessociais e blogs, passando por qualquer pessoa que consiga publicizar textos eimagens que atraiam a atenção do público disputam esse mercado.
E a principal vantagem competitiva das empresasjornalísticas que ainda se caracterizam como tais ainda é seu título, cujareputação foi construída ao longo do tempo com base no fornecimento de conteúdoconfiável.
Esse é o que se chama ativo intangível ou capital simbólico.
Esse patrimônio não depende da posse de tecnologia, mas dapreservação dos valores essenciais do jornalismo.
Como em todo processo de mudança, nem sempre esse valoressencial é priorizado.