Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

>>Debate negligenciado
>>Metástase geral

Debate negligenciado

Os jornais navegam em contradições. Mas o presidente da TAM comete o mais grave pecado numa CPI: tentou enganar os deputados. Fala, Alberto Dines.


Dines:


– Não há como um dia depois do outro, especialmente na imprensa diária. Ontem, dia seguinte à constatação da Folha apontando os pilotos como culpados, o jornal saiu mais prudente. A matéria principal, desta vez assinada pela repórter Leila Suwwan, foi em outra direção: a hipótese de falha humana é colocada em dúvida, pode ter sido falha no equipamento. Tanto a Folha como seus concorrentes passaram ao largo de uma manchete que havia ocupado grande parte das atenções no dia anterior. Ninguém refutou diretamente ou discutiu a  precipitada acusação da quarta-feira, como se nada tivesse acontecido. A própria questão do vazamento de uma informação sigilosa sequer foi discutida. O Estadão, no máximo, permitiu-se uma contestação indireta à Folha com uma matéria a respeito do acordo internacional que proíbe a veiculação de dados sobre acidentes aéreos antes de concluído o inquérito. Pergunta-se: qual a razão deste pacto de silêncio? Cavalheirismo ou corporativsmo? O que impede um veículo jornalístico brasileiro de comentar o desempenho dos demais? Se a imprensa reclama do ‘aparelhamento’ do Estado por que razão ela não é mais pluralista, mais diversificada e, em última análise, mais solta? Essa não é uma questão secundária: o debate civilizado entre veículos de comunicação é um fator de equilíbrio, evita a perigosa unanimidade. Jornais nasceram, cresceram e se tornaram indispensáveis ao longo dos últimos quatrocentos anos porque sempre foram combativos, principalmente contra seus competidores.


Luciano:


Máfia nos Correios


E nesta sexta-feira, a tragédia de Congonhas começa a deixar o lugar de maior destaque nos grandes jornais.


O Estado de S.Paulo abre a página com uma notícia sobre corrupção.


Comete uma impropriedade, ao afirmar que polícia prendeu nova máfia que agia nos Correios.


Na verdade, como se pode entender na leitura da reportagem, e também no Globo e na Folha de S.Paulo, trata-se do mesmo crime denunciado em 2005.


O caso merece mais atenção.


Quem não se lembra daquela cena, repetida inúmeras vezes na televisão, na qual o antigo diretor dos Correios Maurício Marinho embolsa uma propina de 3 mil reais?


Pois bem. O chefe da quadrilha preso ontem pela Polícia Federal é o empresário Arthur Waschek Neto, que gravou o flagrante de Marinho e o denunciou em 2005.


Louvado pela imprensa na ocasião, exatamente por haver tido a coragem de expor o funcionário corrupto, Waschek na verdade estava usando a mídia para tirar da frente um parceiro um pouco mais ambicioso.


Ele certamente contava com as atenções concentradas no denunciado. Não apenas seguiu chefiando as fraudes em licitações nos Correios, como ampliou e sofisticou o seu negócio, segundo a Polícia Federal e o Ministério Público.

Waschek sabia que a imprensa o esqueceria no dia seguinte. Só não contou com a persistencia da polícia.


Metástase geral


A Folha de S.Paulo preferiu dar como manchete uma declaração do presidente Lula, que comparou a crise aérea a uma metástase, que só é percebida pelo paciente quando a doença se torna grave.


Como o presidente gosta muito de metáforas, talvez fosse o caso de lhe perguntar se não acontece o mesmo com a corrupção no aparelho do Estado.


Afinal, a imprensa poderia colaborar para um tratamento mais eficiente nas causas dessa metástase que quase semanalmente nos revela um novo câncer nos serviços públicos.


Quanto ao acidente em Congonhas, os jornais parecem ter desistido de se antecipar às autoridades que investigam as causas.


Os jornais destacam a informação de que o Airbus que fazia o vôo JJ-3054 havia apresentado duas falhas no dia do acidente.


O Estadão ouviu funcionários da TAM e informa que, além de um defeito no sensores do trem de pouso, relatado oficialmente pelo vice-presidente técnico da empresa, também havia sido relatado pelos pilotos mortos um problema no freio aerodinâmico das asas.


Exatamente a mesma falha que aconteceu no momento do pouso fatídico em Congonhas.


De olho na TAM


O presidente da TAM aparece em posições contraditórias no noticiário de hoje, Em depoimento à CPI do chamado apagão aéreo, Marco Bologna faz críticas ao aeroporto de Congonhas, dizendo, desta vez, que a falta de ranhuras na pista foi um fator importante para o acidente.


Desse modo, ele justificava a decisão das autoridades de diminuir a utilização do aeroporto
Mas em outra parte do noticiário, ao contrário, Bologna aparece como sendo participante de um movimento das empresas aéreas que resiste à redução das operações em Congonhas.


O mais grave: durante a leitura de uma instrução da Agência Nacional de Aviação Civil, o executivo tentou pular um trecho no qual os pilotos são orientados a usar notadamente o reversor do avião durante pouso em pista molhada.


Foi apanhado em flagrante pelo deputado Vic Pires, do Partido Democrata do Pará, na atitude desonesta, e teve que se explicar aos parlamentares.


Para prestar um bom serviço aos leitores, os jornais precisam, daqui para a frente, manter sob vigilância todas as futuras manifestações da empresa.