É carnaval
O governo limita o uso de cartões de crédito corporativo por parte de ministros e servidores em cargos de direção, mas a medida não deve ser suficiente para impedir a saída da ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro.
Ela foi apanhada tratando igualitariamente interesses privados com verbas públicas, e os jornais informam que o presidente Lula espera que ela peça demissão.
Mas é carnaval e o caso da ministra pode ficar para depois da quarta-feira de cinzas.
O governo também prepara um pacote para endurecer as regras de trânsito.
Dirigir sob efeito de bebida alcoólica de uma única lata de cerveja poderá ser considerado crime, e as multas deverão ser proporcionais ao valor do carro.
A proposta vai ficar exposta no site do Ministério da Justiça, para receber sugestões, e deve ser enviado ao Congresso dentro de mais ou menos trinta dias.
Ou seja, depois do carnaval.
O debate sobre os números do desmamento da Amazônia arrefeceu nas edições de hoje, e os jornais não conseguem avançar na tarefa de avaliar se o alerta encampado pela ministra Marina Silva tem ou não fundamento na realidade.
Os jornais preferem discutir se a ministra ganhou ou perdeu prestígio.
Mas Marina Silva tem o carnaval pela frente, para recobrar suas forças.
Curiosamente, os jornais de hoje isolam a notícia de que o embargo da União Européia à carne brasileira foi provocado por certa ‘picaretagem’ de alguns Estados, que impuseram ao Ministério da Agricultura uma lista improvisada de fazendas produtoras de gado para exportação que chega a ser dez vezes maior do que a suposta capacidade brasileira de fiscalização sanitária.
Alguns desses Estados, coincidentemente, aparecem na lista dos maiores devastadores da floresta amazônica. Mas os jornais não citam a preocupação de ativistas europeus com a pressão da pecuária sobre a Amazônia.
Um esforço adicional poderia resultar em um noticiário mais esclarecedor também sobre os números da violência no País, as metas de inflação e as possibilidades de aumento dos juros.
Mas é carnaval.
Jornalismo de verão
A imprensa sempre parece mais preguiçosa no verão.
Talvez porque o período de férias, com menos atividades institucionais coincida com uma época de menos profissionais nas redações.
O fato é que, todos os anos, os jornais encolhem e a vigilância da imprensa parece diminuir nesse período.
Mas há temas que precisam ser monitorados o ano inteiro, o tempo todo.
Alberto Dines:
– A Infraero está preocupada com o Carnaval, mas parece que a imprensa não está preocupada com o Carnaval. Se os jornais designassem repórteres para investigar o que mudou nos aeroportos talvez compartilhassem das preocupações das autoridades. O noticiário sobre o tráfego aéreo em toda a mídia resume-se à divulgação de estatísticas – tantos vôos cancelados, tantos atrasados e nada mais. Os jornalistas não sobem até as salas de embarque nos segundos pisos para verificar se já foram instalados os balcões de informações prometidos há seis meses pelo ministro Jobim, não verificam se há mais telões e se os telões estão sendo alimentados com dados mais atualizados. Apesar do clima ameno, quase de primavera, o ‘jornalismo de verão’ parece firmemente implantado. O calor e o mormaço foram substituídos por uma atitude burocrática. A mídia não cobre, apenas acompanha os assuntos, esquecida de que além do Carnaval, temos o fim das férias e o fim dos recessos. Os leitores, ouvintes e telespectadores querem saber o que mudou. Vão descobrir que nada mudou. Inclusive o descaso da mídia.