Escândalos permanecem na berlinda
A leitura da imprensa no fim de semana deixa duas constatações. Primeira, que os jornais dão um banho nas revistas. Não é questão de quantidade, mas de qualidade do conteúdo.
A segunda constatação é que existem duas maneiras de olhar para a frente. Uma foi a adotada no domingo pela Folha de S. Paulo. Ela começa do que falta apurar e procura mostrar que o escândalo da quebra de sigilo do caseiro Francenildo ainda não esgotou seu potencial de estrago no governo. Nesta segunda-feira, 3 de abril, a Folha põe na berlinda a responsabilidade do ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos, no episódio. Ontem a manchete foi dedicada à responsabilização do ex-ministro Palocci. Hoje, entra na primeira página uma declaração na qual o ex-governador Geraldo Alckmin diz que sua mulher se equivocou ao receber vestidos de presente. Mas o jornal traz nova denúncia a respeito de uso indevido de verbas da Nossa Caixa.
Ainda não foi dada a largada
O Estadão e o Globo preferiram no domingo dar como iniciada a campanha eleitoral. Mas hoje são obrigados a retomar nas manchetes o escândalo da República de Ribeirão Preto.
O Globo de ontem, como para contrariar teorias conspiratórias sobre o trabalho da imprensa, dá grande destaque a acusações contra irregularidades que teriam sido cometidas no governo de Geraldo Alckmin em São Paulo. Os críticos mais empedernidos do Globo dirão que é para favorecer o presidente Lula. Os mais desconfiados poderão ver favorecimento a uma troca de candidatura no PSDB. A realidade é mais simples: denúncias provocaram o noticiário. Se a imprensa não serve para isso, para que serviria?
A troca de uma inicial
Alberto Dines nota como o conflito entre um manual de redação e os dicionários pode provocar confusão na leitura.
Dines:
– Começou a interinidade, tudo é provisório e transitório, pode ser que mais tarde o confronto eleitoral esquente um pouco mas a cobertura política dos jornais de ontem refletiu o clima de intervalo. Todos resignaram-se com a reprodução da matéria de capa da Veja sobre a responsabilidade do ex-ministro Palocci na quebra do sigilo do caseiro Francenildo. Com exceção da Folha, pouco se acrescentou ao que o semanário publicou no sábado. A nota pitoresca foi fornecida pela entrevista do ex-prefeito e agora candidato ao governo de S.Paulo, José Serra, ao Estadão-ão-ão de domingo. Proclamou Serra: “Não podemos deixar o Estado nas mãos do PT”. Ele tem todo o direito de dizer que o pensa só que o jornalão grafou Estado com letra maiúscula, o que significa o conjunto de poderes de uma nação, o governo do país. Ora, Serra não é mais candidato à sucessão de Lula, não disputa o comando do Estado brasileiro, disputa, sim, o comando do governo de São Paulo. O estado a que se referiu é o mais importante da Federação mas é estado com “e” minúsculo conforme recomendam os dicionários. Serra não voltou atrás e não voltou a disputar a presidência, está tudo como estava na sexta-feira à noite. Mas a maiúscula indevida dá uma idéia do nível de precisão da nossa imprensa.
Proteção dispensada
A imprensa menciona mas não explica uma passagem da história do caseiro Francenildo. Por que ele resolveu abandonar o programa de proteção de testemunhas da Polícia Federal? Foi uma providência crucial. Ele evitou ficar isolado. Mas o que o levou a fazer isso? Quem teve a sábia idéia de garantir a liberdade de movimentos de Francenildo?
A periferia da periferia
Pode haver algo de novo no ar quando a atriz Regina Casé, ao apresentar no Fantástico uma série de programas que a Rede Globo exibirá aos sábados, diz que no Brasil, hoje, “o centro é a periferia da periferia”. Exageros retóricos à parte, é um esforço importante para dar visibilidade a personagens que só costumam ser vistas no noticiário de tragédias e violência. E que integram a maioria da população.
Misérias infantis
Duas reportagens mostraram no domingo limitações e dilemas dos programas federais que pretendem garantir a crianças e adolescentes o direito à escola e tempo livre para brincar. O Fantástico foi ao interior da Bahia mostrar crianças que trabalham na produção de cachaça. O processo eventualmente provoca alcoolismo infantil, aceito pelas famílias. O Estadão mostrou limitações e contradições do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, Peti, em diferentes estados brasileiros. Em Santa Rita de Ouro Preto, Minas Gerais, a fabricação de peças de pedra-sabão afeta os pulmões de adultos e crianças.
Essa linha de reportagens custa caro, porque envolve viagens e consome tempo, mas é preciosa para se entender problemas e avaliar soluções dadas pelos governos.
# # #
Leitor, participe: escreva para noradio@ig.com.br.