Faroeste goiano
A liberdade de imprensa no Brasil é relativa. Depende da cidade onde está o veículo de comunicação. No dia 15 de fevereiro, a Polícia Federal prendeu em Goiás 19 policiais militares acusados de fazer parte de um grupo de extermínio. O subcomandante da PM e o comandante do batalhão de operações táticas, lá chamado de Rotam, estão entre os presos. Só nos dois últimos anos, o grupo é acusado de matar 117 pessoas. Agia, segundo as denúncias, há cerca de 15 anos. A notícia foi dada em todo o país, inclusive no Jornal Nacional, da Rede Globo.
Ontem, o jornal O Popular, de Goiânia, publicou transcrições de gravações feitas pela polícia com autorização judicial. Um dos acusados diz que mata por prazer e satisfação. Na mesma manhã, oito viaturas com 30 homens da Rotam passaram lentamente em frente à porta do jornal. A editora chefe do jornal, Cileide Alves, diz em entrevista ao Observatório da Imprensa qual a extensão do problema:
Cileide Alves:
− Pena de morte sem lei, sem julgamento. O que acho grave no episódio de ontem é que não é só a liberdade de imprensa que está ameaçada. O episódio de ontem revela que as instituições democráticas é que estão ameaçadas em Goiás. E de tabela a imprensa, óbvio. Porque quando você ameaça as instituições democráticas, a imprensa está no meio. Mas é a Justiça, o Ministério Público, a polícia, a imprensa, todos ameaçados por esse poder invisível representado por esse grupo que estava agindo dentro da polícia. Todo mundo tem medo. Ontem eu conversei com o Marconi [Perillo, governador] e ele me disse que no dia em que estourou o escândalo ele não dormiu de preocupação.
O dinheiro desmoralizador de Kadafi
Alberto Dines:
− No front militar as notícias da Líbia são desencontradas e preocupantes, na esfera humanitária são desesperadoras, porém no front político as notícias são animadoras porque o repúdio ao tirano Kadafi parece unânime em diversas instâncias e entidades, coisa que não acontecia há décadas. Da esfera midiática é que chegam algumas surpresas. Os jornais de ontem começaram a registrar um inédito movimento no mundo do show-business e da cultura: grandes celebridades anunciaram que pretendem devolver os fabulosos cachês que receberam da família Kadafi para shows particulares. Entre eles, os Rolling Stones, Nelly Furtado, Beyoncé. Por que não o fizeram antes? Celebridade não lê jornal? Em pior situação ficou a prestigiosa London School of Economics, que recebeu uma robusta doação de um e meio milhão de libras (quatro milhões de reais) de uma organização dirigida por um filho da Kadafi, Saif, e em troca facilitou sua aprovação como doutor em ciência política apesar das evidências de que contratara um ghost-writer para escrever sua tese (na qual foram encontrados 17 plágios). Pior é que o jovem Kadafi só depositou uma pequena parte da doação e ninguém teve a coragem de cobrar o resto. Antes de desmoralizar-se como chefe de estado Kadafi realizou a incrível façanha de desmoralizar as mais importantes instituições ocidentais comprando-as ostensivamente com a complacência da grande imprensa internacional. O déspota líbio também operou no Brasil a partir de meados dos anos 80: pagou a emissoras de TV, levou a Trípoli charmosas apresentadoras para entrevistá-lo, financiou políticos, partidos, sindicatos, ONGs. Não será difícil rastrear esta atividade, sobretudo agora que grandes organizações jornalísticas estão disponibilizando o seu acervo por via digital.