Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

>>Jogando a toalha
>>Acidentes e política

Jogando a toalha


A notícia de que os Estados Unidos e a China, os dois países mais poluidores do mundo, e outras nações reunidas num fórum de líderes da região Ásia-Pacífico, decidiram adiar uma deliberação concreta sobre a redução das causas do aquecimento global é destaque em todos os grandes jornais nesta segunda-feira.


Segundo a imprensa, a decisão esvazia a conferência da ONU sobre clima, marcada para o próximo mês em Copenhague, na Dinamarca.


Tudo que se poderá conseguir em Copenhague, então, seria um acordo político, ou uma carta de intenções sem referência a metas específicas.


A postura dos jornais brasileiros é derrotista.


No entanto, a leitura dos detalhes do noticiário, incluindo-se o que vem pelos sites da imprensa internacional, indica que o atraso na elaboração de um compromisso global pode ser favorável ao estabelecimento de metas mais ambiciosas.


Se for obtido um consenso em torno de intenções e um acordo político de caráter obrigatório, conforme observou o primeiro-ministro da Dinamarca, o passo seguinte poderá ser a definição de metas concretas e factíveis, o que seria muito mais do que aquilo que se obteve até agora.


Além disso, a nova circunstância pode ser uma oportunidade para o Brasil apresentar um compromisso à parte, assegurando uma redução significativa do desmatamento na Amazônia, no Cerrado e no que resta da Mata Atlântica.


Isso colocaria o país numa posição de liderança para a etapa seguinte das negociações globais sobre o clima.


Além disso, uma posição vanguardista e comprometida do Brail poderia estimular investimentos internacionais em projetos de desenvolvimento sustentável, que se somariam ao potencial já anunciado de atração representado pela realização da Copa do Mundo em 2014 e pelas Olimpíadas em 2016.


Mas, para que isso aconteça, a imprensa precisaria adotar outra postura.


Em vez de lamentar o adiamento das decisões em Copenhague, o correto seria manter forte a pressão para que o governo brasileiro não recue.


Mas tudo indica que a imprensa usa o episódio para jogar a toalha. 


Acidentes e política


Alberto Dines:


– Estavam muito pesadas as edições de ontem dos três jornalões nacionais. Com todos os cadernos e encartes, pesariam em torno de três quilos. Mas este papelório dominical chega a afetar a vida dos leitores ? Depois de folhear cerca de 600 páginas ele imagina que algo mudará em sua existência?  Excluindo o serviço prestado pelos anúncios classificados, qual o efeito da montanha de informações jornalísticas na vida daqueles que as consomem?


É certo que o destaque dado à cobertura de dois desastres – o apagão que afetou 18 estados  e o desabamento parcial de uma ponte na obra do rodoanel paulistano – produz reações  concretas no ânimo do leitor. Como sempre a reboque das diligências e providências oficiais e apresentado com um enfoque excessivamente político, o noticiário dos acidentes acaba por escapar da esfera imediata do cidadão.


Para chamar a atenção, são apresentados como casos singulares, sem identificar a falha sistêmica que converte tantas portentosas obras públicas em tremendos fiascos, a despeito do nível de excelência de nossa engenharia. Porém quando a imprensa se dispõe a investigar por conta própria, sem distrair-se com política, sabe  ir fundo. Caso da manchete do Globo sobre o desperdício de recursos na urbanização da favela Dona Marta, bairro de Botafogo, no Rio: com o dinheiro gasto nesta comunidade desde 1983 seria possível oferecer um imóvel de 84 mil reais a cada uma das 1.460 famílias lá residentes.


A primícia oferecida pela Folha é mais trepidante, afeta os leitores de todas as classes sociais no país inteiro: as farmácias compram medicamentos genéricos com 65% de desconto, repassam ao consumidor apenas 20% e embolsam o resto. Daí a pequena diferença de preço entre um genérico e o seu equivalente de marca. O abuso é antigo e justamente por isso valoriza o trabalho dos jornalistas que souberam vencer a inércia.


Com este tipo de vigilância regular, nossa imprensa estaria se antecipando aos vexames e surpresas. E jamais  se sentiria ameaçada pelo lançamento no mercado de uma nova engenhoca eletrônica.